Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert
Durante a maior parte de um século, a física quântica e a teoria da relatividade geral vêm passando por um casamento conturbado. Cada um perfeito à sua maneira, os dois simplesmente não se suportam quando estão na mesma sala.
Agora, uma prova matemática sobre a natureza quântica dos buracos negros pode nos mostrar como os dois podem se reconciliar, pelo menos o suficiente para produzir uma grande nova teoria sobre como o Universo funciona em escalas cósmicas e microcósmicas.
Uma equipe de físicos demonstrou matematicamente uma peculiaridade estranha sobre como esses objetos incrivelmente densos podem existir em um estado de superposição quântica, ocupando simultaneamente um espectro de características possíveis.
Seus cálculos mostraram que as superposições de massa em um tipo teórico de buraco negro chamado buraco negro BTZ ocupam faixas de massas surpreendentemente diferentes simultaneamente.
Normalmente, qualquer partícula comum pode existir em uma superposição de estados, com características como rotação ou momento determinados apenas quando se tornam parte de uma observação.
Onde algumas qualidades, como carga, só se revelam em unidades discretas, a massa não é tipicamente quantizada, o que significa que a massa de uma partícula não observada pode ficar em qualquer lugar dentro de uma faixa possível e indefinida.
No entanto, como mostra esta pesquisa, a superposição de massas mantidas por um buraco negro tende a favorecer algumas medidas em detrimento de outras em um padrão que pode ser útil para modelar massa de maneira quantizada. Isso poderia nos dar uma nova estrutura para investigar os efeitos gravitacionais quânticos de buracos negros em superposição, a fim de aliviar a tensão entre a relatividade geral e a teoria quântica.
“Até agora, não investigamos profundamente se os buracos negros exibem alguns dos comportamentos estranhos e maravilhosos da física quântica”, explicou o físico teórico Joshua Foo, da Universidade de Queensland, na Austrália.
“Um desses comportamentos é a superposição, onde partículas em escala quântica podem existir em vários estados ao mesmo tempo. Isso é mais comumente ilustrado pelo gato de Schrödinger, que pode estar morto e vivo simultaneamente.”
“Mas, para os buracos negros, queríamos ver se eles poderiam ter massas muito diferentes ao mesmo tempo, e acontece que eles têm. Imagine que você é largo e alto, assim como baixo e magro ao mesmo tempo – é uma situação intuitivamente confusa, já que estamos ancorados no mundo da física tradicional. Mas essa é a realidade dos buracos negros quânticos.”
A gravidade extrema ao redor dos buracos negros é um excelente laboratório para sondar a gravidade quântica – o contínuo operante do espaço-tempo de acordo com a teoria da relatividade geral unida à teoria da mecânica quântica, que descreve o Universo físico em termos de quantidades discretas, como partículas.
Modelos baseados em certos tipos de buracos negros podem levar a uma única teoria que poderia explicar partículas e gravidade. Alguns dos efeitos observados em torno de um buraco negro não podem ser descritos sob a relatividade geral, por exemplo. Para isso, precisamos da gravidade quântica – uma teoria unificada que incorpore os dois conjuntos de regras e, de alguma forma, as faça funcionar bem.
Então, Foo e seus colegas desenvolveram uma estrutura matemática que efetivamente permite que os físicos observem uma partícula colocada fora de um buraco negro que está em um estado de superposição quântica.
A massa foi a principal propriedade que eles investigaram, já que a massa é uma das únicas propriedades dos buracos negros que podemos medir.
“Nosso trabalho mostra que as primeiras teorias de Jacob Bekenstein – um físico teórico estadunidense e israelense que fez contribuições fundamentais para a fundação da termodinâmica dos buracos negros – estavam no caminho certo”, disse a física quântica Magdalena Zych, da Universidade de Queensland.
“[Bekenstein] postulou que os buracos negros só podem ter massas de certos valores, ou seja, elas devem ficar dentro de certas faixas ou proporções – é assim que os níveis de energia de um átomo funcionam, por exemplo. Nossa modelagem mostrou que essas massas superpostas estavam, de fato, em determinadas faixas ou proporções – como previsto por Bekenstein.
“Não assumimos nenhum padrão desse tipo, então o fato de encontrarmos essa evidência foi bastante surpreendente.”
Os resultados, disseram os pesquisadores, fornecem um caminho para futuras investigações de conceitos de gravidade quântica, como buracos negros quânticos e espaço-tempo superposto. Para desenvolver uma descrição completa da gravidade quântica, a inclusão desses conceitos é crucial.
Sua pesquisa também permite uma investigação mais detalhada sobre esse espaço-tempo superposto e os efeitos que ele tem nas partículas dentro dele.
“O Universo está nos revelando que é sempre mais estranho, misterioso e fascinante do que a maioria de nós jamais poderia imaginar”, disse Zych.
A pesquisa foi publicada na Physical Review Letters.