Por Peter Dockrill
Publicado na ScienceAlert
Pessoas com visões extremistas não são identificadas apenas por suas crenças políticas, religiosas ou sociais, de acordo com novas pesquisas.
Essas convicções ideológicas são profundas, dizem os cientistas – tão profundas, na verdade, que podem ser reconhecidas em uma “assinatura psicológica” de traços cognitivos e aptidões que tipificam os padrões de pensamento da mente extremista.
“Parece haver semelhanças ocultas nas mentes dos mais dispostos a tomar medidas extremas para apoiar suas doutrinas ideológicas”, explica o psicólogo Leor Zmigrod, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido.
“Esta assinatura psicológica é algo novo e deve inspirar pesquisas futuras sobre o efeito do dogmatismo nos processos perceptivos de tomada de decisão”, escreveram ele e seus colegas em seu estudo recém-publicado.
Além disso, é possível que esses padrões psicológicos possam obrigar alguns indivíduos a adotar posições ideológicas rígidas ou radicais em primeira instância, sugerem os pesquisadores.
“Dificuldades sutis com processamento mental complexo podem inconscientemente empurrar as pessoas para doutrinas extremas que fornecem explicações mais claras e mais definidas do mundo, tornando-as suscetíveis a formas tóxicas de ideologias dogmáticas e autoritárias”, disse Zmigrod.
No novo estudo, Zmigrod e outros pesquisadores realizaram um experimento com 334 participantes, que forneceram informações demográficas e preencheram uma série de questionários ideológicos sobre suas crenças pessoais, incluindo crenças políticas, sociais e religiosas.
Em um estudo anterior não relacionado envolvendo o mesmo grupo de pessoas, os participantes realizaram um amplo conjunto de testes de ‘jogos mentais’ – tarefas cognitivas e comportamentais em um computador, projetados para testar coisas como sua memória de trabalho, processamento de informações, aprendizagem e atenção plena, entre outros.
Quando Zmigrod comparou os resultados dos questionários ideológicos com os testes cognitivos, ele fez uma descoberta surpreendente.
“Descobrimos que indivíduos com atitudes extremistas tendem a ter um desempenho ruim em tarefas mentais complexas”, ele explica em The Conversation.
“Eles tiveram muitas dificuldades para concluir testes psicológicos que requerem etapas mentais complexas”.
Especificamente, aqueles com atitudes extremistas – como endossar a violência contra grupos específicos da sociedade – mostraram memória de trabalho mais pobre, estratégias perceptivas mais lentas e tendências impulsivas de busca de sentimentos.
No entanto, os testes não destacaram apenas os traços do pensamento extremista – outros tipos de crenças ideológicas também revelaram a forma de suas assinaturas psicológicas.
Os participantes que demostraram pensamento dogmático demoraram mais para acumular evidências em tarefas de tomada de decisão aceleradas, descobriram os pesquisadores, mas também eram mais impulsivos e propensos a correr riscos éticos.
Indivíduos politicamente conservadores mostraram redução no processamento de informações estratégicas, maior cautela na resposta perceptiva em paradigmas de tomada de decisão e exibiram aversão a assumir riscos sociais.
Em contraste, os participantes com crenças progressistas eram mais propensos a adotar estratégias perceptivas mais rápidas e menos precisas, exibindo menos cautela em tarefas cognitivas.
Da mesma forma que o grupo conservador, as pessoas com visões religiosas refletiram maior cautela e redução do processamento de informações estratégicas no domínio cognitivo, juntamente com maior afabilidade, percepção de risco e aversão ao risco social.
“Nossa pesquisa mostra que nossos cérebros contêm pistas – metáforas sutis, talvez – para as ideologias que escolhemos seguir e as crenças nas quais nos apegamos rigidamente”, explica Zmigrod.
“Se nossa mente tende a reagir aos estímulos com cautela, ela também pode ser atraída por ideologias cautelosas e conservadoras. Se tivermos muita dificuldade para processar e planejar sequências de ação complexas, podemos ser atraídos para ideologias mais extremas que simplificam o mundo e nosso papel dentro disto”.
Claro, os resultados aqui estão abertos a um grau razoável de interpretação, e há limitações para o que estudos psicológicos relativamente pequenos como este podem nos dizer sem replicação adicional envolvendo amostras maiores.
No entanto, a metodologia aqui pode estabelecer a base para testes psicológicos futuros que podem ser capazes de identificar indivíduos em risco de radicalização e de adotar crenças extremistas – bem como sugerir que tipo de pensamento protege os outros de tal processo.
“[A análise] revela as maneiras pelas quais estratégias perceptivas de tomada de decisão podem se infiltrar em crenças ideológicas altamente desenvolvidas, sugerindo que uma dissecação da anatomia cognitiva das ideologias é um esforço produtivo e esclarecedor”, escrevem os autores em seu estudo.
“[O método] pode revelar tanto as vulnerabilidades cognitivas a ideologias tóxicas quanto as características que tornam os indivíduos mais humildes intelectualmente, receptivos às evidências e, em última análise, resilientes à retórica extremista”.
As conclusões são relatados na Philosophical Transactions da Royal Society B.