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Agora ficou fácil! Aprenda a ler uma árvore filogenética

Por David Baum
Publicado na Nature

Uma árvore filogenética é um diagrama que retrata as linhas de descendência das diferentes espécies, indivíduos, ou até mesmo genes a partir de um mesmo ancestral.

E já que a árvore filogenética mostra a descendência a partir de um ancestral comum, e já que grande parte das evidências mais fortes para a evolução foca em ancestrais comuns, vale muito a pena entender o que é filogenia, a fim de apreciar plenamente a esmagadora teoria da evolução.

Árvores filogenéticas têm sido usadas em biologia evolutiva desde a época de Charles Darwin, por isso supomos que até hoje a maioria dos cientistas se sente confortável com o “Pensamento em Árvore” (TREE THINKING) durante a leitura e interpretação de filogenias.

A grande desvantagem de se usar a árvore filogenética, é o fato dela ser um tanto contraintuitiva em alguns pontos e por isso ser facilmente mal interpretada.

Essa é a razão do por que os biólogos procuram desenvolver uma compreensão rigorosa das árvores filogenéticas.

Apenas seu pleno entendimento pode permitir que os pesquisadores usem a filogenia para visualizar a evolução, organizar o conhecimento sobre biodiversidade, e assim orientar a pesquisa evolucionária.

Mas o que exatamente é uma filogenia? Além disso, como se deve ler e interpretar os diagramas?

As seções seguintes apresentam uma breve introdução ao “Pensamento em Árvore” (TREE THINKING)

O que uma árvore evolucionária representa

butterflies3_FULLA Figura 1B mostra as borboletas de uma determinada espécie, numa mesma fazenda. Imagine por enquanto apenas quatro indivíduos da geração de pais e quatro indivíduos da geração dos filhos.

A Figura 1C mostra agora as borboletas dessa mesma espécie ao longo de várias gerações. Note que cada indivíduo tem dois pais, mas cada pai tem um número variável de filhos.

Na figura 1D Enxergue apenas apenas as linhas de descendência que são a cola que mantém a população em conjunto.

Diminua o zoom conforme Figura 1E de modo a enxergar as áreas adjacentes como se fossem várias fazendas contíguas numa mesma região, Esse grande emaranhado, mesmo parecendo difuso foi construído a partir de uma árvore filogenética trivial, mas agora inclui muitos mais indivíduos e muitas gerações. Quando tentarmos representar uma população típica de vários milhares de indivíduos que persiste por centenas ou milhares de gerações, tudo o que vemos é algo parecendo trança onde não se enxerga os fios.

Populações individuais podem ser bastante isoladas por algum período de tempo, mas na escala de tempo evolutiva, a migração ocorrerá entre diferentes populações de uma mesma espécie. Este fluxo de genes entre populações tem o efeito de “trança” que é uma única linhagem para a espécie. Veja Figura 1F

Especiação

 Por outro lado, durante o curso do tempo, linhagens são frequentemente divididas. Isto ocorre quando grupos de indivíduos ficam reprodutivamente e geneticamente isolados uns dos outros. Um exemplo seria um grupo de indivíduos ser levado por um tornado para uma ilha isolada. Mas o mais comum de acontecer, é a linhagem ser dividida por conta de alguns indivíduos que migram. Isso pode ser chamado de efeito fundador.

Outra situação é quando áreas anteriormente contíguas se tornam isoladas por conta de eventos geológicos como, por exemplo, a criação de montanhas, rios ou trechos de terreno inóspito. Este fenômeno é chamado Vicariância. Não importa se as populações foram divididas devido ao Evento fundador ou à Vicariância. Se as populações isoladas permanecerem separadas, elas vão começar a evoluir por caminhos diferentes um do outro (Figura 1F). Afinal de contas, uma mutação que ocorrer em uma população isolada não terá como chegar até a outra população. Assim, mesmo uma mutação que seria favorecida seletivamente em ambas as populações ficará fixa em apenas um dos grupos.

Se os grupos permanecerem separados por tempo suficiente, diferenças fisiológicas e comportamentais irão surgir e os levar ao isolamento reprodutivo. Assim, mesmo que eventualmente no futuro os grupos voltem a ter contato eles não mais irão se intercruzar. Essa é uma simplificação bem útil para explicar que uma vez que duas linhagens se divergem, elas permanecem distintas.

Baum1_F2_FULLA figura 2A mostra o efeito de trança quando tiramos o zoom de única grande linhagem. A Figura 2B mostra que se seguirmos a linhagem de um único ancestral tempo, durante tempo o suficiente, podemos vê-lo dar origem a quatro espécies diferentes. A Figura 2C mostra a árvore básica que poderíamos desenhar para representar a história de quatro espécies ABCD. Esta árvore mostra que as espécies A e B compartilham um ancestral comum mais recente uns com o outro do que com a espécies C ou a espécies D. Da mesma forma, as espécies C e D compartilham um ancestral comum mais recente um com o outro do que coma espécie A ou com a espécie B

Na maioria dos casos, os investigadores desenham árvores filogenéticas de modo a mostrar apenas os eventos relevantes para seu estudo. O mais comum em árvores filogenéticas é trabalhar no nível de Espécies.

Árvores filogenéticas são fractais no sentido de que o mesmo padrão é encontrado se considerarmos linhagens que divergiram recentemente ou se considerarmos linhagens que divergiram há muito tempo.

Na verdade, o postulado mais básico da teoria da evolução é que o mesmo fenômeno geral de descendência e ancestralidade comum aplica-se aos mais diversos ramos da árvore da vida. Como resultado, a estrutura da árvore é extremamente útil no acompanhamento da diversidade biológica em todos os níveis.

O vocabulário Filogenético – A linguagem do TREE THINKING

A maioria das árvores filogenéticas é enraizada, o que significa que o tronco, corresponde ao ancestral comum de todas as espécies incluídas na árvore.

No entanto, é importante notar que uma árvore pode ser desenhada em qualquer posição, inclusive de lado ou de ponta cabeça. A orientação não importa desde que você identifique o tronco, que representa o ancestral comum.

Os rótulos nas pontas dos ramos de uma filogenia podem corresponder a espécies, organismos, ou genes individuais desde que cada ponta torne-se um ramo separado sobre a árvore da vida.

E importante rotular as pontas (ou folhas) com o nível de abrangência do seu estudo, como por exemplo: Genes, indivíduos, espécies, ou grupo de espécies.

Em oposição às pontas, os pontos de ramificação dentro de uma árvore, são chamados de nós. Cada nó representa o último ancestral comum das duas linhagens descendentes desse nó. O nó corresponde a um evento de especiação.

O ramo que conecta dois nós é chamado de Ramo interno, enquanto o ramo que conecta uma ponta a um nó é chamado de Ramo externo.

Um Clado é um pedaço de uma árvore, que inclui uma linhagem ancestral e todos os descendentes desse ancestral. Este grupo de organismos pode ser referido como um grupo monofilético.

fig4Figura 3: Um grupo monofilético é fácil de ser identificado visualmente: é simplesmente uma parte da árvore que possa ser seccionada com um único corte. Se uma árvore precisa ser cortada em dois lugares para extrair um determinado conjunto, então esse conjunto é não-monofilético.

Os clados são pedaços naturais das árvores filogenéticas, pois existe uma porção da história que é comum a todos os membros do clado. Como resultado, as declarações de ancestralidade comum que se aplicam a um clado sempre se aplicam a todas as pontas dentro do clado.

Se você disser que um mamífero compartilha um ancestral comum mais recente com lagartos do que com os tubarões, então pode deduzir que todas as espécies de mamíferos compartilham um ancestral comum mais recente com lagartos do que com tubarões. “Mamíferos” é um grupo monofilético certamente.

Já outros grupos usualmente mostrados pelo conceito tradicional não são verdadeiros. “Répteis” por exemplo incluíam lagartos, cobras, crocodilos e tartarugas, mas não aves. Portanto “Répteis” não se refere a um grupo monofilético. Além disso, os pesquisadores sabem agora que os crocodilos compartilham um ancestral comum mais recente com aves do que com lagartos, cobras, ou tartarugas.

Assim, conceitos atuais de “Répteis” geralmente incluem aves como membros deste grupo verdadeiro, e é por isso que os sistemas modernos de classificação se esforçam para dar nomes formais apenas para grupos monofiléticos.

A importância das árvores filogenéticas

Com o incremento da árvore da vida através das ciências biológicas, o tema se tornou essencial para que estudantes de biologia aprendam o que uma árvore pode e o que ela não pode informar.

Além disso, desenvolver habilidades do “pensamento em árvore” também tem outros benefícios. (TREE THINKING)

Mais importante ainda: Árvores da vida fornecem uma estrutura eficiente para organizar o conhecimento da biodiversidade e permitem desenvolver uma concepção progressiva precisa da totalidade da história evolutiva. Por isso, é importante para todos os biólogos que aspiram a desenvolver as habilidades e conhecimentos necessários para compreender árvores filogenéticas e o lugar da Árvore na moderna teoria da evolução.

Como ler a árvore filogenética

Salvo indicação em contrário, uma árvore filogenética retrata a história de ramificação da ancestralidade comum.

O padrão de ramificação é o que importa numa árvore. Já o comprimento dos ramos é irrelevante – eles são simplesmente desenhados em função da estética e melhor ajuste à imagem.

fig5As três árvores mostradas na Figura 4, contêm a mesma informação. Os diagramas de árvores podem representar a mesma informação mesmo sendo orientado de diferentes maneiras.

fig6As três árvores na Figura 5 têm a mesma topologia e, assim sendo, possuem as mesmas implicações evolutivas.Em cada caso, o primeiro evento de divergência se separou da linhagem que deu origem à ponta A partir da linhagem que deu origem às pontas B, C e D.

Esta última linhagem, dividida agora em outras duas linhagens, uma das quais se desenvolveu na ponta B, e o outro deu origem às pontas C e D.

Isto significa que C e D compartilham um ancestral comum mais recente um com o outro do que qualquer um desses dois compartilha com A e B. A pontas C e D são, portanto, mais estreitamente relacionados entre si do que qualquer um deles é com as pontas A ou B.

O diagrama também mostra que as pontas B, C e D compartilham um ancestral comum mais recente um com o outro do que qualquer um deles com ponta A. Porque a ponta B está a uma distância igual (em termos de arranjo de nós e ramos) de C e de D; e pode-se dizer que B está igualmente relacionada com C e D.

pode parecer confusoFigura 6: Pode parecer confuso que árvores com diferentes aparências possam conter a mesma informação. Mas é igualmente válido desenhar o ramo levando à ponta como estando no lado direito ou no lado esquerdo do desdobramento. Também não importa se as ramificações são desenhadas como linhas diagonais, ou se são dobradas para fazer uma árvore retangular, ou são curvadas para fazer uma árvore circular. Pense em linhagens como tubos flexíveis em vez de hastes rígidas; Imagine nós como juntas que podem girar livremente sem solda fixas. Assim, torna-se mais fácil de ver que as três árvores nesta figura são equivalentes. A regra básica é que, se você pode mudar uma árvore para outra árvore simplesmente girando ou dobrando ramos sem ter que cortar e recolocar ramos, significa que as duas árvores têm a mesma topologia e, portanto, representam a mesma história evolutiva.

Exceção: quando o comprimento dos ramos é significativo

Finalmente, é importante notar que, em alguns casos, as árvores filogenéticas retangulares são desenhadas de modo que os comprimentos dos ramos são sim significativos.

Estas árvores são muitas vezes chamadas Filogramas, e eles geralmente retratam tanto a quantidade de evolução que ocorre em uma sequência genética particular como a duração de tempo estimada dos ramos. Neste contexto, tais árvores tornam evidente que os comprimentos dos ramos tem um significado. Mas quando não for o caso, é importante evitar a leitura de qualquer informação temporal que não seja mostrada. NA DÚVIDA, NÃO CONSIDERE O COMPRIMENTO DO RAMO.

Referências

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  • Tree Thinking Group. Tree Thinking Group homepage, (2004)
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