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Nova análise revalida a dualidade onda-partícula

Por Tom Siegfried
Publicado na
Science News

Um princípio básico da mecânica quântica foi reafirmado. Parem as máquinas! (Ou comecem a twittar).

Em 2012, pesquisadores na Alemanha supostamente haviam mostrado que você podia observar ambas as propriedades onda e partícula da luz em um experimento. Esse resultado desafiou o princípio da dualidade onda-partícula: ondas podem às vezes ser partículas (e partículas às vezes podem ser ondas), mas nunca os dois ao mesmo tempo. Mas agora um novo trabalho, publicado no mês passado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, revalida a dualidade, um pilar na explicação dos mistérios quânticos desenvolvidos pelo físico dinamarquês Niels Bohr em 1920.

Não é nenhuma surpresa, realmente, para a física quântica suportar outro embate. Seria chocante se a dualidade realmente fosse derrubada. O princípio de Bohr, que exige a exclusividade mútua das propriedades de onda e partícula em um único experimento, tinha sobrevivido a muitos desafios anteriores. E a dualidade fazia parte do princípio mais geral de complementaridade de Bohr, uma ideia que ele desenvolveu para lidar com as crises que afligiram a física com o surgimento da mecânica quântica.

Quando Bohr desenvolveu seu famoso modelo quântico do átomo de hidrogênio, em 1913, a esperança era grande de que a nova física quântica, introduzida por Max Planck em 1900, resolveria os principais problemas sem criar novos. Mas Bohr percebeu de outra forma. Ele sabia que seu átomo era um paliativo; átomos mais complicados do que o átomo de hidrogênio precisavam de uma reformulação completamente nova e mais radical da teoria física. E, como Bohr e seus seguidores, incluindo Werner Heisenberg, aceitaram o desafio do átomo, outros físicos (principalmente Einstein) se preocupavam mais com os aspectos quânticos da radiação. É assim que o dilema onda-partícula virou a festa quântica.

Einstein causou a maioria dos problemas. Ele argumentou que a luz viajava através do espaço na forma de partículas (mais tarde chamadas fótons), apesar de todas as evidências em contrário. Desde o início dos anos 1800, a maioria dos físicos acreditava que a luz consistia de ondas, graças a um famoso experimento de Thomas Young. Se você disparar a luz através de uma barreira com duas fendas em direção a uma superfície atrás da barreira, você vai ver faixas alternadas de luz e sombra. Isso porque as ondas passando através das diferentes fendas interferem umas com as outras, fazendo com que brilhe em alguns pontos e escureça em outros. Se a luz fosse feita de partículas, nenhuma interferência teria ocorrido.

Mas um século depois, Einstein insistiu que somente os fótons poderiam explicar o efeito fotoelétrico, onde a luz que atinge um metal faz com que o metal emita elétrons. Eventualmente Einstein ganhou o Prêmio Nobel por esse trabalho, embora ninguém tenha acreditado nele quando ele publicou em 1905.

Por volta de 1920, porém, Einstein não parecia tão bobo. Experiências sobre raios-X (basicamente luz de alta energia) mostrou que eles exercem impulso tal como partículas fazem. Pouco tempo depois, outros experimentos começaram a mostrar que os elétrons, supostamente partículas, exibiam propriedades de ondas.

Você pensaria que algo tão estranho quanto isso – partículas fingindo ser ondas – teria sido uma chocante surpresa experimental, fazendo com que os teóricos sofressem para explicar. Mas, como acontece muitas vezes na ciência, os teóricos já haviam percebido isso. Neste caso, o teórico pioneiro foi Louis de Broglie. Ele ficou intrigado com a física quântica e também era um fã da teoria da relatividade especial de Einstein, que havia estabelecido a equivalência entre massa e energia.

De Broglie não teve nenhum problema com a ideia de Einstein sobre partículas de luz. Depois de tudo, a luz é radiação eletromagnética ou energia. Se a energia é equivalente à massa, então não parecia tão estranho que a luz exibisse as propriedades das partículas. Mas, então, de Broglie levou esse raciocínio um pouco mais longe. Se energia (ondas) pode se comportar como massa (partículas), então por que não o contrário?

De Broglie chegou a esta visão percebendo a importância da frequência. Os primeiros trabalhos de Planck e Einstein tinham estabelecido a chave quântica da relação entre energia e frequência – a energia é simplesmente igual à frequência multiplicada pela constante de Planck. Em outras palavras, a luz de alta frequência (ou energia eletromagnética) possui mais energia. Os raios-X, por exemplo, constituem uma forma de alta energia de radiação com a frequência muito mais elevada (ou seja, comprimento de onda muito mais curta) do que a luz visível.

Então, se a frequência está ligada à energia, e energia e massa são a mesma coisa, então as massas também deveriam estar relacionadas com uma frequência, de Broglie fundamentou. Ele declarou que devia, portanto, existir “um certo processo periódico, de uma natureza específica ainda não muito clara, que deve ser atribuído a cada parte isolada da energia” – ou seja, partículas. E assim você pode atribuir “ao movimento uniforme de cada ponto material… a propagação de uma onda determinada, na fase de propagação no espaço com uma velocidade maior do que a da luz”.

Opa – mais rápido do que a luz? Isso seria desafiar relatividade de Einstein, não é? Não neste caso, de Broglie apontou, porque essas ondas não transportam qualquer energia. A superposição dessas ondas misteriosas, no entanto, produziria uma outra onda que viajaria precisamente na mesma velocidade que a partícula. Assim, a “energia de viagem” realizada pela partícula também poderia ser vista como a energia a ser transportada por uma onda.

De Broglie elaborou sua ideia em 1923 e publicou sua tese sobre o assunto em 1924. Em 1926, o físico austríaco Erwin Schrödinger estendeu a ideia da onda para explicar as propriedades dos elétrons nos átomos, na versão da física quântica conhecida como mecânica ondulatória.

Schrödinger acreditava que os elétrons nos átomos eram simplesmente ondas, onde suas órbitas consistiam de números inteiros de comprimentos de onda. Mas mesmo antes de Schrödinger, Heisenberg tinha trabalhado em uma descrição matemática equivalente de elétrons em átomos, onde os elétrons eram claramente partículas. E apesar dos novos experimentos mostrando propriedades de onda de elétrons, toda a evidência mais antiga de que os elétrons são partículas parou. O mesmo vale para a luz, que ainda era uma onda quando você queria que fosse, mesmo que, as vezes, se mostrasse como partícula.

Confrontado com estas questões, Bohr desenvolveu seu princípio de complementaridade em 1927. Ele afirmou que alguns pontos de vista mutuamente excludentes da natureza poderiam ser ambas verdadeiras, mas não ao mesmo tempo. Seu principal exemplo foi a dualidade onda-partícula. Em qualquer experiência, a luz (ou um elétron) pode ser um ou outro, mas nunca ambos.

Bohr ilustrou seu ponto com uma experiência famosa do pensamento análogo ao da dupla fenda de Young demonstrando a natureza ondulatória da luz. Com apenas uma fenda em uma barreira, os elétrons se comportam como partículas, atingindo a superfície do detector em pontos individuais, sem faixas de brilho ou escuridão indicando interferência. Mas com uma segunda fenda, os elétrons podiam interferir, produzindo faixas de interferência. Simples.

Mas aqui está o problema quântico. Mesmo que enviasse elétrons individuais através da barreira, um de cada vez, a presença da segunda fenda garante um padrão de interferência – embora cada elétron pudesse passar por apenas uma das fendas. (Apesar desse ser apenas um experimento mental nos dias de Bohr, experiências reais mais tarde confirmaram que Bohr estava certo).

A explicação de Bohr baseou-se no fato de que, apesar de um elétron passar por apenas uma fenda, a presença da segunda fenda significava que você (o observador experimental) não sabia por qual fenda o elétron passou. Se você soubesse, você estaria certo de que era uma partícula, e o padrão de interferência não se concretizaria. Em outras palavras, você não pode saber qual o caminho do elétron (tornando-se uma partícula) e também observar a interferência (tornando-se uma onda) ao mesmo tempo.

Isso é exatamente o que o experimento de 2012 desafiou, em um experimento complicado (usando fótons em vez de elétrons) em que parecia que você poderia detectar interferências e também obter informações sobre a trajetória do fóton. Mas o novo estudo, de Eliot Bolduc, da Universidade de Ottawa, no Canadá, com Robert Boyd de Ottawa e da Universidade de Rochester, em Nova York e outros colaboradores, reanalisaram ​​o desafio e encontraram uma falha.

Nos experimentos reais, a relação entre o caminho conhecido e a interferência se complica pela presença do meio ambiente. Você não vai querer fazer a matemática em casa, mas o resultado final é que você pode ter um experimento oferecendo alta probabilidade de prever o caminho e alta probabilidade de se observar a interferência. Você pode optar por medir a parte do meio ambiente com a melhor informação sobre o caminho ou a parte do meio ambiente com a maior visibilidade das faixas de interferência. Mas para testar a dualidade, você tem que certificar-se que suas medidas são igualmente sensíveis a todos os possíveis estados do sistema (uma exigência chamada ” amostragem representativa “). Bolduc, Boyd e colegas demonstraram que o experimento de 2012 violou a regra de amostragem representativa.

“Mostramos como amostragem tendenciosa pode causar uma aparente violação do princípio da dualidade”, escreveram na revista PNAS. “De acordo com nossa análise, o princípio da dualidade em sua forma padrão está sã e salva”.

Jessica Nunes

Jessica Nunes

Um universo inteiro a ser descoberto por ele mesmo. Apaixonada por astronomia desde pequena e fascinada por exatas desde o berço.