Por Lars Eklund
Publicado na ScienceAlert
É um dos maiores quebra-cabeças da física. Todas as partículas que constituem a matéria ao nosso redor, como elétrons e prótons, têm versões de antimatéria quase idênticas, mas com propriedades espelhadas, como a carga elétrica oposta. Quando uma antimatéria e uma partícula de matéria se encontram, elas se aniquilam em um lampejo de energia.
Se a antimatéria e a matéria são realmente idênticas, mas cópias espelhadas uma da outra, elas deveriam ter sido produzidas em quantidades iguais no Big Bang. O problema é que tudo isso teria sido aniquilado. Mas hoje, quase não há antimatéria restante no Universo – ela aparece apenas em alguns decaimentos radioativos e em uma pequena fração dos raios cósmicos.
Então o que aconteceu com ela? Usando o experimento LHCb no CERN para estudar as distinções entre matéria e antimatéria, descobrimos uma nova maneira que essa diferença pode aparecer.
A existência da antimatéria foi prevista pela equação do físico Paul Dirac que descreve o movimento dos elétrons em 1928. No início, não estava claro se isso era apenas uma peculiaridade matemática ou a descrição de uma partícula real.
Mas, em 1932, Carl Anderson descobriu um par de antimatéria para o elétron – o pósitron – enquanto estudava os raios cósmicos que aparecem no espaço ao redor da Terra. Nas décadas seguintes, os físicos descobriram que todas as partículas de matéria têm parceiros de antimatéria.
Os cientistas acreditam que no estado muito quente e denso logo após o Big Bang, deve ter havido processos que deram preferência à matéria em vez da antimatéria. Isso criou um pequeno excedente de matéria e, à medida que o Universo esfriou, toda a antimatéria foi destruída, ou aniquilada, por uma quantidade igual de matéria, deixando um pequeno excedente de matéria.
E é esse excedente que compõe tudo o que vemos no Universo hoje.
Não se sabe exatamente quais processos causaram o excedente, e os físicos estão tentando descobrir há décadas.
Assimetria conhecida
O comportamento dos quarks, que são os blocos de construção fundamentais da matéria junto com os léptons, pode esclarecer sobre as diferenças entre matéria e antimatéria. Quarks vêm em muitos tipos diferentes, ou “sabores“, conhecidos como up, down, strange, charm, bottom, top e mais seis antiquarks correspondentes.
Os quarks up e down são o que compõem os prótons e nêutrons nos núcleos da matéria comum, e os outros quarks podem ser produzidos por processos de alta energia – por exemplo, colidindo partículas em aceleradores como o Grande Colisor de Hádrons do CERN.
As partículas que consistem em um quark e um antiquark são chamadas mésons, e há quatro mésons neutros (B0S, B0, D0 e K0) que exibem um comportamento fascinante. Eles podem se transformar espontaneamente em seu par antipartícula e depois voltar ao estado original, um fenômeno que foi observado pela primeira vez na década de 1960
Como são instáveis, eles irão “decair” em outras partículas mais estáveis em algum ponto durante sua oscilação. Esse decaimento ocorre de maneira ligeiramente diferente para os mésons em comparação com os antimésons, o que, combinado com a oscilação, significa que a taxa de decaimento varia com o tempo.
As regras para as oscilações e decaimentos são fornecidas por um arcabouço teórico denominado matriz Cabibbo-Kobayashi-Maskawa (CKM). O modelo prevê que há uma diferença no comportamento da matéria e da antimatéria, mas pequena demais para gerar o excedente de matéria no Universo primitivo, necessário para explicar a abundância que vemos hoje.
Isso indica que há algo que não entendemos e que estudar esse tópico pode desafiar algumas de nossas teorias mais fundamentais na física.
Nova física?
Nosso resultado recente do experimento LHCb vem de um estudo dos mésons B0S neutros, observando seus decaimentos em pares de mésons K carregados. Os mesons B0S foram criados pela colisão de prótons com outros prótons no Grande Colisor de Hádrons, onde eles oscilaram em antimésons e voltaram ao estado original três trilhões de vezes por segundo. As colisões também criaram mésons anti-B0S que oscilaram da mesma maneira, dando-nos amostras de mésons e antimésons que podem ser comparadas.
Contamos o número de decaimentos das duas amostras e comparamos os dois números, para ver como essa diferença variava com o progresso da oscilação. Houve uma pequena diferença – com mais decaimentos ocorrendo para um dos mesons B0S. E pela primeira vez para os mésons B0S, observamos que a diferença de decaimento, ou assimetria, variava de acordo com a oscilação entre o méson B0S e o antiméson.
Além de ser um marco no estudo das diferenças matéria-antimatéria, também pudemos medir o tamanho das assimetrias. Isso pode ser traduzido em medições de vários parâmetros da teoria subjacente.
Comparar os resultados com outras medições fornece uma verificação de consistência, para ver se a teoria atualmente aceita é uma descrição correta da natureza. Visto que a pequena preferência da matéria sobre a antimatéria que observamos na escala microscópica não pode explicar a enorme abundância de matéria que observamos no Universo, é provável que nosso entendimento atual seja uma aproximação de uma teoria mais fundamental.
Investigar esse mecanismo que sabemos ter capacidade de gerar assimetrias matéria-antimatéria, sondando-o de diferentes ângulos, pode nos dizer onde está o problema. Estudar o mundo na menor escala é nossa melhor chance de sermos capazes de entender o que vemos na maior escala.