Por Mike McRae
Publicado na ScienceAlert
Decidir doar os órgãos de um ente querido enquanto seus últimos suspiros ainda pairam no ar continua sendo uma das decisões mais emocionais que qualquer pessoa teria de tomar.
As descobertas de um novo estudo sobre o processo da morte não podem torná-lo menos doloroso, mas podem ajudar alguns de nós a dormir um pouco mais tranquilos à noite, ao mesmo tempo que aumenta a confiança dos médicos que supervisionam nossos momentos finais.
Trabalhando em estreita colaboração com o Programa Canadense de Pesquisa de Doação e Transplante, os médicos do Hospital Infantil do Ontário Oriental mediram a atividade cardíaca e a pressão arterial em centenas de unidades de terapia intensiva no Canadá, na República Tcheca e na Holanda.
O objetivo deles era registrar os casos clínicos em que o coração de uma pessoa doente espontaneamente – ainda que brevemente – retoma seu ritmo após o que se presume ser sua batida final.
Durante a maior parte da história, a morte foi sinônimo de parada cardíaca. A diferença entre um ser vivo e um corpo destinado ao necrotério se reduz a pouco mais do que a capacidade de encontrar o pulso.
Hoje sabemos melhor. A mistura de características que associamos a um ser humano vivo – da atividade cerebral à mera metabolização de uma célula – cada uma é interrompida em seu próprio tempo.
Escolher qualquer um deles para representar o ponto final de nossa existência é um trabalho para filósofos, não para cientistas.
No entanto, chegar a um acordo sobre um conjunto de critérios para representar nossa morte vai muito além do meio acadêmico. Onde a doação de órgãos está prevista, cada momento em que um tecido fica sem oxigênio é um momento muito longo.
Assistir ao relógio após a morte de uma pessoa é difícil para aqueles que estão sofrendo pela perda recente. Para o médico que conta os segundos, pode ser um teste de confiança.
Não faltam tentativas de chegar a algum tipo de consenso sobre o fim da vida com o qual todos concordam, com base em uma mistura de fatos concretos e valores culturalmente sensíveis.
Mas as listas de verificação de sinais vitais e atividade do tronco cerebral podem ser complexas, para não mencionar clínicas, levando alguns sistemas médicos a confiar na circulação como um indicador de vida em circunstâncias específicas, como quando o suporte vital foi removido recentemente.
O período específico de ausência de respiração e pulso varia de local para local, mas cinco minutos é uma contagem amplamente aceita. Depois disso, o adeus deve ser dito e a recuperação dos tecidos tem que começar.
Os casos de recuperação de órgãos que ocorrem em pouco mais de um minuto de ausência de pulso de bebês podem ser particularmente dolorosos, não importa o quão frágeis sejam seus órgãos com falta de oxigênio.
Mesmo o mais científico de nós naqueles momentos poderia ser perdoado por ter alguma esperança de um coração voltando à vida. É onde pesquisas como essa podem ser úteis.
Entre os 480 pacientes que se qualificaram para o estudo e tinham amplos dados disponíveis, 67 – apenas 14 por cento – mostraram sinais de retorno dos batimentos cardíacos. Em média, essa oscilação durou apenas alguns segundos e nenhum deles recuperou a vida.
Daqueles que experimentaram um pulso breve, apenas cinco tiveram um batimento que era perceptível na hora do seu leito de morte. Para o resto, a evidência de sua atividade cardíaca teve que esperar até uma revisão de seus dados de eletrocardiograma (ECG).
Em 55 casos, as retomadas seguiram um período de ausência de pulso medindo entre um e dois minutos. O tempo mais longo que qualquer um dos pacientes ficou sem batimento cardíaco – seguido por um curto retorno ao pulso – foi de 4 minutos e 20 segundos.
Com um foco nos 32 pacientes que concordaram em ser doadores de órgãos, houve apenas duas retomadas da atividade cardíaca; uma em 64 segundos e outra em 151 segundos.
Juntamente com aferir a queda da pressão arterial e particularidades da atividade elétrica que influenciam o coração, os dados sustentam fortemente a ‘regra dos cinco minutos’ de parada cardíaca, pelo menos para pacientes que dependiam de suporte vital. Para outros, medidas mais complexas podem ser necessárias.
Prever como nossos momentos finais se desenrolam é vital em situações em que o tempo é importante.
Mas saber o que podemos esperar do paciente também ajuda a família e os amigos a resolver dúvidas persistentes sobre decisões médicas que são literalmente uma questão de vida ou morte.
Esta pesquisa foi publicada no New England Journal of Medicine.