Por Michelle Starr
Publicado na ScienceAlert
Um conjunto de ossos de peru cortados e afiados, escavados há décadas em uma antiga sepultura de nativos americanos, parecem ser as ferramentas de tatuagem mais antigas que encontramos até hoje.
Uma nova e detalhada análise desses artefatos permitiu aos arqueólogos determinar que eles provavelmente foram usados para tatuar a pele, nos aproximando um pouco mais de compreender a história da modificação corporal, sugerindo que era uma prática persistente entre os nativos americanos por pelo menos 3.000 anos.
A tatuagem, embora considerada subcultural em algumas sociedades, é na verdade tão tradicional quanto você pode imaginar. Temos evidências de que humanos ao redor do mundo vêm decorando sua pele perfurando-a com instrumentos afiados e carregados com tinta há milhares de anos.
A pele humana não sobrevive facilmente à devastação do tempo, mas várias múmias tatuadas datadas de mais de 5.000 anos atrás foram descobertas, sugerindo que era bastante comum. No entanto, as ferramentas que nossos ancestrais usaram para essa arte foram mais difíceis de encontrar.
Isso pode ser parcialmente porque as ferramentas afiadas encontradas por arqueólogos tendem a ser arquivadas na categoria bastante ampla de “furador”.
Então, uma equipe de arqueólogos liderada por Aaron Deter-Wolf do Departamento de Meio Ambiente e Conservação do Tennessee decidiu dar uma olhada em ferramentas de ossos afiados recuperadas em 1985 de Fernvale, um sítio arqueológico nativo americano.
“Neste estudo, vamos além da classificação morfológica básica, combinando análise zooarqueológica, avaliação tecnológica, análise de desgaste de uso e estudos de ciência dos materiais para examinar um conjunto de ferramentas ósseas de um antigo sítio nativo estadunidense no centro do Tennessee”, escreveram eles em seu estudo.
“Nossa análise revela que entre aproximadamente 3500-1600 a.C., os ocupantes do sítio arqueológico Fernvale empregaram ferramentas de ossos afiados de perus (Meleagris gallopavo) como instrumentos de tatuagem, e que tanto os restos de pigmentos vermelhos quanto os pretos estão diretamente associados a esses artefatos”.
O conjunto consistia em vários instrumentos – quatro ossos afiados do tarso-metatarso de perus, dois dos quais com pontas intactas, e dois ossos radiais menores, com vestígios de pigmento ainda discerníveis em grãos.
Esses ossos foram submetidos a uma análise minuciosa – microscopia com ampliação de até 140X, permitindo aos pesquisadores catalogar pequenas marcas da fabricação e padrões de desgaste; e espectroscopia de fluorescência de raios-X para ajudar a identificar os pigmentos.
Então, os resultados foram comparados aos de um estudo anterior, no qual um arqueólogo diferente esculpiu ossos afiados de um veado-galheiro e os usou para tatuar pele de um porco, para determinar os padrões de manufatura e uso que isso produziria.
A espectroscopia revelou que os pigmentos vermelhos e pretos nos ossos do rádio eram provavelmente derivados de óxido de ferro (ocre) e materiais de carbono – ambos registrados como materiais tradicionais de tatuagem na literatura arqueológica.
As marcas também eram consistentes com as marcas de desgaste nos ossos de veado e os depósitos de pigmento refletiam as manchas de pigmento de osso de veado. Conchas bivalves também foram encontradas no cemitério, também com pigmentos; estes, disseram os pesquisadores, poderiam ter sido usados como vasos de pigmento durante o processo de tatuagem.
A conclusão da equipe de que esses ossos representam as primeiras ferramentas de tatuagem conhecidas é muito convincente e significaria que a prática da tatuagem na América do Norte poderia ser ainda mais antiga do que pensávamos. Anteriormente, a primeira ferramenta conhecida era um instrumento feito de espinhos de cacto encontrado no estado estadunidense de Utah, datado de cerca de 2.000 anos atrás.
Suas descobertas, observa a equipe, enfatizam os problemas associados à atribuição de ferramentas ósseas a categorias amplas e como uma abordagem mais rigorosa poderia revelar diferentes tipos de ferramentas que podem estar escondidos à vista de todos.
“Combinado com análises futuras de desgaste de uso, avaliações elementares e análise contextual de outras coleções de artefatos”, escreveram eles, “as evidências do sítio arqueológico Fernvale fornecem um conjunto de dados significativo para análises de organização social e complexidade ritual entre sociedades coletoras do período arcaico no sudeste dos Estados Unidos”.
A pesquisa foi publicada no Journal of Archaeological Science: Reports.