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Uma introdução conceitual à cosmologia

Por Gustavo Romero

Segue uma lista de conceitos básicos de cosmologia que parecem ser convenientes de se esclarecer, devido à grande quantidade de perguntas que me fazem.

1. O que é o Universo?

O Universo é um sistema formado por tudo que existe. Como é um sistema, e não um conjunto, tem propriedades físicas como temperatura, densidade, entropia, etc.

2. O que é o modelo padrão da cosmologia?

É um modelo que representa a evolução e formação das estruturas no Universo. Baseia-se em I) a Teoria da Relatividade Geral; II) o modelo padrão da física de partículas e; III) a observação de que o Universo se expande. Ele implica que, no passado, o Universo era mais denso e quente do que na atualidade. À medida que se expande, se esfria. Prediz também a existência da radiação cósmica de fundo, que é produzida quando a temperatura cai para abaixo da de ionização, e o Universo, que era um plasma, passa a ser um grande gás neutro, transparente a sua própria radiação.

3. O que está se expandindo?

O que expande é o espaço-tempo. Ao expandir-se, as galáxias se afastam umas das outras. A ideia de que as galáxias se separam como fragmentos de uma explosão em um espaço preexistente é incorreto. O que evolui é o espaço-tempo mesmo.

4. O que significa dizer que o modelo-padrão é singular?

Significa que as equações da relatividade geral deixam de valer se extrapolarmos a evolução do Universo em direção ao passado. A “singularidade inicial” de como é falado não é algo que explodiu ou nada parecido, é uma forma de dizer que as equações não servem para descrever o começo da expansão. Se eles tentarem aplicar, darão “infinito” ao que significa “indefinido”. Isto é, o modelo nos explica porque o Universo começou a expandir.

5. O modelo-padrão está correto?

Não. Desde 1998, existem evidências que parecem indicar que o Universo se expande de maneira acelerada. Há duas formas de explicar isso modificando o modelo: I) Mudando a relatividade geral (ou seja, modificando a forma como descrevemos a gravidade) e II) introduzindo um campo escuro (ou seja, não modificando a forma como descrevemos a gravidade) que produz repulsão gravitacional por ter densidade de energia negativa (a mal chamada “energia escura”). O método usualmente adaptado é o primeiro, o que dá lugar ao chamado Lâmbda CDM. Esse modelo usa as equações da relatividade geral modificadas com um término cosmológico adicional que faz com que a gravidade – que, a distâncias curtas, é atrativa – seja repulsiva a grandes distâncias. Isso faz com que o Universo se acelere logo após ter excedido um certo tamanho crítico. Muita gente se confunde (cosmólogos, inclusive) e pensa que a adição do término cosmológico às equações de Einstein é equivalente à conjecturada energia escura. Não é isso. O modelo Lâmbda CDM não contém energia “escura” nem campos escalares.

6. O que é CDM?

Significa “Cold Dark Matter” (em português, matéria escura fria). Outro aditivo do modelo Lâmbda CDM: a matéria escura. Ela é um tipo de matéria que não emite radiação nem interage nuclearmente. Postula-se para explicar as curvas de rotação observadas em galáxias e outros efeitos astrofísicos.

7. A matéria escura existe?

Não sabemos. Não foi detectada por muitos experimentos realizados, nem por observações de radiação gama que se espera ser produzida quando decai. A matéria escura tampouco se entende dentro do modelo padrão da física de partículas. Até agora, sua única manifestação é a gravitacional. Por isso, há teorias alternativas que ao invés de postulá-la, introduzem modificações maiores as equações de Einstein. Isso resulta em teorias da gravidade muito complexas, chamadas genericamente de “gravidade modificada”.

8. O que havia antes do Big Bang?

Pergunta sem sentido (todavia, algumas hipóteses podem mostrar o contrário). “Antes” ordena instante de tempo e o “Big Bang” não é um instante de tempo. Não sabemos se o tempo existia quando o Universo começou a se expandir, nossas equações não funcionam se as extrapolarmos.

9. Houve um primeiro instante?

Se o tempo é contínuo, não. Pensem em um intervalo [1,0). Suponhamos que a inversão desses números represente instantes e que 1 é o presente e o 0 não está incluso porque a divisão por zero dá infinito (sim, é possível divisão por 0). Não há um primeiro instante. Ao lado de um número zero, sempre haverá um mais próximo. No entanto, o intervalo é finito (medida 1). Nós não sabemos se o tempo é contínuo. Provavelmente, em uma escala muito pequena, não é. É possível que o tempo, o espaço-tempo na realidade, emerjam de entidades mais básicas e atemporais. O estudo desse problema se chama “gravitação quântica”.

Existem muitas outras questões que você pode fazer diante desses temas. Se você leu isso e gostou, não pergunte a mim. Vá e leia. Aproveite sua curiosidade e se eduque. Se não entende esse tema, por outro lado, não opine qualquer coisa. Não tente provar nada. Acredite: ninguém se importa.

Dois livros para começar a ler sobre isso:

  1. Quarks, Leptons and the Big Bang, Third Edition, by Jonathan Allday.
  2. Fundamentals of Cosmology, 2nd ed. 2010 Edition, by James Rich.
Jhordan Santiago

Jhordan Santiago

Graduando em física pela UFCG.