Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert
Nossa casa, a Via Láctea, não parece particularmente estranha para uma galáxia. De tamanho moderado, em forma de espiral, com algumas dobras sugestivas de um passado perturbador.
Mas astrônomos acabaram de identificar uma peculiaridade nunca antes vista em nenhuma galáxia estudada até hoje: a Via Láctea é grande demais para seus arredores.
Especificamente, parece ser muito grande para a vizinhança em que se encontra, conhecida como Plano Local. Esse arranjo achatado de galáxias compartilha velocidades semelhantes, limitadas por um espaço relativamente vazio em ambos os lados.
Nosso Plano Local, sendo exemplo de uma ‘parede cosmológica’, separa o Vazio Local em uma direção com o Vazio Sul na outra.
A relação entre as galáxias na Plano Local parece exercer forte influência sobre seu comportamento; por exemplo, suas velocidades semelhantes em relação à expansão do Universo. Fora do ambiente da parede cosmológica, essas velocidades teriam um alcance muito maior.
Para determinar o efeito que o ambiente tem nas galáxias ao nosso redor, uma equipe de astrônomos liderada por Miguel Aragón, da Universidade Nacional Autônoma do México, realizou uma análise usando simulações de um projeto chamado IllustrisTNG, que modela o Universo físico.
Eles não esperavam encontrar nada particularmente fora do comum.
“A Via Láctea é, de certa forma, especial”, disse Aragón. “A Terra é obviamente especial, o único lar da vida que conhecemos. Mas não é o centro do Universo, nem mesmo do Sistema Solar. E o Sol é apenas uma estrela comum entre bilhões na Via Láctea. Até nossa galáxia parecia ser apenas mais uma galáxia espiral entre bilhões de outras no universo observável.”
Mas quando eles simularam um volume de espaço com cerca de um bilhão de anos-luz contendo milhões de galáxias, surgiu uma imagem diferente: apenas um punhado de galáxias com a massa da Via Láctea poderia ser localizado dentro de uma estrutura cercada pela parede cosmológica.
“A Via Láctea não tem uma massa ou tipo particularmente especial. Existem muitas galáxias espirais que se parecem mais ou menos com ela”, disse o astrônomo Joe Silk, do Instituto de Astrofísica de Paris da Universidade Sorbonne, na França.
“Mas é raro se você levar em conta seus arredores. Se você pudesse ver a dúzia mais próxima ou as galáxias igualmente grandes facilmente no céu, você veria que todas elas estão quase em um anel, embutidas no Plano Local. Isso é um pouco pouco especial por si só. O que descobrimos recentemente é que outras paredes de galáxias no Universo, como o Plano Local, muito raramente parecem ter uma galáxia dentro delas que seja tão massiva quanto a Via Láctea.”
A análise da equipe não levou em conta Andrômeda, a maior vizinha galáctica da Via Láctea. Também sendo um elemento do Plano Local – e, portanto, parte da mesma parede cosmológica – é uma galáxia de tamanho semelhante à Via Láctea. Como ter dois pesos pesados em uma parede cosmológica seria ainda mais raro, suas conclusões ainda se aplicam.
No entanto, a pesquisa destaca que talvez precisemos considerar nosso ambiente local ao estudar a Via Láctea, em vez de assumir que nossa casa fica na média em um ponto mediano do Universo.
Como as simulações da equipe consideraram apenas o contexto da Via Láctea dentro de uma parede cosmológica, talvez o trabalho futuro possa explicar mais galáxias dentro do Grupo Local. Os pesquisadores também observam que o contexto ambiental pode ajudar a explicar alguns fenômenos anteriormente inexplicados, como o arranjo incomum de galáxias satélites em torno de Andrômeda e a peculiar falta delas em torno da Via Láctea.
“Você tem que ter cuidado… escolhendo propriedades que se qualificam como ‘especiais'”, disse o astrônomo Mark Neyrinck, da Fundação Basca para a Ciência na Espanha.
“Se adicionássemos uma condição ridiculamente restritiva a uma galáxia, como a de que ela deve conter o que escrevemos no paper sobre isso, certamente seríamos a única galáxia no universo observável assim. Mas achamos que essa propriedade ‘grande demais para seus arredores’ é fisicamente significativa e observacionalmente relevante o suficiente para chamar de realmente especial.”
A pesquisa foi publicada no Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.