Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert
Um pequeno buraco negro que está por aí, silenciosamente cuidando da própria vida, foi detectado fora da galáxia Via Láctea.
Isso, segundo a equipe, marca a primeira vez que conseguimos detectar e identificar conclusivamente um buraco negro inativo que não está dentro dos limites de nossa própria galáxia.
Embora uma descoberta semelhante tenha sido anunciada no ano passado, a evidência de sua verdadeira identidade deixou algumas dúvidas. Essa descoberta mais recente, segundo os autores, é uma aposta sólida.
É certo que o objeto não está tão longe da Via Láctea, aninhado dentro de uma galáxia satélite chamada Grande Nuvem de Magalhães. Mas a descoberta pode nos ajudar a encontrar mais buracos negros no futuro e tem implicações para nossa compreensão da formação de buracos negros.
A equipe por trás do relatório está claramente empolgada, principalmente por causa de sua reputação cética de lançar dúvidas sobre descobertas anteriores de buracos negros dormentes.
“Pela primeira vez, nossa equipe se reuniu para relatar uma descoberta de buraco negro, em vez de rejeitar uma”, disse o astrônomo Tomer Shenar, da Universidade de Amsterdã, na Holanda.
“Identificamos uma ‘agulha no palheiro’.”
Buracos negros são monstros complexos. Sua densidade extrema produz um campo gravitacional extremo que significa que nem mesmo a luz zunindo no vácuo – o mais rápido que qualquer coisa pode ir no Universo – é capaz de atingir a velocidade de escape.
Isso significa que eles estão envoltos na escuridão, não emitindo nenhuma luz que possamos detectar. A exceção é quando eles estão ativamente “alimentando” ou acumulando material. Este é um processo turbulento que produz uma assinatura reveladora de radiação de raios-X da vizinhança imediatamente ao redor do buraco negro.
Os buracos negros inativos ou dormentes são mais ou menos invisíveis. Mas essa gravidade incômoda pode denunciá-lo… se você souber como olhar. Se um buraco negro de massa estelar está em um sistema binário com outra estrela, o movimento orbital da companheira circulando o que parece ser um espaço vazio pode indicar a presença do buraco negro.
Nem todas as massas escuras são buracos negros, no entanto. Outros astrônomos já foram enganados antes, sendo o exemplo mais famoso um buraco negro apontado como o mais próximo da Terra já encontrado. Um companheiro pequeno e escuro cuja luz não pode ser discernida pode ser o culpado, o que significa que nenhuma opção pode ser deixada de lado.
Shenar e membros de sua equipe, incluindo os astrônomos Kareem El-Badry, do Centro de Astrofísica da Harvard & Smithsonian e Julia Bodensteiner, do Observatório Europeu do Sul, estão entre aqueles que desmascararam meticulosamente essas descobertas. Mas isso não significa que eles pensem que esses buracos negros não existem; apenas que a evidência precisa ser clara.
“Há mais de dois anos, procuramos esses sistemas binários de buracos negros”, explicou Bodensteiner.
O foco de sua busca foi a Nebulosa da Tarântula na Grande Nuvem de Magalhães, um berçário estelar onde estrelas jovens e extremamente massivas podem ser encontradas. Os pesquisadores estudaram, em detalhes, cerca de 1.000 dessas jovens estrelas massivas, procurando a oscilação reveladora de uma órbita binária.
Quando quaisquer dois objetos orbitam um ao outro, eles fazem isso em torno de um centro de gravidade mútuo chamado baricentro. Para um sistema como a Terra e o Sol, o baricentro estaria próximo o suficiente do centro do Sol para que fosse difícil ver a estrela se mover em torno dele de qualquer distância. Se a Terra fosse mais massiva, o círculo do Sol no baricentro seria muito mais fácil de detectar.
Podemos detectar esse movimento oscilante, ou velocidade radial, no espectro da luz do objeto à medida que se estende em comprimentos de onda mais longos (mais vermelhos) se afastando de nós e se comprime em comprimentos de onda mais curtos (mais azuis) se movendo em nossa direção.
A equipe pesquisou sua amostra para essas mudanças espectrais e obteve um resultado – com uma estrela massiva azul-branca do tipo O com 25 vezes a massa do Sol, a cerca de 160.000 anos-luz de distância. Quando calcularam a massa do objeto que poderia causar a oscilação observada, descobriram que o companheiro tinha cerca de 9 vezes a massa do Sol. Nessa massa, o horizonte de eventos do buraco negro teria cerca de 27 quilômetros de diâmetro.
E, no entanto, era invisível. O limite de massa superior para estrelas de nêutrons é cerca de 2,3 vezes o do Sol, então isso os exclui. Outras estrelas em sua amostra que oscilaram foram descartadas usando as técnicas da equipe para detectar luz de estrelas companheiras difusas e modelando a luz esperada de uma companheira difusa na massa observada.
Nenhuma das explicações alternativas se encaixa nos dados de observação.
“Quando Tomer me pediu para verificar suas descobertas, eu tive minhas dúvidas”, disse El-Badry. “Mas não consegui encontrar uma explicação plausível para os dados que não envolviam um buraco negro.”
O sistema binário, chamado VFTS 243, pode conter pistas importantes sobre como os buracos negros se formam. Os cientistas acreditam que existem vários cenários. A primeira é uma supernova colossal na qual uma estrela instável entra em erupção, explodindo seu material externo no espaço enquanto o núcleo colapsa em um buraco negro, nascido do fogo e da fúria.
A segunda é um colapso direto no qual uma estrela moribunda, não mais suportada pela pressão externa fornecida pela fusão atômica apenas… colapsa sobre si mesma, não com um estrondo, mas com um silencioso “puff”.
“A estrela que formou o buraco negro em VFTS 243 parece ter colapsado completamente, sem nenhum sinal de uma explosão anterior”, disse Shenar. “Evidências para esse cenário de ‘colapso direto’ têm surgido recentemente, mas nosso estudo provavelmente fornece uma das indicações mais diretas. Isso tem enormes implicações para a origem das fusões de buracos negros no cosmos.”
Embora, é claro, tendo examinado tantas outras descobertas de buracos negros, a equipe agora convida outros astrônomos a examinar as suas. É justo.
A pesquisa foi publicada na Nature Astronomy.