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Galáxia Olho Negro: seu brilho sinistro pode finalmente ser explicado

Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert

Não é preciso muita imaginação para entender por que a M64 é mais conhecida como a galáxia Olho Negro. Se estendendo no vácuo abissal do espaço, ela parece lançar um brilho sinistro através do cosmos, com uma nuvem de poeira emoldurando sua periferia visível como um hematoma escuro.

A galáxia é ainda mais estranha do que parece. Seu disco externo rico em hidrogênio orbita na direção oposta ao disco interno de estrelas da galáxia, sugerindo diferenças em suas origens.

Agora, astrônomos descobriram que o gás hidrogênio do disco externo veio de uma galáxia anã satélite menor e rica em gás que M64 recentemente canibalizou. É o material dessa galáxia menor que está escurecendo os arredores de M64.

A descoberta pode estar nos dando um vislumbre do futuro de nossa própria galáxia, a Via Láctea. As estimativas da massa e do conteúdo do satélite fragmentado sugerem que ele era notavelmente semelhante à Pequena Nuvem de Magalhães, uma galáxia anã satélite da Via Láctea que um dia será incluída na massa da nossa galáxia.

Essas descobertas, lideradas pelo astrônomo Adam Smercina, da Universidade de Washington, EUA, foram aceitas no The Astrophysical Journal Letters e estão disponíveis no servidor de pré-publicação arXiv.

“Encontramos evidências de uma característica espetacular de camada e outras estruturas de maré indicativas de uma fusão radial em estágio avançado”, escreveram os pesquisadores.

“Estimamos a massa estelar da galáxia progenitora em 500 milhões de massas solares, com uma metalicidade de [M/H] ≃ −1 – muito semelhante à massa e metalicidade da Pequena Nuvem de Magalhães.

“A massa do disco de gás externo em contra-rotação de M64 também é comparável à massa de gás da Pequena Nuvem de Magalhães, sugerindo que a origem mais provável do disco de contra-rotação único de M64 foi uma fusão recente com um satélite rico em gás muito semelhante à Pequena Nuvem de Magalhães.”

Acredita-se que as fusões de galáxias sejam uma parte muito importante do crescimento e evolução das galáxias. Esses eventos não apenas aumentam a massa de uma galáxia, mas também a infundem com novos materiais e interações gravitacionais que aumentam a formação estelar, mantendo a galáxia viva com novas gerações de estrelas.

A Via Láctea se fundiu com outras galáxias várias vezes ao longo de sua longa história de 13,6 bilhões de anos, e podemos ver outras galáxias no Universo em vários estágios do processo de fusão.

Como o canibalismo galáctico não é incomum, parecia razoável pensar que o estranho gás nas margens de M64 era o resultado de um desses eventos.

Estudos anteriores, no entanto, encontraram surpreendentemente poucos sinais de uma recente interação galáxia-galáxia, levando à sugestão de que o disco de hidrogênio havia sido sugado apenas do espaço ao redor da galáxia, ou de um breve encontro com outra galáxia chamada Coma P.

No entanto, também faltavam evidências para qualquer um desses cenários; então Smercina e seus colegas recrutaram a Hyper Suprime-Cam do telescópio Subaru para estudar o espaço em torno de M64, a cerca de 1,4 milhão de anos-luz de distância, procurando sinais da origem do disco externo em estrelas solitárias distantes do disco principal da galáxia.

Suas observações revelaram o que eles dizem ser vestígios claros de uma fusão galáctica. Eles encontraram um halo galáctico – uma esfera difusa de matéria escura, gás e estrelas que encapsula galáxias espirais, que se acredita se formar e crescer por meio de fusões de galáxias.

Mapa de estrelas em torno de M64, mostrando características de camadas a sudoeste e nordeste. (Créditos: Smercina et al, arxiv, 2023)

Mas eles também encontraram evidências de uma camada. No caso, uma densidade de estrelas que é produzida através da interação gravitacional entre duas galáxias em fusão. À medida que as galáxias orbitam umas às outras, sua interação gravitacional cria arrasto que faz com que as estrelas sejam empurradas próximas uma das outras, um pouco como os picos das ondulações em um lago.

A comparação com simulações mostrou que a distribuição da camada em torno de M64 é consistente com o que é conhecido como fusão “menor”; isto é, a absorção de uma galáxia anã satélite pelo hospedeiro maior.

O movimento do gás sugere que este satélite tinha uma órbita parcialmente retrógrada em torno de M64. E o centro empoeirado e as manchas escuras de poeira são o resultado da fusão em andamento à medida que o material colide com o disco interno de gás de M64.

Para confirmar esse cenário, os pesquisadores usaram dados do Hubble para estimar a massa e a composição da galáxia absorvida. Eles derivaram uma massa estelar de cerca de 500 milhões de massas solares, consistente com os 300 milhões a um bilhão de massas solares da Pequena Nuvem de Magalhães.

Um mapa de estrelas do halo de M64 (esquerda) em comparação com simulações de fusão galáctica (direita). Tradução da imagem: satélite (satellite), centro do hale (center of halo), primeiro pericentro (first pericenter) e disco de acreção (accreted stars only). (Créditos: Smercina et al, arXiv, 2023)

A massa do disco de hidrogênio em torno de M64 também é de cerca de 500 milhões de massas solares, o que, novamente, disseram os pesquisadores, é consistente com os 400 milhões de massas solares de gás na Pequena Nuvem de Magalhães. Juntas, as pistas parecem apontar de forma bastante convincente para o canibalismo galáctico, recente o suficiente para deixar esses vestígios – nos últimos bilhões de anos.

“As origens prováveis ​​do gás de contra-rotação do Olho Negro foram finalmente reveladas, após décadas de curiosidade”, escrevem os pesquisadores.

“Sugerimos que seu disco de gás externo foi adicionado recentemente durante uma fusão 52:1 com uma galáxia de massa da Pequena Nuvem de Magalhães e agora está colidindo com um disco de gás interno existente, alimentando um boom de formação estelar na região disco-disco e conduzindo as faixas de poeira visíveis das quais dão o nome da galáxia. Futuros estudos observacionais e teóricos ajudarão a testar essa ideia.”

Enquanto isso, M64 pode nos ajudar a entender como os halos estelares são formados. Ser capaz de calcular o movimento orbital anterior de uma galáxia satélite agora consumida pode ajudar a reproduzir a evolução do halo de M64, fornecendo informações valiosas sobre o crescimento dessas estruturas misteriosas.

A pesquisa da equipe foi aceita no The Astrophysical Journal Letters e está disponível no arXiv.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.