Jo Cameron, uma escocesa de 75 anos, é uma das poucas pessoas no mundo com uma condição rara chamada analgesia congênita. Sua vida sem dor, mesmo em situações como cirurgias e partos, é resultado de uma variação genética única que os cientistas estão buscando entender para oferecer novas soluções para pessoas com dor crônica. Este relato foi trazido à luz pela BBC em 2019 e agora tornou-se tema de estudo na University College London (UCL).
Os cientistas da UCL estão estudando o DNA de Cameron para entender como as vias da dor podem ser desativadas em pessoas com condições crônicas. Embora a dor seja um importante indicador de danos ao corpo, há situações em que essa percepção se torna excessiva e se transforma em dor crônica, causando sofrimento prolongado. Os genes de Cameron podem ser a chave para decifrar como interromper esse ciclo de dor.
A condição única de Cameron é causada por uma variação rara no gene FAAH-OUT, descoberta e nomeada em 2019 por James Cox, geneticista da dor da UCL, e seus colegas. Este gene, localizado em uma área do genoma humano previamente considerada “inútil”, desempenha um papel chave na modulação de outro gene, o FAAH, também conhecido como “gene da felicidade” ou “gene do esquecimento”, pois tende a tornar as pessoas menos ansiosas e mais esquecidas.
A ausência de adrenalina em situações de medo, que Cameron experimenta devido à sua mutação no gene FAAH-OUT, é uma das manifestações dessa condição genética única. Nas últimas duas décadas, pesquisadores têm tentado desenvolver medicamentos que atuem sobre o gene FAAH, mas ainda não tiveram sucesso em testes clínicos em humanos.
Compreender a interação entre FAAH e FAAH-OUT pode ajudar a refinar esses esforços e levar a novas descobertas sobre a dor. Os pesquisadores da UCL descobriram que esses dois genes costumam ser coexpressos nas mesmas células e que silenciar ou editar o gene FAAH-OUT em células humanas cultivadas em laboratório também reduz a expressão do gene FAAH.
Além disso, foi observado que isso afeta genes que codificam os receptores da dor e opióides, lípidos que têm um papel na cicatrização de feridas, e proteínas cerebrais que modulam o humor. Andrei Okorokov, biólogo molecular da UCL, afirma que a pesquisa tem importantes implicações para áreas como cicatrização de feridas, depressão e muito mais.
Não foi até os 65 anos que Cameron percebeu quão diferente sua experiência de vida era em relação à maioria das outras pessoas. Agora, a esperança é que os segredos únicos de suas células possam proporcionar uma existência mais feliz e menos dolorosa para muitos outros.
A pesquisa foi publicada na revista científica Brain.