Fragmentos de rochas e ossos antigos na Ásia Oriental estão mudando a nossa compreensão da história da migração humana.
São artefatos encontrados no sítio Shiyu, no nordeste da China, e novas análises revelaram que foram criados pelo Homo sapiens há cerca de 45 mil anos.
É a primeira evidência de humanos modernos na Ásia Oriental, sugerindo que o Homo sapiens já havia se estabelecido em Shiyu e provocando uma nova interpretação dos artefatos culturais anteriormente encontrados no local.
“O sítio reflete um processo de crioulização cultural – o contacto entre sociedades e povos realocados – misturando características herdadas com inovações inovadoras, complicando assim a compreensão tradicional da expansão global do Homo sapiens”, explica o arqueólogo Francesco D’Errico, da Universidade de Bordéus.
Shiyu é conhecido há décadas como um local de importância arqueológica. Foi habitado por muito tempo – a sequência sedimentar tem 30 metros (98 pés) de profundidade e as camadas nela foram depositadas ao longo de dezenas de milhares de anos. Enterrados no sedimento, os arqueólogos encontraram uma rica variedade de ferramentas e artefatos feitos e usados pelas pessoas que viviam lá.
Estabelecer quem eram essas pessoas e há quanto tempo viveram lá tem sido um projeto em andamento. As primeiras escavações, em 1963, renderam milhares de objetos: 15 mil artefatos de pedra, milhares de pedaços de ossos e dentes… e um único fóssil de hominídeo, um pedaço de osso de crânio identificado como pertencente ao Homo sapiens.
No entanto, a maior parte da coleção foi posteriormente perdida, incluindo o fragmento do crânio.
Implacáveis, os cientistas realizaram outra escavação em 2013. Liderados pelo paleoantropólogo Shi-Xia Yang, da Academia Chinesa de Ciências, uma equipe multidisciplinar internacional trabalhou agora para caracterizar o local em detalhe.
Eles selecionaram um grande número de artefatos disponíveis e os analisaram de perto. Eles estudaram ossos de animais encontrados no local. E realizaram novas análises de datação, utilizando técnicas de radiocarbono e luminescência opticamente estimulada para datar com precisão amostras retiradas de diferentes secções da sequência de sedimentos.
A datação revelou que a camada mais antiga da sequência foi depositada há cerca de 45 mil anos. E a análise dos artefatos revelou uma série de competências tecnológicas, como a técnica de Levallois para lapidar pedras, desenvolvida na Europa há cerca de 250 mil anos.
A montagem também inclui pontas de projéteis com pontas e cabos com evidências de fraturas por impacto, sugerindo habilidade de caça. E havia obsidiana que só poderia ter sido obtida de uma grande distância, pelo menos 800 a 1.000 quilômetros (500 a 620 milhas), sugerindo comércio, viagens ou ambos.
Outros itens interessantes incluem uma ferramenta de osso trabalhado e um disco de grafite com um furo no centro, cuja finalidade permanece obscura (embora este último, especulam os pesquisadores, possa ter sido algum tipo de botão grande).
Os ossos de animais no local também eram fascinantes. A maioria deles eram equídeos, ou ossos de cavalo, principalmente adultos. Muitos deles apresentavam marcas de corte indicativas de abate, sugerindo que os habitantes do sítio Shiyu eram caçadores habilidosos que atacavam cavalos.
Ele pinta um quadro complexo e inspirador. “A fusão de diversos traços culturais significa uma adaptação complexa e inovadora por parte dos nossos antepassados durante a sua expansão”, diz Yang.
Combinada com o fragmento de crânio ainda perdido, a descoberta representa uma peça importante da história humana, dizem os pesquisadores. Talvez trabalhos futuros possam revelar mais pistas sobre as pessoas misteriosas que outrora habitaram Shiyu, deixando para trás vestígios da sua astúcia e desenvoltura, que serão descobertos pelos seus descendentes, dezenas de milhares de anos mais tarde.
“Compreender as complexidades do nosso passado antigo pode oferecer informações valiosas sobre os diversos caminhos percorridos pelos nossos antepassados e a riqueza da adaptação humana”, diz o arqueólogo Michael Petraglia, da Universidade Griffith, na Austrália.
“Esta descoberta em Shiyu revela uma história cativante da migração humana primitiva e da fusão cultural, expandindo o nosso conhecimento das nossas origens antigas e da notável adaptabilidade do Homo sapiens.”
Com informações da Nature Ecology & Evolucion publicado em ScienceAlert