Traduzido por Julio Batista
Original de Joshua A. Krisch para a Live Science
Há pelo menos um milênio, uma tartaruga gigante andou por Madagascar, alimentando-se de plantas aos montes – uma dieta abundante que dava a ela um papel no ecossistema equivalente aos dos mamutes e outros grandes herbívoros. E como o mamute, esta tartaruga gigante anteriormente desconhecida está extinta, segundo um novo estudo.
Os cientistas descobriram a espécie enquanto estudavam a misteriosa linhagem de tartarugas gigantes que vivem em Madagascar e outras ilhas no oeste do Oceano Índico. Depois de se deparar com uma única tíbia (osso da perna) da tartaruga extinta, eles analisaram seu DNA nuclear e mitocondrial e determinaram que o animal era uma espécie recém-descoberta, que eles batizaram de Astrochelys rogerbouri, de acordo com o estudo, publicado em 11 de janeiro em a revista Science Advances. O nome da espécie da tartaruga homenageia o falecido Roger Bour (1947-2020), um herpetologista francês e especialista em tartarugas gigantes do Oceano Índico Ocidental.
Não está claro quando a espécie recém-descoberta foi extinta, mas o espécime estudado parece ter cerca de 1.000 anos de idade. “À medida que obtemos uma tecnologia cada vez melhor, somos capazes de fornecer diferentes tipos de dados que muitas vezes mudam nossa perspectiva”, disse a coautora do estudo, Karen Samonds, professora associada do Departamento de Ciências Biológicas da Universidade do Norte de Illinois, EUA, à Live Science. “É realmente emocionante descobrir um novo membro da comunidade.”
Ilhas vulcânicas e atóis coralinos no oeste do Oceano Índico já foram repletos de tartarugas gigantes. Pesando até 272 quilos, essa pesada megafauna influenciou fortemente seus ecossistemas, mesmo que apenas por meio de seus apetites vorazes. As 100.000 tartarugas gigantes que ainda vivem hoje em Aldabra – um atol verdejante a noroeste de Madagascar – consomem 11,8 milhões de quilos de matéria vegetal a cada ano.
A maioria das espécies nativas daquela região está extinta devido às atividades humanas, e os paleontólogos ainda estão lutando para juntar as peças da história dessas tartarugas desaparecidas. Mas analisar o DNA antigo desses gigantes está fornecendo um caminho a seguir, o que, por sua vez, ajuda a esclarecer a vida pré-histórica na ilha.
“Se quisermos saber como eram originalmente esses ecossistemas insulares, precisamos incluir tartarugas gigantes – grandes membros extintos do ecossistema que assumiram o papel frequentemente ocupado por grandes mamíferos herbívoros”, disse Samonds. “E para entender o papel fundamental que desempenharam, precisamos entender quantas tartarugas existiam, onde viviam e como chegaram lá.”
Na época em que os exploradores começaram a coletar fósseis de tartarugas gigantes no século 17, a população nativa de tartarugas gigantes de Madagascar havia desaparecido há muito tempo – provavelmente vítimas da colonização pelo povo indo-malaio 1.000 anos antes – e seus parentes foram parar no arquipélago de Mascarenhas e viveram um tempo nas ilhas graníticas das Seicheles. Os marinheiros europeus matavam as tartarugas para alimentação e obtenção de “óleo de tartaruga”, e todas, exceto as nativas da distante Aldabra, desapareceram no século XIX.
A difícil tarefa de reconstruir sua história caberia aos paleontólogos modernos. “Os restos de tartaruga são notoriamente fragmentados, e é um verdadeiro desafio descobrir como era uma tartaruga apenas a partir de uma parte do casco”, disse Samonds. Os cientistas também se esforçam para entender um registro fóssil afetado pelo comércio de tartarugas. Um determinado espécime encontrado nas Ilhas Mascarenhas se originou lá, ou sua carcaça foi deixada por um navio vindo das ilhas graníticas das Seicheles?
“No final, muitos desses fósseis ficaram em um armário, sem uso e sem estudo”, disse Samonds. Mas os recentes avanços tecnológicos na análise de DNA antigo deram a Samonds e seus colegas um vislumbre dentro da caixa preta da história evolutiva da tartaruga. “É emocionante que agora tenhamos essa tecnologia e possamos usar o DNA antigo para dar bom uso a esses pedaços de fósseis fragmentados.”
Para o estudo, Samonds e colegas geraram genomas mitocondriais quase completos a partir de vários fósseis de tartarugas, alguns dos quais tem centenas de anos. Ao combinar essas sequências com dados anteriores sobre linhagem de tartarugas e datação por radiocarbono, a equipe conseguiu descrever como as tartarugas gigantes migraram para várias ilhas do Oceano Índico.
A extinta linhagem Cylindraspis das Ilhas Mascarenhas, por exemplo, parece ter deixado a África no final do Eoceno, há mais de 33 milhões de anos, e fixou residência no agora submerso ponto vulcânico da Ilha da Reunião. A partir daí, as espécies se espalharam pelas ilhas locais, resultando na divergência de cinco espécies de jabutis das Mascarenhas entre 4 milhões e 27 milhões de anos atrás.
Samonds espera que futuros estudos paleontológicos sigam o exemplo do presente trabalho e se beneficiem da incorporação de análises de DNA antigo em metodologias mais convencionais.
“A inclusão do DNA antigo nos permitiu examinar quantas espécies de tartarugas existiam e quais eram suas relações entre si. Também nos ajudou a apreciar a diversidade original de tartarugas nessas ilhas”, disse Samonds. “Não poderíamos ter explorado esses tópicos antes.”