Artigo traduzido de Scientific American. Autor: Jennifer Hackett.
Em um trecho escuro do frio cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, o módulo Philae começou uma vigília solitária e silenciosa. Depois que aterrisou desajeitadamente e saltou sobre a superfície do cometa em 12 de Novembro de 2014, a Philae operou por pouco menos de três dias antes de ficar sem energia e hibernar. À medida que o cometa se aproximou do sol em 2015 e a nave espacial movida a energia solar aqueceu e recarregou suas baterias, a Agência Espacial Europeia (ESA) restabeleceu contato em 13 de junho, mas as mensagens eram esporádicas e a nave ficou em silêncio em 9 de julho. Após tentativas incansáveis para recuperar o contato com a primeira nave espacial a pousar em um cometa, a ESA vai encerrar oficialmente a missão de Philae esta semana. Rosetta, a sonda que lançou Philae ao cometa, ainda está orbitando o corpo e vai continuar a recolher dados.
Perder o contato com uma nave espacial, seja ele um módulo que ficou sem energia ou um orbitador que foi intencionalmente desativado, é sempre amargo – e também esperado – para os seres humanos que o construiram e o operavam. “Se você planeja a sua missão, você está ciente de que você só tem determinado dado tempo para recolher seus dados”, diz Stephan Ulamec, o gerente do módulo Philae para a missão Rosetta.
Philae teve uma vida pedregosa no Cometa 67P. Havia muitas formas possíveis da equipe de engenharia pousar a Philae. Ao contrário dos módulos destinados a Marte ou a lua, Ulamec e sua equipe não sabia se o local de pouso de Philae seria visto com antecedência e sabia muito pouco sobre o próprio cometa, porque nenhuma nave espacial anterior alguma vez o viu de perto. Os planejadores da missão tiveram que esperar até a sonda Rosetta atingir o cometa e enviar de volta imagens da superfície antes que eles pudessem começar a selecionar rapidamente um bom local de pouso. Devido a essas restrições, ao invés de projetar o módulo para o terreno específico, eles tiveram que torná-lo flexível o suficiente para operar em uma variedade de possíveis topografias.
Essa flexibilidade foi vital quando Philae deu seu primeiro salto na superfície do cometa 67P/C-G e pousou em uma região inóspita do cometa, chamada Abydos. Sem luz solar, o painel solar da Philae não conseguiu coletar luz suficiente para manter o módulo operando. Ele foi capaz de usar sua bateria para operar por alguns dias, durante os quais tirou medidas da composição e resistência da superfície do cometa e propriedades magnéticas e ao mesmo tempo tirou fotos e digitalizações de propriedades internas do cometa. Na verdade, ele foi capaz de completar cerca de 80% de seus objetivos científicos primários em sua vida operacional curta.
Se a Philae tivesse sido capaz de ancorar-se ao seu local de pouso rapidamente selecionado, ela poderia ter ficado em contato com a Terra durante meses e não dias. Infelizmente, ela foi incapaz de garantir sua segurança na superfície do cometa na sua aterrissagem inicial. Uma combinação de arpões e propulsores ligados ao módulo projetados para ancorá-la falharam; os parafusos de gelo feitos para furar material macio não conseguiram penetrar na superfície dura. Por causa da gravidade extremamente baixa do cometa, depois de tocar o solo, ela saltou para um local menos favorável, ficando provavelmente na sombra, incapaz de usar seus painéis solares para recarregar suas baterias.
Favoravelmente, o salto ajudou a revelar alguns detalhes sobre a superfície do cometa, que pensavam inicialmente ser relativamente macio. “Muitas pessoas estavam nos avisando que iríamos afundar na superfície, como se você deixasse uma pedra cair na neve”, diz Ulamec. Em vez disso, o salto da Philae provou, surpreendentemente, que a superfície do cometa era dura.
Perder contato com o módulo não decepcionou Ulamec, considerando o quão desafiadora era a missão e a quantidade de dados que a Philae conseguiu coletar apesar das suas dificuldades. “O que foi um pouco decepcionante foi estabelecer contato novamente no verão passado e sentir que havia uma chance real de obter dados adicionais”, diz Ulamec. Mas dizer adeus a Philae sempre foi o plano. “O fato é que temos uma vida limitada, é assim que estas missões têm que ser”.
Muitas vezes, a vida é mais longa do que o previsto. O rover Opportunity da NASA, por exemplo, explorou a superfície de Marte durante os últimos 12 anos, enquanto tínhamos a conservadora expectativa que a sua vida útil inicial fosse de apenas 90 dias. “O coelhinho da Energizer não teria durado um dia em Marte, mas este rover durou mais de 4 mil dias e ele continua funcionando”, diz John Callas, gerente do projeto Mars Exploration Rover para Spirit e Opportunity. “É como se a sua avó de 95 anos jogasse uma partida difícil de tênis todos os dias”.
O gêmeo da Opportunity, Spirit, teve longa duração em comparação com Philae, mas sua morte final foi por razões semelhantes. Depois de seis anos, o Spirit atolou na areia e não conseguiu posicionar seus painéis solares em direção ao Sol para coletar energia suficiente para abastecer seus aquecedores e sobreviver ao inverno marciano.
Depois de décadas de sondas lançadas para o espaço em nome da NASA, ESA e outras agências espaciais internacionais, naves espaciais mortas agora pontilham o sistema solar, elas estão à deriva pelo espaço, em órbita, em escombros ou em repouso nas superfícies dos planetas, asteroides, cometas e luas. “Estes veículos são nossos representantes para a exploração. Nós os colocamos nesses ambientes agressivos e nós os enviamos nestas viagens só de ida – e não vamos trazê-los para casa”, diz Callas. Estes veículos robóticos aprofundam nossa compreensão do sistema solar, indo onde os seres humanos não podem ir. Embora seja sempre triste dizer adeus, o que eles descobriram perdura e alimenta futuras missões.
Entretanto, a sonda Rosetta ainda está forte e, idealmente, entrará na órbita baixa do cometa ainda este ano. Nesse ponto, ela deverá ser capaz de obter um visual do módulo no cometa. Assim, embora não sejamos capazes de nos comunicar com Philae, essa provavelmente não é a última vez que veremos o explorador robótico.