Por Mike McRae
Publicado na ScienceAlert
Em um Universo espelho onde o tempo corre para trás, trocar matéria por antimatéria deveria simplesmente nos trazer a um círculo completo e reproduzir a realidade com a qual todos estamos familiarizados. Nosso Universo e o Universo espelho da bizarra antimatéria seriam idênticos.
Mas e se isso não acontecesse? Por mais improvável que isso seja na física de hoje, a possibilidade pode abrir um novo cenário para os pesquisadores explorarem, tornando-se uma questão que vale a pena pesquisar.
Infelizmente, a antimatéria não é a coisa mais fácil de estudar. É um pé no saco de produzir, propensa a desaparecer em uma nuvem de raios gama quando encontra matéria comum, e mesmo quando você coleta o suficiente para examinar, ela está zunindo em velocidades vertiginosas.
Para alguns estudos, isso não é necessariamente um grande problema. Mas se você quiser, digamos, medir a atração suave da gravidade sobre suas partículas minúsculas, elas realmente devem estar paradas de forma mais imóvel possível.
O experimento ALPHA da Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (CERN) vem trabalhando em uma maneira de frear as partículas de antimatéria há alguns anos por meio de uma aplicação inteligente de lasers cuidadosamente ajustados.
Esses experimentos finalmente deram frutos, diminuindo com sucesso a velocidade das partículas de anti-hidrogênio (a antimatéria equivalente ao hidrogênio, o mais leve de todos os elementos) equiparável a de um piloto de Fórmula 1 para o ritmo de um carro cruzando uma rua suburbana.
Já conseguimos levar a matéria comum a uma paralisação virtual, misturando e combinando uma variedade de métodos que canalizam energia para fora de seu ambiente imediato. Retardar a antimatéria é um desafio maior, exigindo métodos que não incluam o choque com partículas de matéria, pois isso resultaria na desintegração imediata em um flash de radiação.
A tecnologia do desacelerador já conseguiu diminuir a velocidade de átomos inteiros de antimatéria de quase a velocidade da luz para algo mais gerenciável nas últimas décadas. É o suficiente para permitir que os físicos realizem pelo menos alguns testes, como separar o espectro do anti-hidrogênio.
Até agora, os resultados desses estudos mostraram que o hidrogênio e o anti-hidrogênio são mais ou menos idênticos, exceto por suas cargas invertidas. O que é um pouco decepcionante, na verdade – qualquer diferença poderia nos dizer por que uma forma de matéria persistiu sobre a outra para criar o Universo que todos conhecemos e amamos.
Ainda assim, há uma chance distante de que, apesar de ter as mesmas massas, a gravidade ame um mais do que o outro. Ou talvez alguma outra força tenha uma influência sutil sobre a antimatéria de maneiras que ainda não conhecemos.
Para obter uma boa medida dessas coisas, precisamos desacelerar ainda mais a antimatéria: o processo ALPHA desacelera os antiátomos, lançando fótons neles de uma forma que não os agite inadvertidamente ao mesmo tempo.
Assim como os átomos comuns de hidrogênio, os átomos de anti-hidrogênio podem absorver e espalhar fótons para perder ou ganhar impulso. Este efeito só ocorre se a luz estiver na frequência certa. Se estiver muito alta ou muito baixa, as ondas de luz passarão direto.
Os pesquisadores ajustaram os lasers corretamente para levar em conta a velocidade do anti-hidrogênio que corre em direção à fonte, garantindo que os fótons estejam na frequência perfeita ao se encontrarem. Após cerca de uma dúzia de colisões, uma partícula se movendo a cerca de 300 quilômetros por hora pôde ser desacelerada para menos de 50 quilômetros por hora.
Por outro lado, as partículas que se afastaram do laser são invisíveis em sua frequência relativa, evitando um chute acelerado para longe.
“Com essa técnica, podemos abordar mistérios de longa data como: ‘Como a antimatéria responde à gravidade? A antimatéria pode nos ajudar a entender as simetrias na física?'”, disse Takamasa Momose, um físico da Universidade da Colúmbia Britânica e um dos membros da equipe da ALPHA.
“Essas respostas podem alterar fundamentalmente nossa compreensão de nosso Universo”.
Teremos de esperar um pouco mais antes de ver os resultados de tais experimentos e nos preparar para a possibilidade de que, mesmo se viajando tranquilamente e lentamente, os segredos da antimatéria serão difíceis de ver.
Mas talvez, apenas talvez, seja assim que tenhamos um vislumbre daquele antiuniverso espelhado, invertido no tempo, que parece muito mais estranho do que nossas melhores teorias atualmente imaginam.
Esta pesquisa foi publicada na Nature.