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A Dark Web vende milhares de animais selvagens. Mas não como pets

Traduzido por Julio Batista
Original de Tessa Koumondouros para o ScienceAlert

Em meio à destruição ecológica causada pelo homem, o comércio ilegal de animais selvagens representa uma das maiores ameaças à continuidade da existência de muitas espécies. Infelizmente, a internet permitiu que esse comércio florescesse com mais facilidade do que nunca.

Além de um comércio em expansão na web aberta, uma nova pesquisa identificou centenas de espécies comercializadas na dark web, incluindo o sapo-do-deserto-de-Sonora (Incilius alvarius). Inesperadamente, esse comércio ilegal não é principalmente para animais de estimação.

“O que nos surpreendeu foi que a maioria das espécies que são comercializadas lá são por suas propriedades de drogas recreativas”, disse Phill Cassey, ecologista da Universidade de Adelaide, à Australian Broadcasting Corporation (ABC). “Particularmente para compostos psicoativos.”

Enquanto 90% do comércio de vida selvagem da dark web consistia em plantas e fungos para uso de drogas, alguns animais eram comercializados para os mesmos fins, como o sapo venenoso mencionado anteriormente. As glândulas tóxicas do sapo do deserto de Sonora contêm o psicodélico 5-MeO-DMT.

“As pessoas os comerciam para essencialmente lambê-los”, disse Cassey à ABC.

Sapo-do-deserto-de-Sonora (Incilius alvarius). (Créditos: wrangel/iStock/Getty Images)

O ecologista da Universidade de Adelaide, Oliver Stringham, e seus colegas pesquisaram 2 milhões de anúncios na dark web entre 2014 e 2020 e descobriram o comércio de 153 tipos diferentes de espécies; cerca de 70 têm propriedades conhecidas como drogas.

A espécie mais comercializada era a jurema-preta (Mimosa tenuiflora), uma árvore sul-americana que contêm o poderoso alucinógeno DMT.

Felizmente, a maioria das espécies relacionadas a drogas não está ameaçada; no entanto, os pesquisadores encontraram algumas espécies vulneráveis, como o peiote contendo substâncias psicodélicas.

Outras espécies são usadas em medicamentos tradicionais, roupas e acessórios – como bolsas de pele de réptil – e um número menor é comercializado como animal de estimação.

As descobertas demonstram que o comércio de animais selvagens na internet publicamente visível (a web aberta) é tão mal regulamentado que não há razão para as pessoas usarem a dark web – que requer software especial e não possui mecanismos de busca centralizados – para conduzi-lo.

“Cada vez mais, o comércio de animais selvagens também ocorre na deep web, que consiste em mídias sociais e aplicativos de mensagens privadas”, escreveu a equipe em seu paper.

“Considerando que o comércio ilegal ocorre com frequência na web aberta, que é facilmente encontrada, o principal motivador do comércio ilegal na internet é a falta de fiscalização. Isso significa que a fiscalização precisa priorizar essas áreas da internet.”

Um peiote Lophophora williamsii. (Créditos: Hans B/Wikimedia Commons/CC BY-SA 3.0)

Os crimes ambientais são muitas vezes vistos como crimes ‘sem vítimas’, apesar de terem o potencial de ser altamente prejudiciais à saúde pública ao facilitar a propagação de novas doenças, sem falar na ameaça à existência de espécies inteiras.

Portanto, embora existam leis sobre esses crimes, a fiscalização raramente é priorizada, apesar do tráfico ilegal de animais silvestres ser um dos maiores crimes transnacionais.

O comércio dessas espécies não regulamentadas permanece amplamente não rastreado pela maioria dos países, e o status de conservação de muitas espécies permanece indeterminado”, observaram os pesquisadores. “De acordo com estimativas recentes, a diversidade do comércio não regulamentado supera o comércio regulamentado por um fator superior a 3.”

Stringham e sua equipe encontraram alguns animais tradicionalmente requisitados sendo negociados na dark web, como papagaios-cinzentos africanos vivos e peles de tigre, bem como animais mais raros, como o besouro Goliathus e o pepino-do-mar japonês.

Um tipo de besouro Goliathus. (Créditos: E. Smith/Proceedings of the Zoological Society of London/Wikimedia Commons)

A caça furtiva e a colheita insustentável de plantas e animais como esses leva ao declínio de milhares de espécies e explodiu na internet aberta nos últimos anos. Muitas das espécies comercializadas – como o extenso comércio de aranhas, escorpiões e outros aracnídeos, que excede milhões de animais individuais – permanecem sem monitoramento.

“Tanto a perda de espécies nativas devido à colheita insustentável quanto a introdução de espécies exóticas contribuem para a degradação dos sistemas naturais, o que acaba por ameaçar o bem-estar da humanidade”, escreveram Stringham e seus colegas.

Mas os pesquisadores temem que uma maior fiscalização levará o comércio à clandestinidade – provavelmente transferindo mais do comércio de animais de estimação da web aberta para a dark web. Restringir a demanda do consumidor, grande parte da qual vem de nações ricas, é tão crítico quanto uma maior fiscalização.

Programas de reprodução certificados para algumas espécies sob demanda também foram propostos para fornecer aqueles que procuram adquirir esses animais de forma a minimizar os riscos para as populações selvagens.

Com nosso planeta vivo precisando tanto que as pessoas se conectem com o mundo além da humanidade, os animais de estimação podem ajudar a encorajar esse vínculo, o que beneficia muito nossa saúde – mesmo os rastejantes. Mas nosso desejo de admirar e valorizar a vida magnífica, estranha e adorável da Terra não deve ameaçar seu direito de existir.

“Se o comércio futuro da vida selvagem aumentar na dark web, fornecemos uma linha de base para comparar a composição e a frequência do comércio”, concluíram Stringham e sua equipe.

Esta pesquisa foi publicada na revista People and Nature.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.