Por Peter Dockrill
Publicado na ScienceAlert
Elas estão entre as maiores e mais estranhas de todas as estruturas da Terra: bolhas enormes e misteriosas de rocha densa escondidas nas partes mais baixas do manto do nosso planeta.
Existem duas dessas massas gigantescas – chamadas de grandes províncias de baixa velocidade de cisalhamento (LLSVPs, na sigla em inglês) – com uma soterrada sob a África e a outra abaixo do Oceano Pacífico.
Essas anomalias são tão massivas que, por sua vez, geram seus próprios distúrbios, como o grande fenômeno que atualmente está em andamento e enfraquece o campo magnético da Terra, conhecido como Anomalia do Atlântico Sul.
Quanto a como e por que as LLSVPs vieram a existir assim dentro do manto, os cientistas têm muitas ideias, mas poucas na forma de provas concretas.
O que se sabe, no entanto, é que essas bolhas gigantes existem há muito tempo, com muitos pensando que poderiam ter feito parte da Terra desde antes do impacto gigante que deu origem à Lua – vestígios antigos da colisão entre a Terra e o planeta hipotético Theia.
De acordo com esse argumento amplamente difundido, o planeta Theia do tamanho de Marte colidiu com a Terra primitiva cerca de 4,5 bilhões de anos atrás, com um grande pedaço de Theia e/ou possivelmente da Terra se fragmentando e se tornando a Lua que conhecemos hoje em órbita ao redor do nosso planeta.
Quanto ao que aconteceu com o resto de Theia, é incerto. Foi destruído ou simplesmente ricochetado para a eternidade no espaço? Nós não sabemos.
Alguns pesquisadores sugeriram que os núcleos desses dois planetas primordiais podem ter se fundido em um, e que as reações químicas provocadas por essa fusão épica são o que permitiu à própria vida prosperar no mundo resultante.
Agora, os cientistas se voltaram para essas questões monumentais com uma nova proposta, e é uma ideia que também se liga às misteriosas bolhas LLSVP, juntando-as a hipótese do híbrido Terra/Theia.
De acordo com uma nova modelagem feita por pesquisadores da Universidade do Estado do Arizona (ASU), as LLSVPs podem representar fragmentos antigos do manto altamente denso e rico em ferro de Theia, que se afundou nas profundezas do manto da Terra quando os dois mundos em desenvolvimento se uniram, ficando enterrado por bilhões de anos.
“A Hipótese do Grande Impacto é um dos modelos mais estudados para a formação da Lua, mas as evidências diretas indicando a existência do planeta Theia permanecem elusivas”, explicam os pesquisadores, liderados pelo autor principal Qian Yuan, um candidato a PhD que estuda a dinâmica do manto da Terra na Universidade do Estado do Arizona, em um resumo de suas descobertas apresentadas na semana passada na Conferência de Ciência Lunar e Planetária.
“Demonstramos que o manto de Theia pode ser vários por cento intrinsecamente mais denso do que o manto da Terra, o que permitiria que os materiais do manto de Theia afundassem no manto mais inferior da Terra e se acumulassem em pilhas termoquímicas que podem causar as LLSVPs observadas sismicamente”.
Embora já existam especulações há anos de que as LLSVPs podem ser uma lembrança alienígena implantada por Theia, a nova pesquisa parece ser a formulação mais abrangente até então. As descobertas estão atualmente sob revisão, antes da futura publicação na Geophysical Research Letters.
Além da modelagem do manto, os resultados também são consistentes com pesquisas anteriores, sugerindo que certas assinaturas químicas ligadas às LLSVPs são, pelo menos, tão primitivas quanto o impacto de Theia.
“Portanto, os materiais primitivos podem ter sido originados das LLSVPs, o que é bem explicado se as LLSVPs preservarem materiais do manto de Theia que são mais antigos do que o Grande Impacto”, escrevem Yuan e seus coautores.
Teremos que ver como o resto da comunidade científica responde às descobertas da equipe, mas pelo menos por agora, temos outra pista sobre o que essas anomalias misteriosas podem ser – e é literalmente a explicação mais estranha até agora.
“Essa ideia maluca é pelo menos possível”, disse Yuan à Science.
As descobertas foram apresentadas na 52ª Conferência de Ciência Lunar e Planetária, conduzida como um evento virtual na semana passada.