Por Mike McRae
Publicado na ScienceAlert
O capítulo final da história dos dinossauros é um conto que se estende por dois mundos muito diferentes, cada um deles sendo vastos supercontinentes dominados por sua própria mistura única de predadores e herbívoros.
Restos fossilizados de um herbívoro comum a uma das duas principais massas terrestres foram inesperadamente desenterrados em rochas pertencentes à outra, o que levou os paleontólogos a se perguntarem como ele conseguiu chegar até lá.
“Estava completamente fora do lugar, como encontrar um canguru na Escócia”, disse o paleontólogo da Universidade de Bath Nicholas Longrich, que conduziu um estudo sobre a recente descoberta.
Esse ‘canguru’ fora do lugar era, na verdade, um tipo recém-categorizado de dinossauro bico de pato com uma crista óssea, conhecido como hadrossaurídeo (um parente do lambeossauro para ser mais preciso).
Há cerca de 66 milhões de anos, quando o período Cretáceo se aproximava de um fim cataclísmico, os hadrossauros de diversas variedades diferentes estavam entre os mais comuns dinossauros herbívoros.
Pelo menos, esse foi o caso no supercontinente Laurásia – uma massa terrestre que mais tarde se dividiria para dar origem aos atuais continentes da América do Norte, Europa e grande parte da Ásia.
Do outro lado do oceano, uma massa terrestre separada conhecida como Gonduana era governada por uma diversidade de saurópodes pesados com pescoço longo.
Os restos mortais desses gigantes são comumente encontrados em lugares como África, Índia, Austrália e América do Sul.
Hollywood achou adequado misturar os dois grupos, mas por conta de grandes extensões de água entre os continentes e longos períodos de isolamentos no final do Cretáceo, os bicos de pato e de pescoços longos só teriam se misturado potencialmente em distintas regiões, como onde é hoje a Europa.
Esse mais novo membro da família hadrossaurídeo pode ser uma nova exceção.
Com base em alguns poucos pedaços de mandíbula e um punhado de dentes encontrados em uma mina de fosfato no Marrocos, a descoberta é a evidência de que, pelo menos, um desses animais deve ter vagado ainda mais longe da Laurásia do que se suspeitava anteriormente.
Bem, talvez não tenha vagado, apenas nadado.
“Era impossível ir a pé à África”, disse Longrich.
“Esses dinossauros evoluíram muito depois da deriva continental dividir os continentes, e não temos evidências de pontes terrestres. A geologia nos diz que a África estava isolada pelos oceanos. Nesse caso, a única maneira de chegar lá é pela água”.
A ideia não é tão complexa quanto pode parecer à primeira vista. Os hadrossauros parecem se sentir em casa perto de ambientes aquáticos e há espécies de todas as formas e tamanhos. Alguns medem até 15 metros de comprimento, com caudas grandes e pernas fortes, capazes de torná-los exímios nadadores.
Com um comprimento menor de 3 metros, esse hadrossauro pode ter tido um pouco mais de dificuldade em fazer uma maratona que poderia incluir centenas de quilômetros de águas abertas. No entanto, há várias teorias sobre animais menores cruzando rapidamente os oceanos em jangadas flutuantes de vegetação – por que não um dinossauro relativamente pequeno?
“Eventos que ocorrem uma vez em um século podem acontecer muitas vezes na perspectiva de milhões anos. Travessias oceânicas são necessárias para explicar como lêmures e hipopótamos chegaram à Madagascar, ou como macacos e roedores cruzaram da África para a América do Sul”, diz Longrich.
Combinando a palavra árabe para “estrangeiro” com o nome de um famoso marinheiro grego, os cientistas apelidaram o hadrossauro de Ajnabia odysseus.
O mesmo conjunto que continha a mandíbula de Ajnabia também tinha alguns raros outros ossos de dinossauros, incluindo partes de titanossauros e de terópodes carnívoros chamados abelisauros da Gonduana.
Pode não ser suficiente reimaginar a divisão entre os supercontinentes do Cretáceo momentos antes de um asteroide mudar tudo. Mas isso fará a gente repensar a ideia do oceano como uma barreira intransponível.
“Pelo que eu sei, somos os primeiros a sugerir travessias oceânicas para dinossauros”, diz Longrich.
A pesquisa foi publicada na Cretaceous Research.