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Podemos ter tido a primeira observação completa de uma ‘nanoerupção’ de nosso Sol

Traduzido por Julio Batista
Original de Carly Cassella para o ScienceAlert

Quando Shah Bahauddin estava decidindo o que pesquisar para seu doutorado, ele não tinha intenção de se envolver em um dos problemas mais incômodos da astrofísica: por que a atmosfera distante do Sol é muito mais quente do que sua superfície turva?

Seu modesto tema de escolha foi um pequeno e breve ciclo de luz solar, quase imperceptível considerando a grande estrutura do Sol.

Mas o tamanho não é tudo. Acontece que os astrônomos estavam procurando por uma pequena erupção como esta por mais de meio século.

Cintilando logo abaixo da coroa superquente do Sol, a erupção em que Bahauddin se deparou pode muito bem ser o primeiro vislumbre completo de uma ‘nanoerupção’ solar – de seu súbito início brilhante até seu inevitável desaparecimento. E poderíamos facilmente ter perdido isso.

Se anéis sutis e fugazes como esse são frequentes, isso poderia ajudar a explicar como a coroa solar ficou centenas de vezes mais quente do que sua superfície visível – um mistério conhecido como o problema do aquecimento coronal.

“Achei que talvez os anéis tornassem a atmosfera um pouco mais quente”, admite Bahauddin.

“Nunca pensei que produziria tanta energia que pudesse realmente propelir plasma quente para a coroa e aquecê-la.”

Iluminações de anéis observadas. (Créditos: Bahauddin et al., Nature Astronomy, 2020)

Um bilhão de vezes menor do que as erupções solares normais, as nanoerupções são incrivelmente difíceis de detectar e só existiam na teoria, então os pesquisadores ainda relutam em classificar a descoberta por esse nome oficial.

Em teoria, temos uma ideia de como deveria ser uma nanoerupção, mas isso se baseia em várias suposições.

“Ninguém sabe realmente porque ninguém o viu antes”, diz Bahauddin. “É um palpite humilde, digamos.”

Desde que o astrofísico Eugene Parker propôs pela primeira vez a ideia de nanoerupção na década de 1970, os especialistas vêm tentando descobrir como essas erupções podem parecer na realidade.

Se elas realmente existem, são quase impossíveis de ver, ocorrendo milhões de vezes por segundo sem que nossos instrumentos percebam, embora nossa tecnologia esteja cada vez melhor.

Em 2017, por exemplo, nossa melhor evidência de uma nanoerupção veio da ausência de uma erupção maior. Uma região ativa do Sol, que hospedava poucas erupções de tamanho normal, mostrou um nível curioso de aquecimento. Algo invisível devia estar contribuindo com energia para a atmosfera. Uma nanoerupção combinava com o caso.

Tecnicamente, para ser considerada uma nanoerupção, uma erupção de calor deve ser desencadeada pelos campos magnéticos emaranhados do Sol, que são produzidos por bolhas de plasma agitado abaixo.

Quando esses campos se reconectam, acredita-se que eles causem um processo explosivo – equivalente a cerca de 10 bilhões de toneladas de TNT. Isso energiza e acelera as partículas ao redor, e se toda essa atividade for forte o suficiente para aquecer a coroa solar, milhares de quilômetros acima, é chamada de nanoerupção.

Um close-up de um das coroas luminosas estudadas. Cada quadro na imagem aumenta o zoom (da esquerda para a direita), mostrando a nanoerupção putativa. O minúsculo quadro à direita superior é escala da Terra (Earth Scale) em comparação. (Créditos: NASA/SDO/IRIS/Bahauddin)

Analisando algumas das melhores imagens da coroa solar, tiradas do Interface Region Imaging Spectrograph da NASA, ou satélite IRIS, a nova descoberta atende a ambos os requisitos.

Não apenas esse minúsculo círculo de luz estava milhões de graus mais quente do que os arredores, mas a maneira como explodiu parecia curiosa.

“É preciso examinar se a energia de uma nanoerupção pode ser dissipada na coroa”, explica Bahauddin.

“Se a energia vai para outro lugar, isso não resolve o problema do aquecimento coronal.”

Olhando os dados, parecia que os elementos pesados, como o silício, se tornaram muito mais quentes e mais energéticos do que os elementos mais leves como o oxigênio, que é exatamente o oposto do que você esperaria.

Em busca de um tipo de calor que pudesse impactar um átomo de oxigênio de maneira diferente de um átomo de silício, os pesquisadores encontraram apenas uma correspondência: um evento de reconexão magnética.

Nessas circunstâncias caóticas complexas, os íons mais pesados ​​têm uma vantagem, porque podem passar por entre as multidões de íons mais leves e roubar toda a energia, acumulando grande calor no processo.

Mas isso era apenas uma hipótese e parecia um tiro no escuro. As condições necessárias para atingir esse tipo de aquecimento exigiam apenas a proporção certa de silício para oxigênio. Isso poderia realmente existir?

“Então, olhamos para as medições e vimos que os números correspondiam exatamente”, explica Bahauddin.

Para o espanto da equipe, parecia que haviam encontrado uma explicação real para o aquecimento coronal. O próximo passo era ver se realmente aquecia a coroa.

Analisando os dados da região logo acima do anel luminoso, pouco antes de explodir, a equipe encontrou sua pista final.

“E lá estava, apenas um atraso de 20 segundos”, lembra Bahauddin. “Vimos o brilho e de repente vimos que a coroa ficou superaquecida a temperaturas de vários milhões de graus.”

A equipe já encontrou nove outros anéis na superfície do Sol que também mostraram uma transferência de energia semelhante para a coroa.

Se esse aquecimento localizado é suficiente para explicar as temperaturas mais altas encontradas na coroa do Sol, vai depender de quantos outros anéis os astrônomos poderão encontrar.

Se sua frequência e localização forem frequentes e generalizadas o suficiente, essas erupções de energia poderiam, pelo menos parcialmente, responder ao mistério que cerca o aquecimento coronal.

No entanto, com toda a probabilidade, os astrônomos pensam que provavelmente existem vários mecanismos invisíveis em ação. Provavelmente não é apenas uma coisa que está aquecendo a atmosfera do Sol a temperaturas tão intensas, e muitas das ideias que temos agora não são mutuamente exclusivas.

Outras teorias incluem ondas eletromagnéticas que saem do Sol, aquecendo partículas e permitindo que elas “surfem” para a atmosfera externa.

Este pequeno trabalho é apenas uma pequena peça do quebra-cabeça.

O estudo foi publicado na Nature Astronomy.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.