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Genomas de 240 mamíferos oferecem novas perspectivas sobre a evolução humana

Traduzido por Julio Batista
Original de Max Kozlov para a Nature

Quando foram publicados pela primeira vez no início dos anos 2000, os genomas completos dos camundongos, humanos, ratos e chimpanzés abriram as portas para os geneticistas compararem suas sequências e aprenderem mais sobre como os mamíferos evoluíram.

Agora, cerca de duas décadas depois, os pesquisadores reuniram e compararam os genomas de 240 mamíferos, mostrando o quão longe o campo chegou. A partir desse tesouro de dados – a maior coleção de sequências genéticas de mamíferos até agora – eles aprenderam mais sobre por que alguns mamíferos podem ter um olfato excelente, por que outros hibernam e por que alguns desenvolveram cérebros maiores. O esforço, chamado Projeto Zoonomia, relatou essas e outras descobertas em uma série de 11 papers na Science em 27 de abril.

Os dados destacam não apenas quais áreas dos genomas são semelhantes, mas também quando, na escala de milhões de anos, suas sequências genéticas divergiram. “Isso realmente não era possível sem essa escala de conjunto de dados antes”, disse Katie Pollard, cientista de dados da Universidade da Califórnia, San Francisco, EUA, que faz parte do projeto.

Sequenciar tantas espécies de mamíferos é uma grande conquista, disse David Haussler, diretor científico do Instituto de Genômica da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, EUA. “Sempre sonhamos com isso.” Haussler ajudou a sequenciar o primeiro genoma humano no início dos anos 2000.

Mineração dos dados

Esses primeiros genomas de mamíferos publicados há muito tempo foram um bom começo, disse Kerstin Lindblad-Toh, geneticista da Universidade de Uppsala, na Suécia, que é um dos líderes do Zoonomia. Mas ela e seus colegas perceberam que precisariam de mais de 200 genomas para oferecer uma visão estatisticamente significativa de como as espécies de mamíferos mudaram ao longo do tempo – especialmente se quisessem ampliar as mudanças genéticas no nível de pares únicos de bases de DNA.

O Projeto Zoonomia revelou novos detalhes sobre como os animais, como este arganaz de avelã, evoluíram para hibernar. (Créditos: George McCarthy/NPL)

O consórcio do Zoonomia, que inclui mais de 150 cientistas e 30 equipes de pesquisa de todo o mundo, disponibilizou seus 240 genomas ao público pela primeira vez em 2020. Desde então, os pesquisadores buscam semelhanças entre eles. Eles levantaram a hipótese de que, se certos segmentos dos genomas eram semelhantes – e permaneceram assim por dezenas de milhões de anos entre as espécies – esses segmentos devem ter uma função importante para esses animais. Em uma análise, uma equipe usou esse conceito para estimar que pelo menos 10,7% do genoma humano é idêntico ao de quase todas as espécies estudadas pelos pesquisadores. A maioria dessas áreas ‘conservadas’ são os chamados genes reguladores, que modulam como e quando outros genes são transcritos e, finalmente, traduzidos em proteínas. A função de cerca de metade desses genes conservados era desconhecida anteriormente.

Outras análises se voltaram para como os genomas diferem, destacando a maneira como certas características, como o olfato, evoluíram, mas também apontaram aos pesquisadores quais genes contribuem para doenças. Os estudos de associação ampla de genomas (GWAS) já compararam milhares de genomas humanos para identificar variantes que estão ligadas a doenças. Mas encontrar os genes precisos que não estão apenas ligados, mas causam uma doença, tem se mostrado difícil, especialmente para condições que possuem milhões de genes associados. Observar como esses genes evoluíram ao longo do tempo em todos os mamíferos pode ajudar a restringir a busca “em uma ordem de grandeza”, disse Lindblad-Toh.

Usando os dados do Zoonomia, os pesquisadores também construíram uma árvore filogenética que estima quando cada espécie de mamífero divergiu de seus ancestrais. Esta análise dá suporte à hipótese de que os mamíferos já começaram a divergir evolutivamente antes da Terra ser atingida pelo asteroide que matou os dinossauros há cerca de 65 milhões de anos – mas que eles divergiram muito mais rapidamente depois.

Só o começo

O Projeto Zoonomia é apenas uma das dezenas de esforços para sequenciar genomas de animais. Outro grande esforço é o Projeto Genoma dos Vertebrados (VGP, na sigla em inglês), que visa gerar genomas para aproximadamente todas as 71.000 espécies de vertebrados vivos, que incluem mamíferos, répteis, peixes, aves e anfíbios. Embora os dois projetos sejam independentes, muitos pesquisadores fazem parte de ambos, disse Haussler, curador do VGP.

Ter tantos genomas de mamíferos é uma façanha, disse Walter Jetz, ecologista da Universidade Yale em New Haven, Connecticut, EUA, mas o banco de dados do Zoonomia até agora tem uma tendência para espécies com corpos grandes e aquelas que não são de regiões tropicais. Sequenciar uma maior diversidade de mamíferos permitirá aos pesquisadores tirar conclusões mais confiáveis ​​sobre a evolução dos mamíferos, disse ele. Lindblad-Toh disse que o projeto visava selecionar uma ampla gama de espécies para amostrar, pois quanto mais mamíferos adicionados a esse conjunto de dados, mais poderoso ele seria. “Estamos entrando em uma fase exponencial de sequenciamento do genoma de mamíferos e outros grupos”, disse Nathan Upham, biólogo evolutivo da Universidade Estadual do Arizona em Tempe, EUA, que não participou da pesquisa.

Elinor Karlsson, geneticista da Faculdade Chan de Medicina da Universidade de Massachusetts, em Worcester, EUA, que é uma das líderes do Zoonomia, ressalta que os dados estão disponíveis ao público no site do projeto. “Realmente esperamos que mais pessoas comecem a descobrir todas as perguntas que podem ser feitas com esses conjuntos de dados”, disse ela.

Zoonomia não é o ápice da pesquisa em genômica de mamíferos – é apenas o começo, disse Upham. Os últimos 20 anos foram sobre aprender a sequenciar corretamente os genomas, acrescentou. “Agora estamos apenas começando a mergulhar profundamente nos genomas.”

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.