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Quatro coisas sobre a Matéria Escura que talvez você não saiba

Por Kathryn Jepsen
Publicado na Symmetry Magazine

Não muito tempo depois dos físicos do Large Hadron Collider (LHC) no CERN descobrirem o bóson de Higgs, o diretor geral do CERN, Rolf Heuer, foi perguntando sobre qual seria o próximo passo, e como uma das principais prioridades ele citou: Descobrir a matéria escura.

A matéria escura é cinco vezes mais predominante que a matéria comum. Ela parece existir em aglomerados por todo o universo, se tornando perceptível nas galáxias. A natureza da matéria escura é desconhecida, mas físicos sugerem que ela, como a matéria visível, é feita de partículas.

A matéria escura aparece periodicamente na mídia, muitas vezes quando um experimento detecta um possível sinal dela. Mas continuamos esperando pelo prêmio Nobel que virá quando cientistas finalmente encontrá-la.

Aqui está quatro fatos sobre a matéria escura que talvez você não soubesse:

1. Nós já descobrimos a Matéria Escura

Créditos da Imagem: Sandbox Studio, Chicago.
Créditos: Sandbox Studio, Chicago.

Atualmente vários experimentos estão na busca pela matéria escura. Mas cientistas já descobriram sua existência há décadas atrás.

Nos anos de 1930, o astrofísico Fritz Zwicky observava as rotações das galáxias que formam os aglomerado de Coma, um grupo de mais de 1000 galáxias localizado a 300 milhões de anos luz da Terra. Ele estimou a massa dessas galáxias baseado na luz que elas emitem. Ele ficou surpreso por descobrir que, se sua estimativa estivesse correta, diante da velocidade que as galáxias se encontravam elas deveriam se separar. De fato, o aglomerado precisava de 400 vezes mais massa do que havia sido calculado para se manter unido. Algo misterioso parecia estar atuando no processo: uma matéria “escura” não observada parecia estar adicionando massa as galáxias.

A ideia de matéria escura foi vastamente ignorada até os anos de 1970, quando a astrônoma Vera Rubin observou algo que lhe deu o mesmo pensamento. Ela estudava a velocidade das estrelas se movendo ao redor do centro da nossa galáxia vizinha Andrômeda. Ela antecipou que as estrelas nas bordas da galáxia deveriam se mover mais lentamente do que aquelas no seu centro porque as estrelas mais próximas do aglomerado brilhante (e portanto massivo) de estrelas no centro deveria sentir uma maior atração gravitacional. No entanto, ela encontrou que as estrelas nas margens da galáxia se movia tão rápido quanto aquelas no meio. Isso faria sentido, pensou ela, se o disco de estrelas visíveis fosse cercado por um círculo ainda maior feito de algo que ela não podia ver: algo como uma matéria escura.

Outras observações astronômicas tem desde então confirmado que algo estranho está acontecendo na forma como as galáxias e a luz se movem através do espaço. É possível que a nossa confusão decorra de uma falha em nossa compreensão da gravidade, a própria Rubin diz preferir essa ideia. No entanto, se é verdade que a matéria escura existe, nós já somos capazes de ver seus efeitos.

2. Nós possivelmente já observamos a Matéria Escura

Créditos da Imagem: Sandbox Studio, Chicago.
Créditos: Sandbox Studio, Chicago.

Muitos experimentos estão buscando pela matéria escura, e alguns deles talvez já a tenham encontrado. O problema é que nenhum experimento foi capaz de reivindicar a descoberta com confiança o suficiente para convencer a comunidade científica, quer seja devido as estatísticas ou pela incapacidade de descartar possíveis explicações alternativas. E nenhuma das reivindicações se alinharam de maneira convincente para os cientistas declararem qualquer resultado como confirmado.

Em 1998 cientistas no experimento DAMA, um detector de matéria escura nas profundezas da montanha Gran Sasso na Itália, observou um padrão promissor em seus dados. A taxa no qual o experimento detectou sinal de possíveis partículas de matéria escura mudou ao longo do ano, subindo até seu pico em junho e diminuindo até pontos mais baixos em dezembro.

Era exatamente o que os cientistas do DAMA esperavam encontrar. Se nossa galáxia está cercada por um envoltório de matéria escura, a Terra está constantemente se movendo através dele a medida que orbita o Sol, e o Sol está constantemente se movendo através da matéria escura a medida que orbita o centro da Via Láctea. Durante metade do ano, a Terra está se movendo na mesma direção. Durante a outra metade, ela está se movendo na direção oposta. Quando a Terra e o Sol estão se movendo em conjunto, suas velocidades combinadas através do envoltório de matéria escura é mais rápido que a velocidade da Terra quando ela e o Sol estão em desacordo. Os resultados do DAMA parece ter revelado que a Terra realmente está se movendo através de um envoltório de matéria escura.

No entanto, existe algumas lacunas; as partículas observadas pelo detector no DAMA podem ser outra coisa que não seja a matéria escura, alguma coisa através da qual a Terra e o Sol estão constantemente se movendo. Ou algo poderia estar mudando o meio nas proximidades. O experimento DAMA, agora chamado de DAMA/LIBRA, continua observando essa modulação anual, mas os resultados não são conclusivos o bastante para a maioria dos cientistas ao ponto considerar isso como uma descoberta da matéria escura.

Vai ser difícil para qualquer experimento convencer os cientistas de que eles encontraram a matéria escura. Pode ser que isso aconteça quando vários experimentos começarem a ver a mesma coisa. Mas isso vai depender do que eles encontrarem, diz Neal Weiner, teórico diretor do Center for Cosmology and Particle Physics na Universidade de Nova Iorque. A matéria escura pode vir a ser algo mais estranho e mais complicado do que esperávamos.

Em 2008 o experimento PAMELA situado no espaço detectou um excesso de pósitrons, o que poderia ser resultado de partículas de matéria escura colidindo e aniquilando umas as outras. Em 2013 o experimento AMS-02, anexado a Estação Espacial Internacional, encontrou o mesmo resultado com um nível de certeza ainda maior. Mas cientistas continuam não convencidos, argumentando que os pósitrons podem estar advindo de pulsares.

Experimentos subterrâneos (CoGeNT, XENON, CRESST, CDMS e LUX) têm apoiado e renunciado por vezes possíveis observações da matéria escura. Parece que precisaremos esperar até que a próxima geração de experimentos de matéria escura esteja completa para obter um quadro mais claro.

3. Não sabemos como a Matéria Escura se parece; Podem haver vários tipos que compõem todo um “Setor Escuro”

Créditos da Imagem: Sandbox Studio, Chicago.
Créditos: Sandbox Studio, Chicago.

Cientistas têm construído vários modelos sobre como a matéria escura deve parecer. O principal candidato atualmente é o chamado WIMP, Partícula Massiva que Interage Fracamente (Weakly Interacting Massive Particle). Outros possíveis incluem partículas convenientemente já previstas em modelos da supersimetria, uma teoria que adiciona uma nova partícula fundamental correspondente a cada uma já conhecida. Grupos de cientistas estão também procurando por partículas de matéria escura chamadas áxions.

Mas não há razão para crer que exista um único tipo de partícula de matéria escura. A matéria visível, os quarks, glúons e elétrons que compõem tudo ao nosso redor, juntamente com um jardim zoológico inteiro de partículas e forças fundamentais, incluindo os fótons, neutrinos e os bósons de Higgs, compõem apenas 5% do universo. O resto é matéria escura, que compõem 23%, e energia escura, uma outra história na física que reivindica os 72% restantes.

Como Weiner colocou: imagine um cientista num mundo de matéria escura tentando entender a matéria visível. A matéria visível compõem uma pequena fração do que há lá fora; os cientistas de matéria escura iriam adivinhar sua variedade? O mundo que conhecemos é muito diverso; Por que a matéria escura seria tão simples? Cientistas têm se perguntando se as partículas escuras podem se combinar em átomos escuros que interagiriam através do eletromagnetismo escuro. Poderia a química escura ser a próxima? Cientistas começaram a procurar por partículas de matéria escura previstas em modelos do “setor escuro”.

4. Há grandes chances de observarmos a Matéria Escura nos próximos 5 ou 10 anos, mas talvez nunca a veremos por completo

Créditos da Imagem: Sandbox Studio, Chicago.
Créditos: Sandbox Studio, Chicago.

São tempos de glória para um cientista em busca da matéria escura. Com um número de ideias experimentais diferentes programadas para se concretizar nos próximos anos, muitos preveem que a matéria escura estará ao nosso alcance dentro de uma década.

“Uma das coisas realmente animadoras é que todas essas técnicas estão chegando a maturidade ao mesmo tempo”, diz o teórico Tim Tait da Universidade da Califórnia, em Irvine. “É uma grande oportunidade para jogá-las umas contra as outras e ver o que está acontecendo”.

Os cientistas podem encontrar a matéria escura de muitas formas diferentes.

Primeiro, eles podem detectá-la diretamente. A detecção direta envolve esperar pacientemente com um grande e sensível experimento em um quieto e subterrâneo laboratório, tão livre quanto possível de potenciais interferências de outras partículas. Nos próximos anos, os cientistas vão diminuir a sua lista atual de tecnologias de detecção para focarem seus recursos na construção da maior e mais sensível geração de experimentos até o momento.

A segunda forma de encontrar matéria escura é observá-la indiretamente, buscando por seus efeitos através de experimentos situados no espaço. Atualizações dos atuais experimentos em satélites ou na Estação Espacial Internacional darão aos cientistas mais dados para ajudá-los a determinar o significado dos possíveis efeitos da matéria escura que eles têm observado.

A terceira forma de encontrar matéria escura é produzi-la em uma acelerador como o Large Hadron Collider (LHC). É possível que, quando dois feixes de partículas colidam no LHC, suas energias se convertam em massa na forma de matéria escura. O LHC está atualmente passando por uma pausa para manutenções e atualizações, mas quando ele estiver de volta em 2015, ele irá operar com mais do dobro da sua energia anterior, abrindo a porta para produzir partículas nunca antes produzidas.

Uma vez que cientistas encontrem a matéria escura usando um dos métodos, eles vão ser capazes de concentrar seus esforços nisso, diz Tait. Uma vez que saibamos mais sobre as suas propriedades, “isso realmente vai energizar essa atividade”, diz ele. “Neste momento estamos num quarto escuro, tateando ao redor. Uma vez que você sabe onde está a coisa que você está procurando, você pode estudá-la com mais cuidado”.

Mas também é possível que a matéria escura esteja fora do nosso alcance, incapaz de ser detectada ou produzida. Se cientistas não observarem a matéria escura nos próximos 10 anos, eles podem precisar encontrar uma nova maneira de procurá-la. Ou talvez seja preciso reconsiderar o que sabemos sobre a gravidade.

Alberto Albuquerque

Alberto Albuquerque

Sou graduando em física pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Cursei 2 anos de Engenharia Mecânica pela mesma instituição. Sou cético, agnóstico e entusiasta em física.