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Foram necessárias ondas de humanos modernos para conquistar a Europa dos neandertais

Traduzido por Julio Batista
Original de Carly Cassella para o ScienceAlert

Cientistas estão reescrevendo a história de como os humanos modernos se espalharam pela África e para fora dela, e isso pode conter mais desentendimentos com os neandertais da Europa do que se pensava anteriormente.

No ano passado, arqueólogos descobriram várias linhas de evidência para sugerir que o Homo sapiens estava vivendo na Europa 10.000 anos antes do que pensávamos.

Esse grupo inicial de migrantes humanos pode ter sido os primeiros aventureiros a chegar ao novo continente, mas provavelmente não foram os últimos – nem foram os mais bem-sucedidos.

Uma nova análise de milhares de artefatos de pedra sugere que, nos tempos paleolíticos, nossa espécie se espalhou pela Europa, levando conosco três ondas de tecnologia de fabricação de ferramentas, cada uma substituindo a anterior.

Comunidades neandertais que já viviam na Europa podem até ter frustrado uma dessas ondas.

Segundo o autor do estudo, o paleoantropólogo Ludovic Slimak, o Mediterrâneo francês não apresenta evidências de técnicas de fabricação de ferramentas da segunda onda de migração humana. No entanto, lugares mais a oeste, como a Espanha, abrigaram essas ferramentas atualizadas.

Teriam os neandertais do Mediterrâneo francês se rebelado contra o retorno do Homo sapiens?

Por pelo menos 12 milênios, argumenta Slimak, os neandertais no Vale do Ródano parecem ter mantido os migrantes humanos afastados, embora a terceira onda tenha eventualmente os substituído.

“Esses dados indicam que as últimas populações neandertais parecem não ter se refugiado, mas na verdade ocuparam, sem compartilhar por alguns milênios, os principais eixos de circulação na escala do continente europeu”, escreveu.

A análise, realizada na Universidade de Toulouse, na França, é extensa. Abrange mais de 17.000 artefatos de pedra que foram coletados no Líbano, no Mediterrâneo oriental. Essas ferramentas foram então comparadas a artefatos encontrados no contexto eurasiano mais amplo.

Exemplos de pontas e lâminas em antigos artefatos de ferramentas de pedra feitos pelos primeiros humanos onde hoje é o Líbano. (Créditos: Slimak, PLOS ONE, 2023)

Por fim, Slimak identifica três fases distintas de fabricação de ferramentas a partir dos resultados da escavação no Líbano. As ferramentas mais antigas eram feitas de lascas simples. Mais tarde, porém, armas como arremessadores de lança e arcos apareceram com pontas cuidadosamente moldadas. Em camadas posteriores, lâminas mais finas tornaram-se comuns.

Todas essas várias técnicas não “se infiltraram” umas nas outras. Em vez disso, elas aparecem abruptamente em certas camadas. Isso sugere que elas não foram criadas por meio de uma evolução gradual, mas por meio de alguma explosão de invasão cultural.

As três ondas de migração de I para III (de cima para baixo), mostrando os tipos de ferramentas feitas e sua presença em registros arqueológicos regionais. (Créditos: Slimak, PLOS ONE, 2023)

A primeira onda de tecnologia de ferramentas confirma o que Slimak e seus colegas descobriram em 2022: que os primeiros humanos modernos viveram na Europa entre 51.700 e 56.800 anos atrás.

A cultura da fabricação de ferramentas nessa época era consistente entre as comunidades humanas que viviam em uma área que abrangia a França até a Ucrânia. Os neandertais também pareciam ter adotado algumas dessas técnicas básicas de fabricação com pedras.

Mas então, de repente, duas transformações claras e intrusivas ocorreram no registro arqueológico do Líbano. A primeira apareceu há cerca de 45.000 anos.

É indicativo da cultura chatelperroniana, conhecida por moldar lâminas de pedra menores e mais complexas com pontas em outras partes da Europa. Esse tipo de fabricação de ferramentas não aparece em sítios arqueológicos humanos encontrados na França, mas aparece mais a oeste na Espanha.

Isso é obviamente muito longe do Líbano, e Slimak interpreta isso como uma segunda onda de migração humana que pareceu pular a França.

“Será que no mesmo espaço geográfico que viu as primeiras migrações do H. sapiens para a Europa, os grupos neandertais não permitiram mais o acesso ao seu território anterior?” questionou Slimak.

Isso é apenas especulação, mas as descobertas são curiosas. Por que algumas ondas de migrantes humanos modernos na Europa foram aparentemente dissuadidas pelos neandertais? E por que essa terceira e última onda teve tanto sucesso em substituir outros povos nativos?

Slimak também identifica uma terceira onda de fabricação de ferramentas humanas na Europa, marcada por lâminas longas e finas. Esta onda final está presente em evidências arqueológicas do Líbano em toda a Europa Ocidental, incluindo o Mediterrâneo francês, criando assim uma frente cultural humana unida pela primeira vez.

“Até 2022, acreditava-se que o Homo sapiens havia chegado à Europa entre o 42º e o 45º milênio”, disse Slimack.

“O estudo mostra que esta primeira migração do sapiens seria na verdade a última das três grandes ondas migratórias para o continente, reescrevendo profundamente o que se pensava ser conhecido sobre a origem do sapiens na Europa”.

O estudo foi publicado no PLOS ONE.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.