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Anéis de árvores narra uma misteriosa tempestade cósmica que nos atinge a cada mil anos

Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert

A história do bombardeio da Terra com radiação cósmica está escrita nas árvores.

Especificamente, quando a radiação atinge a atmosfera da Terra, ela pode alterar quaisquer átomos de nitrogênio em que colide para produzir uma forma de carbono, que por sua vez é absorvida pelas plantas. Ligar os picos neste isótopo de carbono com os anéis de crescimento nas árvores pode nos dar um registro confiável de tempestades de radiação que remontam a milhares de anos.

Este registro nos mostra que o mais colossal desses eventos, conhecidos como eventos Miyake (em homenagem ao cientista que os descobriu), ocorrem cerca de uma vez a cada mil anos. No entanto, não sabemos o que os causa – e novas pesquisas sugerem que nossa teoria principal, envolvendo gigantes erupções solares, pode estar fora de questão.

Sem uma maneira fácil de prever esses eventos potencialmente devastadores, ficamos com um problema sério.

“Precisamos saber mais, porque se um deles acontecesse hoje, destruiria a tecnologia, incluindo satélites, cabos de internet, linhas de energia de longa distância e transformadores”, disse o astrofísico Benjamin Pope, da Universidade de Queensland, na Austrália.

“O efeito na infraestrutura global seria inimaginável.”

A história dos encontros da Terra com tempestades de radiação cósmica está aí para decifrar se você souber olhar. A principal pista é um isótopo radioativo de carbono chamado carbono-14, muitas vezes referido como radiocarbono. Comparado a outros isótopos naturais de carbono na Terra, o radiocarbono é relativamente escasso. Ele se forma apenas na atmosfera superior, quando os raios cósmicos colidem com os átomos de nitrogênio, desencadeando uma reação nuclear que cria o radiocarbono.

Como os raios cósmicos estão constantemente colidindo com nossa atmosfera, temos um suprimento constante, mas muito pequeno, do material que chove na superfície. Alguns deles ficam presos em anéis de árvores. Como as árvores adicionam um novo anel de crescimento a cada ano, a deposição de radiocarbono pode ser rastreada ao longo do tempo, fornecendo um registro da atividade de radiação ao longo de dezenas de milênios.

Um grande pico de radiocarbono encontrado em árvores ao redor do mundo significa um aumento na radiação cósmica. Existem vários mecanismos que podem causar isso, e as erupções solares são um dos principais. Mas existem algumas outras possíveis fontes de tempestades de radiação que não foram conclusivamente descartadas. Nem as erupções solares foram confirmadas nesse caso.

Como a interpretação dos dados dos anéis das árvores exige uma compreensão abrangente do ciclo global do carbono, uma equipe de pesquisadores liderada pelo matemático Qingyuan Zhang, da Universidade de Queensland, começou a reconstruir o ciclo global do carbono, com base em cada fragmento de dados de radiocarbono de anéis de árvores que eles conseguiram obter.

“Quando a radiação atinge a atmosfera, produz carbono-14 radioativo, que filtra o ar, oceanos, plantas e animais, e produz um registro anual de radiação em anéis de árvores”, explicou Zhang.

“Modelamos o ciclo global do carbono para reconstruir o processo ao longo de um período de 10.000 anos, para obter informações sobre a escala e a natureza dos eventos Miyake”.

Os resultados dessa modelagem deram à equipe uma imagem extremamente detalhada de vários eventos de radiação – o suficiente para concluir que o tempo e o perfil são inconsistentes com as erupções solares. Os picos de radiocarbono não se correlacionam com a atividade das manchas solares, que está ligada à atividade das erupções. Alguns picos persistiram ao longo de vários anos.

E houve inconsistência nos perfis de radiocarbono entre regiões para o mesmo evento. Para um grande evento, registrado em 774 d.C., algumas árvores em algumas partes do mundo mostraram aumentos bruscos e repentinos no radiocarbono por um ano, enquanto outras mostraram um pico mais lento ao longo de dois a três anos.

“Em vez de uma única explosão ou erupção instantânea, o que podemos estar vendo é uma espécie de ‘tempestade’ ou explosão astrofísica”, disse Zhang.

Os pesquisadores não sabem, neste momento, o que pode estar causando essas explosões, mas há vários candidatos. Um deles são os eventos de supernova, cuja radiação pode explodir no espaço. Uma supernova possivelmente ocorreu em 774 d.C., e os cientistas fizeram ligações entre picos de radiocarbono e outros possíveis eventos de supernova, mas conhecemos supernovas sem picos de radiocarbono e picos sem ligações com supernovas.

Outras causas potenciais incluem supererupções solares, mas é improvável que uma erupção poderosa o suficiente para produzir o pico de radiocarbono de 774 d.C. tenha surgido do nosso Sol. Talvez haja alguma atividade solar não registrada anteriormente. Mas o fato é que não há uma explicação simples que explique claramente o que causa os eventos Miyake.

E isso, segundo os pesquisadores, é uma preocupação. O mundo humano mudou drasticamente desde 774 d.C.; um evento Miyake agora pode causar o que os cientistas chamam de “apocalipse da internet” à medida que a infraestrutura é danificada, prejudica a saúde dos viajantes aéreos e até esgota a camada de ozônio.

“Com base nos dados disponíveis, há cerca de um por cento de chance de ver outro na próxima década”, disse Pope.

“Mas não sabemos como prever ou que danos pode causar. Essas probabilidades são bastante alarmantes e estabelecem as bases para mais pesquisas”.

A pesquisa foi publicada em Proceedings of the Royal Society A: Mathematical, Physical, and Engineering Sciences.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.