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Você não vai acreditar no que os cientistas encontraram em uma antiga ruína romana

Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert

Quando você está vasculhando ruínas antigas, provavelmente espera encontrar alguns artefatos ou pedaços deixados pelas pessoas que viveram e trabalharam lá há muito tempo. Mas um sítio arqueológico acaba de revelar algo que você não esperaria se não conhecesse a história do lugar.

No que antes era o Fórum de César em Roma, construído por Júlio César, pesquisadores encontraram um poço enterrado de lixo médico que remonta ao Renascimento no século 16 d.C., despejado pelo Ospedale dei Fornari, ou Hospital Baker, que foi fundado em 1564 na vizinha Piazza della Madonna em Loreto.

Os artefatos incluíam equipamentos médicos (como frascos de vidro para coleta de urina), recipientes de remédios de cerâmica e estatuetas de cerâmica que provavelmente eram objetos pessoais.

A equipe de pesquisa, liderada pela arqueóloga Cristina Boschetti, da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, acredita que o lixão pode ter sido usado para descartar objetos potencialmente infecciosos para tentar reduzir a propagação de epidemias.

É possível que esse poço possa ajudar a esclarecer mais o descarte de lixo médico renascentista como meio de controle de doenças em uma cidade densamente povoada.

“Definir lixões médicos em contextos arqueológicos pode ser desafiador porque requer uma abordagem integrada que combina dados de escavação com estudos de materiais e análises contextuais funcionais detalhadas”, escreveram os pesquisadores.

“Aqui, revelamos um desses lixões médicos, escavado na área do Fórum de César em 2021”.

Alguns dos itens pessoais encontrados na cisterna incluem uma estatueta de dromedário, medalhas devocionais, moedas, fusos espirais e um rosário. (Créditos: Sovrintendenza Capitolina/The Caesar’s Forum Project)

As escavações do local ocorreram em 2021, durante as quais a equipe encontrou uma câmara peculiar revestida de tijolos com cerca de 2,8 metros de profundidade, com uma camada de argila compacta escondendo o conteúdo.

Uma investigação mais aprofundada revelou que a cisterna datava do século 16 d.C. e não havia sido usada nem antes nem depois da deposição dos objetos nela encontrados.

Foi, acredita a equipe, um poço usado apenas em um momento da História.

Sob a argila, a equipe encontrou um conjunto verdadeiramente curioso de objetos: cacos de vidro e cerâmica; pequenos vasos de cerâmica intactos de alta qualidade; e itens pessoais, como estatuetas de terracota, medalhas devocionais, fusos espirais e uma única miçanga, provavelmente de um rosário.

Havia também vários grampos de chumbo comumente usados ​​em ferragens de móveis e uma grande quantidade de madeira carbonizada (queimada). Essa coleção de itens, despejada de maneira tão aleatória e selada sob uma tampa de argila, poderia representar mais um quebra-cabeça, mas eles tinham uma coleção notavelmente semelhante de itens para ajudar a desvendar.

Em 2009, arqueólogos escavaram e estudaram o que determinaram ser um local de descarte de lixo médico associado ao hospital no início do século XVII d.C.

Fazendo um exame minucioso dos objetos retirados da cisterna, Boschetti e seus colegas contaram aproximadamente 1.200 cacos de vidro. Muitos deles, determinaram os pesquisadores, provavelmente eram frascos de urina, conhecidos como matula de acordo com fontes latinas medievais.

Cacos de frascos de urina encontrados na cisterna. (Créditos: Sovrintendenza Capitolina/The Caesar’s Forum Project)

“Durante o período medieval, o exame visual da urina – urinoscopia – tornou-se uma ferramenta diagnóstica central na prática médica e assim permaneceu até o século XVIII”, escreveram os pesquisadores. “A urina do paciente seria despejada em um frasco para permitir que o médico observasse sua cor, sedimentação, cheiro e às vezes até gosto.”

Estes frascos são raros em contextos domésticos, mas foram encontrados em grande número associados a instalações médicas, como os outros poços de lixo associados ao Ospedale de Fornari. Outros itens incluíam cerâmica para cozinhar e comer. Cada paciente recebia seu próprio “kit” dessas coisas na admissão no hospital.

Juntando as pistas, os pesquisadores acreditam que elas apontam para procedimentos de descontaminação. A madeira queimada está de acordo com os protocolos hospitalares do século XVII que promovem a queima e descarte de móveis, roupas de cama, talheres e outros itens que entraram em contato com pacientes com doenças infecciosas, como a peste bubônica.

Pratos decorados, todos datados da segunda metade do século XVI d.C. (Créditos: Sovrintendenza Capitolina/The Caesar’s Forum Project)

O que parece ser o selamento intencional da cisterna com argila também sustenta esta interpretação: quem jogou fora os itens desejava contenção absoluta.

Essa descoberta sugere que mais atenção deveria ser dada à forma como nossos antepassados ​​lidavam com a contenção de doenças, principalmente em grandes centros urbanos como Roma.

“Antes do presente estudo, o descarte moderno de resíduos hospitalares e médicos, a fim de prevenir a propagação de doenças, recebia apenas atenção arqueológica esporádica, com investigação limitada de contexto cruzado”, escreveram os pesquisadores.

“Em consequência, as evidências apresentadas aqui aumentam significativamente nossa compreensão das práticas de descarte de resíduos no Renascimento, ao mesmo tempo em que destacam a necessidade de uma visão mais completa das práticas de higiene e controle de doenças do início da Europa moderna”.

A pesquisa foi publicada na revista Antiquity.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.