Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert
Ossos antigos recuperados de um sítio arqueológico na Alemanha sugerem que os humanos arcaicos esfolavam as peles dos ursos há pelo menos 320.000 anos.
As marcações encontradas na falange e nos ossos da pata metatarsal de um urso-das-cavernas (Ursus spelaeus ou U. deningeri) representam algumas das primeiras evidências conhecidas desse tipo e demonstram uma das medidas que nossos antigos parentes usaram para sobreviver às duras condições do inverno no área na época.
“A caça e forrageamento de ursos, especialmente os das cavernas, tem sido um debate contínuo por mais de um século e é relevante não apenas no contexto da dieta dos hominídeos, mas também para o uso de peles”, escreveu uma equipe de pesquisadores liderada pelo zooarqueólogo Ivo Verheijen, da Universidade de Tubinga, na Alemanha.
“Rastrear as origens da exploração de couro pode contribuir para a compreensão das estratégias de sobrevivência nas condições frias e duras do noroeste da Europa durante o Pleistoceno Médio”.
A região ao redor da cidade alemã de Schöningen é de interesse dos arqueólogos há décadas. Na década de 1990, os pesquisadores descobriram um tesouro de artefatos antigos de uma mina a céu aberto próxima, incluindo as mais antigas armas completas de madeira já descobertas, um conjunto de lanças datadas entre 300.000 e 337.000 anos atrás.
Outros itens incluíam ferramentas de pedra, ferramentas de osso e vários ossos de animais, incluindo os de ursos-das-cavernas. E muitos desses ossos tinham marcas de corte – um sinal de que os humanos antigos estavam abatendo e esfolando os animais, com suas ferramentas arrancando os ossos à medida que avançavam.
Mas as marcas de corte nos dois ossos da pata eram curiosas. Elas não eram apenas pequenas e precisas, mas o fato de estarem lá era motivo de investigação.
“As marcas de corte nos ossos são muitas vezes interpretadas na arqueologia como uma indicação da utilização de carne”, explicou Verheijen. “Mas quase não há carne a ser recuperada dos ossos das patas. Nesse caso, podemos atribuir marcas de corte tão finas e precisas ao cuidadoso esfolamento da pele.”
Eles compararam seus ossos com outros exemplos de marcas de corte em ossos de pata de urso analisados na literatura científica e, finalmente, àqueles atribuídos ao esfolamento. As marcas de corte nos ossos encontrados em Schöningen eram semelhantes o suficiente para Verheijen e sua equipe concluírem que humanos antigos (seja Homo heidelbergensis ou neandertais) estavam esfolando ursos quando o local estava em uso.
É provável que isso tenha fornecido às pessoas uma proteção melhor do que suas próprias peles relativamente sem pelos. Os ursos têm uma pelagem espessa nas épocas mais quentes; no inverno, é complementado pelo crescimento de um subpelo macio que fornece maior isolamento contra o frio. Embora o mundo estivesse em um período interglacial na época – isto é, entre as eras glaciais, com períodos relativamente quentes – os invernos ainda seriam rigorosos.
“Essas marcas de corte recém-descobertas são uma indicação de que, cerca de 300.000 anos atrás, as pessoas no norte da Europa conseguiam sobreviver no inverno graças, em parte, às peles quentes dos ursos”, disse Verheijen.
Isso naturalmente levanta a questão de como as peles foram obtidas. Para ser utilizável, a pele de um urso precisa ser arrancada rapidamente após a morte, então ficar sentado esperando que um urso das cavernas caia morto provavelmente não seja uma estratégia útil. Felizmente, os ossos e armas encontrados no local sugerem uma resposta.
“Se apenas animais adultos forem encontrados em um sítio arqueológico, isso geralmente é considerado uma indicação de caça”, disse Verheijen. “Em Schöningen, todos os ossos e dentes de urso pertenciam a indivíduos adultos.”
Então, juntos, os restos de urso em Schöningen sugerem que os humanos estavam caçando ursos, depois esfolando-os para obter suas peles luxuosas. Como exatamente eles usaram essas peles permanece aberto à especulação, mas é improvável que esses grupos de humanos estivessem andando nus, disseram os pesquisadores; portanto, a probabilidade é que as peles fossem usadas para vestir ou dormir.
A pesquisa foi publicada no Journal of Human Evolution.