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Esses peixes podem ter ‘domesticado’ camarões para ajudá-los a cultivar algas

Por Jacinta Bowler
Publicado na ScienceAlert

Seja em relação aos nossos melhores amigos caninos ou aos nossos companheiros felinos, os humanos são indiscutivelmente os melhores no campo da domesticação.

A lista de espécies que domesticamos varia de cães, ovelhas e galinhas a criaturas mais elusivas, como abelhas e papagaios, plantas como trigo e milho e até nós mesmos. Agora, os pesquisadores descobriram peixes que parecem estar usando camarões da mesma forma que usaríamos um animal de fazenda.

A equipe acredita que pode ser o primeiro exemplo de uma espécie de vertebrado – diferente do humano – domesticando outro animal.

O peixe agricultor em questão é chamado de Stegastes diencaeus, e ele passa seus dias entre os recifes de coral da costa de Belize, na América Central, cuidando e se alimentando de suas próprias fazendas de algas.

Eles também se orgulham de sua produção e afugentam qualquer criatura que se aproxime demais – exceto enxames de minúsculos zooplânctons chamados de camarões misídeos (Mysidium integrum), que aparentemente estão ‘fertilizando’ as algas.

“Os Stegastes defendem agressivamente uma parte do recife onde cultivam algas para se alimentar, contra todos os camarões, exceto os misídeos”, explica o ecologista Rohan Brooker da Universidade de Deakin (Austrália).

“Enxames de camarões misídeos, que se beneficiam do refúgio protetor fornecido pelo Stegastes, fertilizam as fazendas de algas com seus dejetos, melhorando a qualidade das algas cultivadas e, por sua vez, a condição do agricultor, o Stegastes.”

A ideia é que o Stegastes e o camarão misterioso começaram em uma relação comensal em que uma criatura se beneficia da outra sem prejudicá-la, antes que a relação se tornasse mais especializada, quando os camarões ‘domesticados’ não puderam mais viver sem seus amigos fazendeiros.

A equipe usa o exemplo de como os lobos foram domesticados e se transformaram em cães ao se aproximarem de acampamentos humanos em busca de restos antes de eventualmente se tornarem nossos companheiros e lentamente os cães que conhecemos hoje.

A linha do que exatamente define a domesticação não é bem definida. Alguns pesquisadores argumentam que a domesticação requer mudanças genéticas entre criaturas selvagens e domesticadas que são normalmente selecionadas pelo domesticador, bem como uma influência multigeracional sustentada sobre a reprodução e o cuidado das espécies domesticadas.

Mas, neste caso, os pesquisadores têm algumas razões sólidas para sua reivindicação de domesticação entre o Stegastes e o camarão misídeo.

“A presença de Stegastes não-associados aos misídeos sugere que esses peixes criam fazendas para fins não relacionados à domesticação dos misídeos,” a equipe, liderada por Brooker, escreve em seu novo paper.

“No entanto, a falta de misídeos associados a recifes fora das fazendas em nosso local de estudo sugere que esses misídeos têm uma dependência obrigatória do nicho criado pelo Stegastes (isto é, fazendas) para a sobrevivência neste ambiente cheio de predadores. Esses resultados são consistentes com os hipotéticos processos comportamentais que sustentam a domesticação por meio da via comensal.”

Isso significa que o Stegastes não precisa do camarão misídeo, mas o camarão misídeo precisa de alguma forma do Stegastes para protegê-lo da predação.

Esta não é realmente a primeira vez que vimos práticas de domesticação em animais além dos humanos – insetos como formigas, besouros e cupins são muito bons em cultivar suas próprias espécies de fungos domesticados e, no caso das formigas-cortadeiras, também cultivam pequenos insetos chamados pulgões que as formigas adoram comer.

Mas a possibilidade de estarmos vendo os estágios iniciais de um processo de domesticação não muito diferente daquele que foi responsável por nossa própria domesticação de criaturas como cães ou galinhas é muito emocionante.

“Geralmente são restos de comida ou abrigos que parecem ter atraído os animais para os humanos”, diz o ecologista William Feeney da Universidade Griffith (Austrália).

“Mas, este estudo destaca o papel importante que a proteção contra predadores também desempenha na domesticação, com camarões misídeos sendo rapidamente consumidos por outros predadores quando os Stegastes não estavam presentes.

“Ele revela as fascinantes percepções sobre a domesticação por humanos que podem ser obtidas examinando as relações entre organismos não humanos.”

A pesquisa foi publicada na Nature Communications.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.