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Cientistas poderiam colocar astronautas em Marte em ‘animação suspensa’ usando ondas sonoras, sugere estudo com camundongos

Traduzido por Julio Batista
Original de Ben Turner para a Live Science

Cientistas expuseram os cérebros de camundongos e ratos com ultrassom para colocá-los em um estado de animação suspensa, e os pesquisadores disseram que a técnica pode um dia ser usada em humanos em cuidados intensivos ou em astronautas em voos espaciais de longa distância.

O método inédito – que funciona disparando ultrassom em uma região do cérebro responsável por controlar o metabolismo e a temperatura corporal – reduziu a temperatura corporal média dos roedores em até 3,5 graus Celsius, ao mesmo tempo em que diminuiu os batimentos cardíacos e reduziu o consumo de oxigênio.

Os resultados do estudo com animais podem fornecer aos pesquisadores algumas pistas de como os estados semelhantes ao de hibernação, ou torpor, podem ser induzidos de forma segura e não invasiva em humanos. Os pesquisadores publicaram suas descobertas na quinta-feira (25 de maio) na revista Nature Metabolism.

“Se demonstrada com sucesso em humanos, esta tecnologia possui um potencial significativo para aplicações médicas, particularmente em condições de risco de vida, como derrame e ataques cardíacos”, disse o principal autor do estudo, Hong Chen, professor associado de engenharia biomédica na Universidade de Washington em St. Louis à Live Science. “Induzir um estado de torpor nesses pacientes pode estender a janela de tratamento e aumentar suas chances de sobrevivência”, disse ela.

Quando a comida é escassa ou o clima muito frio, alguns mamíferos, pássaros, insetos, anfíbios e peixes preservam sua energia entrando involuntariamente em um estado conhecido como torpor, uma condição misteriosa e temporária marcada por um metabolismo drasticamente reduzido.

Enquanto está em estado de torpor, a temperatura corporal e a frequência cardíaca de um animal caem drasticamente e seu sangue flui mais lentamente. Durante a hibernação (um ato voluntário preparado com antecedência), os animais encadeiam vários episódios de estados de torpor. Eles diminuem seus batimentos cardíacos de centenas de batimentos por minuto para um mero punhado; respiram uma vez a cada dez minutos ou mais; e diminuem sua atividade cerebral até que seja indetectável.

Na verdade, tão poucas funções inconscientes são executadas durante os períodos de torpor que muitos animais em hibernação precisam acordar periodicamente para tirar um soninho adequado.

As profundas mudanças fisiológicas do torpor reduzem drasticamente a energia que os animais precisam para sobreviver. Talvez não seja surpreendente, então, que os cientistas há muito tempo estejam ansiosos para descobrir se esses benefícios podem ser conferidos a humanos em estados gravemente feridos ou a pessoas em voos longos e solitários para planetas distantes.

Na verdade, os registros da potencial utilidade médica da hipotermia, uma queda normalmente perigosa na temperatura corporal, datam do antigo Egito. Também foi observado pelo cirurgião-chefe de Napoleão, Barão de Larrey, durante a fracassada invasão francesa da Rússia em 1812. Lerrey embalou membros de soldados com gelo antes de amputá-los e notou que os homens feridos morriam mais rápido pelo calor do fogo do que perto do frio. Nos tempos modernos, os cirurgiões usam estados hipotérmicos para aumentar as taxas de sobrevivência dos pacientes durante cirurgias cardíacas e cerebrais.

Mas se os humanos, que não entram naturalmente em estados de torpor, podem ser artificialmente e com segurança levados para eles, permanece uma questão em aberto.

Para investigar essa possibilidade, os cientistas por trás do novo estudo criaram uma touca de ultrassom que eles inicialmente colaram na cabeça de camundongos. Depois de ligado, o dispositivo transmitiu ondas de ultrassom para uma parte do cérebro dos roedores chamada área pré-óptica do hipotálamo, uma região cerebral crítica para controlar a temperatura corporal e o sono em muitos animais e a ativação dos estados de hibernação e torpor em animais em animação suspensa.

Depois de serem expostos às rajadas de ultrassom, os camundongos entraram imediatamente em um estado de torpor, no qual a temperatura corporal, os batimentos cardíacos e o consumo de oxigênio diminuíram drasticamente. Os camundongos ficaram lentos e comeram significativamente menos comida.

Ao repetir as rajadas de ultrassom toda vez que a temperatura corporal dos camundongos aumentava acima de um nível-alvo, os cientistas conseguiram manter os camundongos nesses estados de torpor por até 24 horas sem observar nenhum sinal de lesão ou desconforto. Quando a touca de ultrassom foi desligado, a temperatura normal do corpo dos camundongos e os níveis de atividade se recuperaram em menos de 90 minutos.

Imagens térmicas infravermelhas de um camundongo sendo colocado em estado de torpor com ultrassom. Tradução da imagem: antes da ultrassom (before US), 3 minutos depois da US (3-min after US onset), 13 minutos (13 min) e 70 minutos (70 min). (Créditos: Chen et al)

Depois de repetir seu experimento com 12 camundongos, os cientistas viram que o dispositivo também fazia com que a temperatura corporal dos camundongos diminuísse, embora por uma queda mais leve de até 2 °C. Isso significa, escreveram os autores do estudo, que a touca ainda pode funcionar em mamíferos que não entram naturalmente em torpor – incluindo humanos.

“Ainda são necessárias mais pesquisas para determinar a segurança e a viabilidade dessa abordagem em humanos”, disse Chen. “Podemos imaginar astronautas usando um dispositivo semelhante a um capacete projetado para atingir a região do hipotálamo para induzir um estado de torpor”.

No entanto, muitos obstáculos permanecem antes que os dispositivos de ultrassom indutores de torpor possam ser usados ​​para ganhar tempo aos médicos durante as cirurgias ou para colocar os astronautas em uma espécie de animação suspensa.

Os pesquisadores descobriram que sua touca de ultrassom parece provocar um estado de torpor, estimulando um canal iônico específico – uma passagem para partículas carregadas – dentro das células cerebrais de roedores, mas o torpor natural observado na natureza também é acompanhado por outras alterações no nível hormonal e molecular que não são bem compreendidas. Os efeitos da hibernação de longo prazo no cérebro também não são claros, mas alguns estudos levantam a possibilidade de causar perda de memória em animais em hibernação.

“É notável o quão pouco sabemos sobre os efeitos da hibernação e do torpor, especialmente prolongada, na função cerebral, conexões sinápticas ou memórias”, disse Vladyslav Vyazovskiy, professor de fisiologia do sono na Universidade de Oxford, que não esteve envolvido no novo estudo, à Live Science.

“Portanto, antes de tentarmos induzir a hibernação em humanos, primeiro devemos nos certificar de que sabemos como devolvê-los ‘de volta a atividade’ intactos”, disse Vyazovskiy. “Até que tenhamos uma compreensão completa das causas e consequências da hibernação e torpor natural, a possibilidade de torpor em humanos irá, e deve, permanecer no domínio da ficção científica.”

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.