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Um fóssil de gorgossauro pode ser vendido por R$ 43 milhões – e os cientistas não estão felizes

Traduzido por Julio Batista
Original de Paola Rosa-Aquino para o Business Insider

O esqueleto fossilizado completo de um dinossauro Gorgossauro que vagou pela Terra há 76 milhões de anos será leiloado em 28 de julho, anunciou a casa de leilões Sotheby’s na terça-feira.

Com quase 3 metros de altura e 7 metros de comprimento, o espécime bem preservado é um primo menor do tiranossauro rex. Foi descoberto na Formação do Rio Judith, perto de Havre, Montana, em 2018. A estimativa de pré-venda da casa de leilões é de que será vendido por US$ 5 milhões (R$ 27 milhões) a US$ 8 milhões (R$ 43 milhões), segundo a  Associated Press.

Especialistas dizem que é difícil confirmar se os leilões multimilionários de esqueletos de dinossauros se tornaram mais comuns, mas houve uma série de vendas de fósseis de alto nível nos últimos anos.

Um esqueleto de tiranossauro rex chamado “Stan” foi vendido por um recorde de US$ 31,8 milhões em 2020. Até celebridades como Nicolas CageLeonardo DiCaprio participaram de leilões de fósseis de dinossauros.

Mas para os paleontólogos, esse leilão de alto nível faz parte de uma tendência preocupante, na qual fósseis raros podem efetivamente ser perdidos para a ciência.

Especialistas na área dizem que fósseis sendo adquiridos por colecionadores particulares podem impedir que sejam vistos pelo público e estudados por pesquisadores.

“Este leilão é repugnante”, disse Thomas Carr, paleontólogo do Carthage College.

Carr acrescentou que o fóssil é um dos poucos esqueletos de Gorgossauro já encontrados nos EUA, já que a maioria dos restos foi descoberta no Canadá.

“Na minha carreira, tive o privilégio de manusear e vender muitos objetos excepcionais e únicos, mas poucos têm a capacidade de inspirar admiração e capturar a imaginação como esse esqueleto inacreditável de Gorgossauro”, disse Cassandra Hatton, chefe global de ciência e cultura popular da Sotheby’s, à Associated Press. A Sotheby’s não respondeu ao pedido de comentários da Insider.

Leilões de alto nível,  como a próxima venda do Gorgossauro, alimentam a percepção de que o valor dos fósseis de dinossauros é monetário, e não científico, acrescentou Carr.

“O valor dos fósseis de dinossauros é a informação que eles contêm em seus ossos. O tamanho da amostra é tudo na ciência, e o leilão de um esqueleto para um comprador privado é igual à perda de uma montanha de dados para um cientista”, disse ele.

Se um fóssil é de propriedade privada, paleontólogos como Carr temem que os proprietários possam negar o acesso público ao espécime ou revendê-lo, dificultando a realização de análises de longo prazo, verificação de pesquisas anteriores e novas questões científicas.

Países como Canadá, Mongólia, Brasil e China têm leis que protegem fósseis significativos onde quer que sejam encontrados, de acordo com Victoria Arbour, curadora de paleontologia do Museu Real da Colúmbia Britânica, no Canadá. Mas nos Estados Unidos, as licenças para coletar ossos de dinossauros só são necessárias se os ossos de dinossauros forem encontrados em terras federais. É raro que os fósseis sejam leiloados legalmente em outros países, disse Arbor ao Insider.

Especialistas em dinossauros dizem que estão preocupados com o fato de que vender fósseis ao maior lance está inflando os preços. Segundo Arbour, a maioria dos museus trabalha diretamente com comerciantes e paga preços mais baixos. Os preços dos leilões “geralmente são muito maiores do que qualquer museu pode realmente pagar”, disse Arbor, acrescentando: “Não custa US$ 5 milhões para coletar um Gorgossauro. Não é de graça, mas as margens de lucro são realmente altas nesses espécimes leiloados.”

Outra preocupação é que os caros leilões de fósseis podem incentivar as pessoas a roubar ossos, em vez de deixá-los para os paleontólogos estudarem.

Em maio, funcionários do Serviço Nacional de Parques dos EUA disseram que fósseis raros de répteis com pelo menos 200 milhões de anos foram roubados do Parque Nacional Capitol Reef, em Utah, entre agosto de 2017 e agosto de 2018. P. David Polly, paleontólogo da Universidade de Indiana (EUA), destacou o próprio tesouro de fósseis da universidade, usado para pesquisa. “Quanto mais valor comercial estiver associado aos fósseis, maior a probabilidade de alguém querer invadi-lo e roubar algo”, disse Polly ao Insider.

Nem todos os fósseis leiloados se tornam inacessíveis após a venda. Um dos primeiros fósseis de alto nível vendidos em leilão foi um dinossauro chamado “Sue”, o T. rex mais completo que já foi encontrado, que foi vendido para o Museu Field de História Natural em Chicago (EUA) por mais de US$ 8,3 milhões em 1997.

Se um particular compra um fóssil, o público e os pesquisadores não têm o direito de saber seu paradeiro, segundo Arbour. “Nem sempre sabemos onde esses fósseis acabam, e é assim que funciona”, disse Arbor ao Insider.

“É realmente lamentável, porque esses espécimes realmente interessantes podem simplesmente desaparecer da acessibilidade científica”.

Quando “Stan” foi vendido para um comprador anônimo em 2020, o esqueleto de dinossauro desapareceu dos olhos do público. Ele ressurgiu quase dois anos depois, quando a National Geographic informou pela primeira vez que estava a caminho de um futuro museu de história natural em Abu Dhabi. A identidade do comprador anônimo permanece desconhecida, embora o último lar do fóssil em um museu alivie potencialmente as preocupações de que ele se tornará inacessível aos cientistas.

Embora alguns fósseis comprados em leilão sejam doados a museus e instituições de pesquisa, paleontólogos como Polly enfatizam que não há garantia desse resultado.

“Mesmo o colecionador mais bem intencionado, uma vez morto, por exemplo, tem muito pouco controle sobre o que acontece com esse fóssil depois”, disse Polly, acrescentando: “A disponibilidade a longo prazo é sempre questionável quando vai para mãos privadas.”

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.