Artigo traduzido de Science News. Autor: Christopher Crockett.
Uma piada antiga diz que a NASA está sempre a 20 anos de colocar astronautas em Marte. Detalhes da missão compartilhados durante um encontro recente mostra que a agência espacial se programou bem dessa vez. Uma lista de tarefas de 2015 se assemelha a um compilado de 1990. Mas há uma diferença: a NASA está construindo um foguete e testando tecnologias necessárias para enviar uma tripulação a Marte. Mas os detalhes da viagem mais longa da história – e o que os astronautas farão quando chegarem lá – continuam a ser uma questão em aberto.
“Vamos enviar pessoas para lá para explorar e fazer as coisas que poderíamos fazer roboticamente, embora mais lentamente, ou vamos elevar o nível?”, Perguntou o cientista planetário Jim Bell durante o encontro Humans to Mars. “Precisamos ter certeza de que o que essas pessoas farão é digno do risco para suas vidas”, disse Bell, da Arizona State University, em Tempe.
O simpósio de três dias, que terminou 19 de maio, foi organizado pelo Explore Mars Inc., organização sem fins lucrativos dedicada a colocar astronautas em Marte por volta de 2030.
Embora o encontro não tenha trazido inovações científicas, reuniu cientistas planetários, entusiastas do espaço e representantes da NASA e da indústria aeroespacial para falar sobre os desafios que uma missão tripulada a Marte enfrentaria e sobre ideias de como chegar lá.
Parte do atrativo no envio de seres humanos é o ritmo das descobertas. Perfurar apenas um buraco com o rover Curiosity, que vem explorando a cratera Gale em Marte desde agosto de 2012, atualmente leva cerca de uma semana. “É um processo trabalhoso, frustrante, maravilhoso – e frustrante – de vários dias”, disse Bell.
Os seres humanos também pode reagir à novas situações, tomar decisões rápidas e ver as coisas de uma maneira que os olhos robóticos não podem. “Um explorador robô está longe de ser tão bom quanto um geólogo humano”, diz Ramses Ramirez, cientista planetário da Cornell University. “Há muito mais liberdade”.
Pesquisadores viram a vantagem humana em primeira mão em 1997, quando enviaram um rover chamado Nomad em uma viagem de 45 dias através do deserto do Atacama, no Chile. Nomad foi controlado pelos operadores nos Estados Unidos para simular a operação de um robô em outro planeta. Os seres humanos no local do rover mostraram uma realidade chocante sobre os dados enviados pelo Nomad. “Houve uma diferença qualitativa”, diz Edwin Kite, cientista planetário da University of Chicago. E não era apenas sobre os geólogos fazendo as coisas mais rapidamente. “Os robôs passaram por cima de provas de vida que os seres humanos estavam encontrando de forma muito óbvia”.
Para enviar astronautas preparados para explorar Marte, o programa Apollo é um bom modelo, disse Jim Head, geólogo da Brown University, que ajudou a treinar os astronautas da Apollo. “Nossa estratégia era chamada t-cubed: treiná-los, confiar neles e deixá-los livres” Embora cada uma das expedições lunares fossem planejadas, os astronautas tinham confiança para usar seu julgamento. O astronauta David Scott da Apollo 15, por exemplo, encontrou uma pedaço de crosta lunar profunda que os pesquisadores esperavam encontrar embora não tivessem planejado. “Ele o viu a três metros de distância”, disse Head. “Ele o viu brilhar e o reconheceu imediatamente. Isso é exploração”.
Apesar da falta de objetivos claros para uma excursão a Marte, a NASA está preparando o futuro. A cápsula tripulada Orion já foi para o espaço uma vez; em 2014, um foguete Delta IV Heavy lançou a Orion sem tripulação a 5800 km no espaço antes de cair no Oceano Pacífico. E a construção do Space Launch System, um foguete destinado a lançar seres humanos para a Lua e Marte, está em curso. O primeiro voo de teste, previsto para Outubro de 2018, irá enviar a Orion em uma viagem não tripulada de vários dias ao redor da lua. A NASA espera colocar astronautas a bordo para a órbita lunar em 2021.
Enquanto isso, a tripulação a bordo da International Space Station está testando tecnologias que irão manter os seres humanos saudáveis e felizes durante uma viagem interplanetária. O astronauta Scott Kelly completou recentemente uma estadia de quase um ano na estação com a intenção de revelar os efeitos das viagens espaciais de longa duração sobre o corpo humano. E no dia 10 de abril, um habitat protótipo inflável – o Bigelow Expandable Activity Module – chegou à ISS e foi anexado a um porto de ancoragem seis dias depois. A tripulação da estação irá inflar o módulo pela primeira vez no dia 26 de maio. Ninguém vai viver nele, mas ao longo dos próximos dois anos os astronautas irão recolher dados sobre o quão bem o habitat lida com radiação, temperaturas extremas e lixo espacial.
Além disso, os planos não estão definidos. A ideia geral é a construção de um posto avançado em órbita da lua como um teste e preparar o solo a partir do final década de 2020. A primeira tripulação a Marte pode pousar no planeta – ou talvez não. Uma ideia é montar um acampamento em órbita de Marte; a partir daí, os astronautas poderiam operar robôs na superfície, sem longos atrasos de comunicação. Outra ideia é os humanos aterrissarem em uma das duas luas de Marte, Phobos ou Deimos. Quando as tripulações forem para a superfície de Marte, a NASA prevê o estabelecimento de uma base a partir da qual os astronautas poderiam planejar expedições.
Com tão poucos detalhes, é difícil para a agência espacial identificar tecnologias específicas para investir. “Houve muitos estudos – mas o problema é que só dá para estudar mesmo”, disse Bret Drake, engenheiro na Aerospace Corp., em El Segundo, Califórnia. “Mas além dos estudos, há um monte de coisas em comum entre os projetos, não importa o caminho que você tome”.
Qualquer missão a Marte terá que assegurar os astronautas por cerca de 500 a 1000 dias. A missão terá que lidar com atrasos de comunicação de ida e volta de até 42 minutos. Precisará de capacidade para pousar cargas com cerca de 40 toneladas na superfície de Marte (missões robóticas atuais conseguem pousar cargas com cerca de uma tonelada). Viver da terra também é fundamental, fazendo uso de água local e minerais. E os astronautas precisam ser capazes de dirigir e explorar. “Queremos pousar em um lugar seguro, geologicamente plano, mas queremos ir para locais emocionantes”, disse Drake.
Os desafios técnicos e logísticos podem ser a parte mais fácil. “Nós sabemos o suficiente para conseguir isso”, diz Ramirez. “O maior problema é a vontade política”. O congresso precisa assinar o financiamento desta aventura (na NASA ainda nem apresentou um orçamento – deverá estar na casa das centenas de bilhões de dólares), e as administrações futuras poderiam decidir aborta-la.
Vários oradores no encontro salientaram a importância do uso de tecnologia atuais ou em desenvolvimento – nenhum motor exótico ou habitats de gravidade artificial por enquanto. E uma série de pequenas missões – pequenos viagens para a Lua e para um asteroide antes de pensar em Marte – poderiam mostrar o progresso que pode ajudar a manter o impulso (e o interesse público) vivo.
“Nós pensávamos que ir à Lua era impossível, mas chegamos lá”, diz Ramirez. “Se nos dedicarmos como uma nação para fazer algo louco, vamos fazer. Eu não tenho dúvidas”.