Traduzido por Julio Batista
Original de Shi Dai et. al. para o The Conversation
Rajadas rápidas de rádio – flashes intensos de milissegundos de energia de rádio do espaço sideral – têm intrigado os astrônomos desde que foram vistos pela primeira vez em 2007. Uma única rajada pode emitir tanta energia em sua breve vida quanto o Sol em poucos dias.
A grande maioria dos pulsos de curta duração se origina fora de nossa galáxia, a Via Láctea. Não sabemos o que produz a maioria deles, ou como.
Em uma nova pesquisa publicada na Science, observamos uma rajada rápida de rádio repetida por mais de um ano e descobrimos sinais de que ela está cercada por um campo magnético forte, mas altamente mutável.
Nossos resultados sugerem que a fonte dessa rajada cósmica pode ser um sistema binário formado por uma estrela de nêutrons girando através de ventos de plasma magnetizado denso produzido por uma estrela massiva companheira ou mesmo por um buraco negro.
Uma rajada rápida de rádio que nunca para de se repetir
A rajada repetida conhecida como FRB 20190520B foi descoberta em 2022 por astrônomos no Telescópio Esférico de Abertura de Quinhentos Metros (FAST, na sigla em inglês) na China. Rajadas rápidas de rádio repetidas são raras, mas a FRB 20190520B é a mais rara de todas: é a única que nunca descansa, produzindo rajadas de rádio algumas vezes por hora, às vezes em múltiplas frequências de rádio.
Depois que esse objeto intrigante foi encontrado pela primeira vez, os astrônomos correram para acompanhar a observação inicial usando outros comprimentos de onda de rádio.
Investigações posteriores mostraram que a FRB 20190520B reside em um ambiente extremamente denso em uma galáxia anã a 3,9 bilhões de anos-luz de distância. Existem também materiais ao redor da fonte da rajada rápida de rádio que produzem emissões de rádio fortes e persistentes.
Isso levou a sugestões de que a fonte da rajada é uma jovem estrela de nêutrons em um ambiente complexo.
Campos magnéticos poderosos
O que mais podemos aprender sobre essa rajada intergaláctica e seu ambiente? Realizamos observações da FRB 20190520B usando o radiotelescópio Parkes da CSIRO, Murriyang, em Nova Gales do Sul, na Austrália, e o Telescópio de Green Bank, nos Estados Unidos.
Para nossa surpresa, a FRB 20190520B acabou produzindo sinais fortes em frequências de rádio relativamente altas. Esses sinais de alta frequência acabaram sendo altamente polarizados – o que significa que as ondas eletromagnéticas estão “ondulando” muito mais fortemente em uma direção do que em outras.
Descobrimos que a direção dessa polarização muda em diferentes frequências. Medir o quanto ela muda nos informa sobre a força do campo magnético pelo qual o sinal viajou.
Acontece que essa medida de polarização sugere que o ambiente em torno de FRB 20190520B é altamente magnetizado. Além disso, a força do campo magnético pareceu variar ao longo dos 16 meses em que observamos a fonte – e até mudou de direção completamente duas vezes.
Essa mudança na direção do campo magnético em torno de uma rajada rápida de rádio nunca foi observada antes.
Preenchendo as lacunas
O que isso nos diz sobre o FRB 20190520B? As teorias mais populares para explicar observações recentes de rajadas rápidas de rádio repetidas envolvem sistemas binários compostos de uma estrela de nêutrons e outra estrela massiva ou um buraco negro.
Embora ainda não possamos descartar outras hipóteses, nossos resultados favorecem o cenário de estrelas massivas.
Estrelas massivas são conhecidas por terem fortes ventos estelares com campos magnéticos organizados ao seu redor. Se a fonte das rajadas estivesse se movendo para dentro e para fora da região do vento estelar enquanto viaja por sua órbita, esperaríamos que a direção do campo magnético observado se invertesse.
A escala de tempo da reversão do campo magnético, a variabilidade medida na força aparente do campo e o plasma denso ao redor da fonte da rajada se encaixam nesse cenário.
Qual é o próximo passo?
Nossas observações podem fornecer evidências cruciais para apoiar a hipótese de que as fontes de rajadas rápidas de rádio repetidas têm um companheiro massivo capaz de produzir plasma altamente magnetizado.
Mais importante, a hipótese binária nos dá uma previsão para o futuro. Se estiver correto, as mudanças na polarização dos sinais de rádio do FRB 20190520B devem aumentar e diminuir em períodos de tempo mais longos.
Então estaremos atentos. Observações futuras com Murriyang e o Telescópio de Green Bank revelarão se a FRB 20190520B está realmente em um sistema binário – ou se o Universo nos surpreenderá mais uma vez.