Uma nova técnica que gera modelos 3D de cristais individuais abriu uma janela para que os cientistas observem os sutis desvios que surgem em seus padrões perfeitos.
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Os pesquisadores da Universidade de Nova York (NYU) revisitaram a abordagem de como examinar profundamente sólidos compostos por unidades repetitivas e determinar seu crescimento. A pesquisa foi publicada na Nature Materials.
O estudo de tais cristais permitiu avanços na compreensão da dinâmica cristalina. Os pesquisadores mencionam experimentos com estruturas coloidais que elucidam a formação e evolução de deslocamentos dentro das estruturas cristalinas.
Apesar de toda a sua engenhosidade, a cristalografia de raios X tem seus limites. As dificuldades em encontrar maneiras confiáveis de obter imagens de cristais coloidais complexos limitaram seu estudo a estruturas finas e simples formadas a partir de uma única partícula constituinte. No entanto, muitos cristais em escala atômica são compostos de dois ou mais elementos e formam estruturas tridimensionais complexas.
Com um comprimento de onda curto, aproximadamente do mesmo tamanho de muitas das unidades repetitivas que constituem os cristais, os raios X há muito permitem que cientistas infiram como os componentes de um cristal se encaixam, medindo o ângulo em que os raios são difratados. No entanto, a cristalografia de raios X possui limites que são claramente resumidos na frase inicial de um novo artigo publicado na Nature Materials este mês: “As estruturas dos cristais moleculares são identificadas usando técnicas de espalhamento porque não podemos ver dentro deles.”
O artigo descreve uma técnica inovadora que promete mudar esse fato – embora não para cristais compostos por unidades repetitivas de átomos individuais. Em vez disso, trata-se de cristais compostos por padrões baseados em partículas coloidais, grandes o suficiente para serem vistas em um microscópio convencional e manipuladas de uma maneira que seria impossível para os átomos.
A nova técnica desenvolvida pela equipe da NYU promete permitir o estudo de análogos coloidais dessas redes relativamente complexas. A técnica baseia-se em trabalhos anteriores da equipe, nos quais desenvolveram um processo denominado “auto-montagem coulômbica atenuada por polímeros” ( “polymer-attenuated coulombic self-assembly” ou PACS). O processo PACS utiliza as cargas elétricas das partículas coloidais individuais para atraí-las às redes cristalinas, permitindo a construção confiável de cristais coloidais binários – cristais formados por moléculas compostas por duas espécies diferentes de partículas, assim como os cristais de sal de cozinha são formados de sódio e cloro.
O novo estudo demonstra a eficácia de semear essas partículas coloidais individuais com um corante fluorescente para distinguir uma espécie da outra – e, crucialmente, continua a fazê-lo após a formação dos cristais. Isso significa que, finalmente, os cientistas podem “ver dentro” de um cristal completamente formado e fazer observações diretas de seu interior.
Os pesquisadores relatam: “Somos capazes de distinguir todas as partículas dentro de um cristal iônico binário e reconstruir toda a estrutura interna 3D até profundidades de aproximadamente 200 camadas.”
A equipe da NYU relata várias novas descobertas já obtidas a partir dessas observações.
O processo conhecido como “geminação”, onde as redes de dois cristais se alinham de tal forma que compartilham componentes ao longo de um plano comum, tem sido de vasto interesse dos cientistas. Os pesquisadores descrevem a criação de cristais coloidais que reproduzem as estruturas cúbicas em escala atômica de vários minerais diferentes: a já mencionada rede alternada de sódio e cloro que forma o sal de cozinha; cloreto de césio, onde oito átomos de cloro formam uma “gaiola” em torno de um único átomo de césio; e o exemplo um pouco mais exótico do auricuprida, um composto de cobre e ouro, onde cada face de uma rede cúbica de átomos de ouro é pontuada por um único átomo de cobre, como um dado onde cada face é uma unidade.
Em cada caso, a equipe conseguiu fazer observações diretas da evolução dos cristais geminados, proporcionando assim uma observação experimental direta de como tais estruturas surgem. “Esta observação direta desvenda inequivocamente as complexidades internas da estrutura cristalina, elucidando a relação entre as interações das partículas e a forma macroscópica do cristal, incluindo o surgimento e o impacto de defeitos e geminação”, relatam os pesquisadores.
O grupo está ansioso para desvendar os mistérios dos cristais, mais de 100 anos após a descoberta dos raios X ter permitido à humanidade seu primeiro vislumbre das complexidades da estrutura cristalina.