Cientistas estão prevendo um renascimento da astronomia no continente Africano há anos, devido ao radiotelescópio gigante que vem sendo construído lá. Mas a estrada para o “cachê cósmico” não é assim tão fácil, e os defensores da astronomia africana estão se esforçando para tirar todas as vantagens possíveis das oportunidades que estão vindo.
“A astronomia está realmente prestes a explodir no continente Africano”, disse o astrônomo Kartik Shet, membro da NRAO (US National Radio Astronomy Observatory), em 9 de Janeiro, na 223° na conferência da Sociedade Americana de Astronomia, perto de Washington DC. O desafio, segundo ele, é fazer com que os astrônomos africanos se beneficiem com o surgimento de facilidades sendo construídas em seu meio. “Nós queremos construir, a longo-prazo, colaborações sustentáveis que são mutuamente benéficas tanto para os Estados Unidos quanto para a África. Nós não queremos drenar as informações da África”
A maior virada de jogo do continente será o SKA (Square Kilometer Array), a maior rede de linhas de rádiotelescópios do mundo, destinada a examinar o céu de forma mais rápida que qualquer instrumento já pôde fazer. Será integrada por grosseiros três mil “pratos” – cujo combinados irão tomar parte de uma superfície de aproximadamente um quilômetro quadrado – que irão se espalhar por vastas distâncias para oferecer uma resolução semelhante a de um só e que teria a mesma área. “A SKA será o principal projeto das últimas décadas, uma completa revolução na Rádio Astronomia”, disse Ted Williams, diretor do Observatório Astronômico da África do Sul. “A maior parte do SKA ficará situada na África, e em todo o continente, estendendo-se por mais oito países”, que seriam Botswana, Gana, Madagascar, Ilhas Maurício, Moçambique, Namíbia, África do Sul e Zâmbia. Uma pequena porção do projeto será construída na Austrália.
A África do Sul, sede do projeto no continente Africano, armou uma campanha competitiva para trazer o observatório para a África, e as notícias em 2012 de que o país tinha conseguido a maior parte do projeto foi inesperada para muitos. “Nós meio que fomos pegos de surpresa, mas fizemos nossa tarefa muito bem”, diz Takalani Nemaungani, um engenheiro do Departamento de Ciência e Tecnologia da África do Sul e quem levou seu país para a entrada na campanha. Nemaungani cedeu ao comitê do SKA os céus limpos da África do Sul (necessários para uma alta precisão na Radio Astronomia), conseguiu o apoio político do presidente e do gabinete – que aprovou uma lei para limitar a quantidade de ruídos próximos a área utilizada – e desenvolveu uma engenharia e uma infraestrutura para o projeto. A construção do observatório custou 1,6 bilhões de dólares, está programada para começar em 2016 e serão adicionadas fases para ele, com suas primeiras observações em 2019 e funcionamento completo em 2024.
No passado, o apartheid na África do Sul tinha sido um desafio especial. Até o fim da política de separação de raças em 1994, o país enfrentou uma imensa agitação local e uma maldição internacional. As sanções comerciais impostas a África do Sul por outros países, especialmente os Estados Unidos, prejudicou a economia da nação, mas resultou em uma impulsão não intencional da tecnologia caseira. “Por causa dos embargos e das sanções aqui, existiam alguns conhecimentos e tecnologias que tínhamos de construir para nós mesmos para sustentar o país”,Nemaungani menciona. Por exemplo, o embargo petrolífero internacional contra a África do Sul, em 1987, forçou a nação a se tornar o líder mundial em tecnologia relacionada a converter o carvão no petróleo.
Mesmo assim, o objetivo de ascendência astronômica da África enfrenta sérios desafios, incluindo muitos países do continente com altos níveis de desemprego e pobreza, baixa educação e a falta de investimento na ciência. De acordo com o Relatório de Ciência da Unesco em 2010, o incremento científico na África subsaariana enfrenta “deficiência no desenvolvimento, pequena quantidade de pesquisadores e mínima produção científica. O continente parou de investir nas Ciência, Tecnologia e Inovação (STI) como impulsionadores de crescimento econômico e como desenvolvimento sustentável a longo-prazo”
Os defensores da nova era de astronomia africana querem mudar tudo isso. “SKA está nos ajudando a mudar nossas perspectivas sobre a África como um destino de conveniências de alta-tecnologia e de indústria”, Nemaungani diz. “Nós estamos usando a astronomia como uma porta de entrada científica para incentivar crianças a estudarem matemática e ciência. Esse é o motivo pelo qual um grande projeto como o SKA pode causar um grande impacto.”
Praticamente todos na África do Sul já ouviram falar sobre o SKA, embora eles provavelmente não saibam muito sobre ele, Williams diz. Os líderes estão particularmente trabalhando para ajudar a população negra da África do Sul a obter novas oportunidades científicas – que tradicionalmente privilegiam os brancos. “Várias gerações de africanos disseram: ‘Você não pode fazer isso'”, disse ele a Scientific American. “A mensagem que nós estamos tentando manda é: ‘Sim, você pode'”.
E, ainda, o SKA não é único, mas é um dos vários projetos astronômicos do continente. Já existe o HESS (High Energy Stereoscopic System) do observatório de raios gama inaugurado na Namíbia em 2002, o SALT (Southern African Large Telescope), que foi inaugurado na África do Sul em 2005 e começou a funcionar totalmente em 2011, e um projeto de construção de telescópios em Burkina Fasso e na Etiópia.
Ted Williams foi um astrônomo da Universidade de Rutgers em 1998, quando ele foi pela primeira vez à África do Sul para investigar a possibilidade de construir o SALT. Sua esposa insistiu em ir junto na viagem porque era “uma oportunidade em uma vida” de visitar o lugar. Não demorou muito, contudo, para que os dois se mudassem para a Cidade do Cabo. Lá, Williams conseguiu perceber significativamente os avanços tecnológico, científico e social. “Quando começamos no SALT, ninguém poderia ter esperanças de que um projeto como o SKA pudesse ir para a África do Sul”, Williams diz. “Tanta coisa mudou”.
Artigo de Clara Moskowitz, publicado na revista Nature, com título Telescope array could usher in astronomy revolution in Africa