Por Jonathan Amos
Publicado na BBC
Construíram um “telescópio virtual” do tamanho da Terra a partir da conexão de vários receptores de rádio – do Polo Sul ao Havaí, Américas e Europa.
Espera-se, com otimismo, que as observações que serão feitas entre 5 e 14 de abril desse ano finalmente mostre o “tesouro” procurado há muito tempo.
Na mira do chamado “Telescópio Event Horizon” estará o monstruoso buraco negro no centro da nossa galáxia.
Embora nunca visto diretamente, este objeto, catalogado como Sagittarius A*, foi estimado existir de forma que perturbe as órbitas das estrelas vizinhas.
Essa corrida em torno de um ponto no espaço a milhares de km por segundo, sugere que o buraco negro tenha uma massa cerca de 4 bilhões de vezes a massa do Sol.
Mas por mais colossal que pareça, a “borda” do buraco negro – o horizonte dentro do qual a imensa gravidade prende toda luz – pode não ter mais que 20 milhões de km de extensão.
E a distância de 26 mil anos-luz da Terra faz com que Sagittarius A* pareça uma cabeça de alfinete no céu.
A equipe do Telescópio Event Horizon (EHT), no entanto, está otimista.
“Há uma grande expectativa”, disse o líder do prjeto Sheperd Doeleman, do Centro Havard-Smithsonian de Astrofísica em Cambridge, Massachusetts.
“Desenvolvemos nosso telescópio virtual durante duas décadas e agora, em abril, vamos fazer as observações que podem ser a primeira chance real de trazer o horizonte de evento do buraco negro em foco”, disse à BBC News.
O truque do EHT é uma técnica chamada very long baseline array interferometry (VLBI).
Essa técnica combina uma rede de antenas de rádio amplamente espaçadas para imitar a abertura do telescópio, capaz de produzir a resolução necessária para encontrar um alfinete no céu.
Inicialmente, o EHT irá obter cerca de 50 microssegundos de arco. Membros da equipe descrevem a nitidez da visão como sendo o equivalente a ver algo do tamanho de uma laranja na superfície da Lua.
Eles reforçam que ainda há anos de trabalho pela frente, mas também que há uma perspectiva iminente de avanço a ser trilhado.
Os cientistas têm uma expectativa do que irão ver, caso sejam bem sucedidos.
Simulações baseadas nas equações de Einstein preveem um anel brilhante de luz em torno de um traço escuro.
A luz seria a emissão de gás e poeira acelerados a alrt velocidade e dilacerados apenas antes de desaparecer dentro do buraco negro.
O traço escuro seria a sombra do buraco negro nesse turbilhão.
“Agora, pode ser que vejamos algo diferente”, disse Doeleman.
“Como já disse anteriormente, nunca é uma boa ideia apostar contra Einstein, mas se virmos algo muito diferente do que esperamos, teremos que reavaliar a teoria da gravidade. Não espero por isso, mas qualquer coisa pode acontecer, e essa é a beleza da coisa.”
Ao longo dos anos, mais e mais instalações de radioastronomia se juntaram ao projeto. Uma importante adição recente foi o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) no Chile.
Sua extraordinária tecnologia de ponta aumentou a sensibilidade do EHT por um fator de 10. Daí o otimismo antes de abril.
Mesmo assim, os cientistas tiveram de instalar equipamentos especiais em todas as instalações de rádio envolvidas nas observações.
Isso inclui grandes discos rígidos para armazenar volumes colossais de dados, e relógios atômicos para sincronizar precisamente tudo.
Nada acontece no local das detecções – os discos rígidos devem primeiro ser transportados para uma grande instalação de computação no MIT Haystack Observatory em Westford, nos arredores de Boston, Massachusetts.
“Nossos módulos de disco rígido possuem a capacidade de cerca de 100 laptops padrão”, disse Vincent Fish, do Haystack.
“Temos vários módulos em cada telescópio e temos vários telescópios na matriz, então, no final das contas, estamos falando de 10.000 laptops de dados”.
É no computador do correlator de Haystack que a síntese começará.
Alguns algoritmos de imagem muito inteligentes tiveram de ser desenvolvidos para dar sentido às observações do EHT, mas não será um resultado rápido.
Talvez 2018 chegue antes da equipe liberar uma imagem para o público.
Olhando para o futuro, os cientistas já estão pensando em como estender suas técnicas.
Por exemplo, a matéria mais próxima do horizonte de eventos e prestes a desaparecer em Sagittarius A* deve levar cerca de 30 minutos para completar uma órbita.
Katie Bouman, do Laboratório de Informática e Inteligência Artificial do MIT, acha que seria possível capturar esse movimento.
“Queremos ultrapassar os limites e tentar fazer vídeos a partir dos dados”, disse à BBC News.
“Talvez possamos realmente ver algum gás fluir em torno do buraco negro. Essa é a próxima fase do que estamos tentando realizar com esses algoritmos de imagem.”
Mas antes de tudo, a equipe precisa de um clima estável nas estações de observação participantes em abril.
A estratégia é ver o centro galáctico com um comprimento de onda de 1,3 mm (230 GHz), que tem a melhor chance de perfurar qualquer gás obscuro e poeira nas proximidades do buraco negro. Mas se houver muito vapor de água acima dos receptores da matriz, o EHT vai lutar até mesmo para ver através da atmosfera da Terra.
Ter uma imagem de alta resolução de Sagittarius A* seria um triunfo notável em si. Mas o objetivo real aqui é usar a capacidade de imagem para testar aspectos da relatividade geral.
Se houver falhas a serem encontradas nas ideias de Einstein – e os cientistas suspeitam que existam explicações mais completas sobre a gravidade lá fora à espera de serem descobertas – então será no ambiente extremo de buracos negros que as limitações deverão estar expostas.