Pular para o conteúdo

Os mitos relacionados a Nikola Tesla

Por Brian Dunning
Publicado na Skeptoid

Sem dúvida, Nikola Tesla é um dos mais destacados inventores científicos dos últimos séculos, mas lamentavelmente também é uma figura atrativa para os seguidores de crenças conspiratórias e pseudociências.

Não há homem na história da ciência que carregue mais mitos do que Tesla. Atualmente, não há quase nada escrito sobre ele que não esteja exagerado ou que não tente divinizá-lo. Com o objetivo de reivindicar a sua imagem e apreciar o homem pelas suas grandes obras – e não pelos seus mitos -, pretendo esclarecer algumas meia-verdades, imprecisões e mentiras que assombram a notória figura do inventor.

Tesla inventou a corrente alternada?

Não. Talvez, ele seja mais lembrado hoje por supostamente ter “inventado” a corrente alternada (CA). No entanto, a CA foi descoberta há cerca de um quarto de século antes de Tesla nascer. Enquanto Tesla era um jovem que trabalhava como engenheiro em uma empresa de telefonia, na Europa já estavam desenvolvendo transformadores de CA e a criação de redes experimentais para a transmissão de energia para enviá-la por longas distâncias.

O que Tesla tinha em mente era um campo magnético rotativo, que tornaria possível um motor de indução elétrica que poderia ser executado diretamente a partir da CA, ao contrário de todos os motores elétricos existentes na época, que eram em corrente contínua (CC). Os motores de indução foram projetados antes de seu nascimento, mas ninguém havia os construído. Tesla construiu um protótipo de trabalho, mas apenas dois anos depois de outro inventor, Galileo Ferraris, que também havia concebido, independentemente, o campo magnético rotatório e construído seu próprio protótipo.

Tesla inventou o raio-X?

Não. Na realidade, a história dos raios-X remonta aos experimentos do cientista britânico William Crookes, que investigou, no século XIX, os efeitos de certos gases ao aplicar descargas de energia. Esses experimentos foram desenvolvidos em um tubo à vácuo – tubo de Crookes -, e eletrodos foram utilizados para gerar correntes de alta voltagem. O tubo, ao estar cercado de placas fotográficas, geraria algumas imagens borradas. Em 1887, Tesla começou a estudar o efeito causado pelos tubos de Crookes e, em 1895, acidentalmente, criou a primeira fotografia de raio-X nos Estados Unidos. Quase simultaneamente, Wilhelm Röntgen anunciou sua descoberta dos raios-X. Mais tarde, Tesla fez experimentos com tubos mais potentes para criar esses raios de forma mais forte.

Tesla inventou o rádio e a tecnologia sem fio?

Não. Oficialmente, atribui-se a invenção do rádio a Guglielmo Marconi, embora Tesla (após sua morte), tenha ganhado todas as disputas de patentes que teve com Marconi pela utilização de peças já patenteadas. No entanto, é difícil atribuir a invenção de rádio para uma única pessoa. Ambos trabalharam tanto na parte teórica como na parte experimental, influenciados por dezenas de outros pesquisadores que remontam quase um século. Várias patentes de diferentes tipos de comunicações sem fio começaram a ser apresentadas por outros inventores trinta anos antes. Tesla ficou famoso por sua demonstração de barcos de controle remoto em 1896, mas, entre 1895 e 1896, muitos inventores (na Rússia, Índia, Estados Unidos e Europa) fizeram todo tipo de demonstrações de rádio controle. As contribuições de Tesla para o rádio foram tão boas como qualquer outra, mas, dificilmente, “revolucionaria” um campo que estava explodindo na época.

Tesla se propôs a dar ao mundo energia sem fio e gratuita?

A famosa Torre de Wardenclyffe, também conhecida como Torre de Tesla, foi projetada para comunicações sem fio em todo o Atlântico. Entretanto, o seu sistema de energia sem fio utilizaria a ressonância Schumann-Tesla para carregar a ionosfera da Terra de tal modo que, a partir de uma simples bobina de mão, poderia se receber energia elétrica de graça em qualquer lugar do mundo, ao menos em teoria. A ideia de Tesla era inovadora, mas foi apenas isso. Agora que a ciência compreende melhor a natureza da ionosfera, os físicos acreditam que o conceito de Tesla é inviável. Existem todos os tipos de teorias da conspiratórias sobre o assunto, por exemplo, de que o HAARP, o centro de pesquisa no Alasca, é uma prova secreta da existência de uma rede elétrica de Tesla, ou algum tipo de super arma baseada nela. As profundas diferenças entre esses sistemas se tornam cada vez mais claras ao se fazer a mais básica das investigações.

Tesla inventou o “Raio da Morte”?

Não. Os investimentos nos projetos de Tesla foram interrompidos com a chegada da Grande Depressão na década de 1930. Durante os últimos dez anos de sua vida, Tesla não tinha dinheiro e estava morando em um hotel em Nova York, consumido por aquilo que entendemos hoje por transtorno obsessivo compulsivo (TOC). Foi durante este período (e não antes, durante seus anos produtivos em laboratório) que ele falou abertamente sobre ter construído e testado um “Raio de Morte”. Porém, nenhum dos assistentes de laboratório de Tesla confirmou isso, e nenhuma evidência, protótipo ou prova foram encontrados até hoje. Foram dadas apenas descrições vagas com conselhos inadequados sobre o tipo de tecnologia que poderia ser usada em tal arma. Tudo indica que foram apenas divagações de uma mente deteriorada.

Um gênio anônimo e esquecido?

A ideia de que durante a sua vida Tesla foi quase ignorado, que nunca recebeu a atenção e dinheiro e que sofreu com a injustiça de um mundo que não estava pronto para um gênio avançado, é heroica e atraente, mas, talvez, não seja inteiramente verdadeira. Embora muitos de seus projetos não tenham conseguido financiamento, algo que aconteceu com praticamente todos os cientistas da época, muitas vezes também recebiam apoio financeiro de notáveis investidores, como foi mencionado por J. P. Morgan. Ademais, ele e Thomas Edison eram considerados quase celebridades em seu tempo. Conquanto, muitas vezes, Tesla tenha sido visto como um solitário, tímido e um gênio incompreendido, ele tinha seus momentos de showman. Sua famosa Bobina de Tesla foi testada durante manifestações públicas diante de uma multidão.

Como acontece com qualquer mito, a história da vida de Tesla, suas obras, invenções e projetos, frequentemente, tendem a ser adoradas e exageradas, carregadas por certo heroísmo que não corresponde totalmente com a realidade. Obviamente, isso não tira a ideia de que Tesla foi um dos nomes mais importantes e influentes do campo científico, mas não é saudável proferir mentiras e sensacionalismos acerca do cientista.

Referências

  • Cheney, M., Uth, R. Tesla: Master of Lightning. New York: Barnes & Noble, 1999. 87-95.
  • Childress, D. The Fantastic Inventions of Nikola Tesla. Chicago: Adventures Unlimited Press, 1993. 249.
  • O’Neill, J. Prodigal Genius: The Life of Nikola Tesla. New York: I. Washburn, Inc., 1944.
  • PBS. “The Missing Papers” Tesla – Life and Legacy. Corporation for Public Broadcasting, 24 Jan. 2001. Web. 12 Jan. 2013.
  • Tesla, N. Colorado Springs Notes. Beograd: Nolit, 1978. 333.
  • Villarejo-Galende A., Herrero-San Martin A. “Nikola Tesla: Flashes of Inspiration”. Revista de Neurologia. 16 Jan. 2013, Volume 56, Number 2: 109-114.
Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Divulgador Científico há mais de 10 anos. Fundador do Universo Racionalista. Consultor em Segurança da Informação e Penetration Tester. Pós-Graduado em Computação Forense, Cybersecurity, Ethical Hacking e Full Stack Java Developer. Endereço do LinkedIn e do meu site pessoal.