Publicado na Investigación y Ciencia
Um experimento laboratorial permitiu identificar, de forma inequívoca, a molécula responsável por duas linhas de absorção – elas tinham sido descobertas há mais de vinte anos no meio interestelar. A molécula em questão é um íon (C60+) do Buckminsterfulereno, uma forma alotrópica do carbono formada por 60 átomos desse elemento e com a forma de uma bola de futebol. A descoberta, que foi feita por Ewen K. Campbell, do departamento de química da Universidade de Basileia, e por outros pesquisadores, supõe uma confirmação a mais para a existência de moléculas orgânicas complexas no espaço. Os resultados foram publicados na revista Nature.
Quando a luz das estrelas viaja em direção à Terra, alguns comprimentos de onda (cores, na região visível do espectro) são absorvidas no meio interestelar. Cada composto químico sozinho bloqueia a passagem de alguns comprimentos de onda muito específicos, de modo que a sua identificação constitui uma ferramenta única para deduzir a composição do meio. Há décadas os químicos conhecem bem os espectros de absorção de um certo número de moléculas relativamente simples. No entanto, a tarefa não é tão fácil no caso de moléculas complexas. Na verdade, hoje em dia, ainda persistem mais de 400 linhas de absorção no meio interestelar cujas as origens são desconhecidas.
Duas delas foram descobertas em 1994. Com os comprimentos de onda de 9577 e 9632 angstroms, duas linhas de absorção incertas foram mais intensas próximas do infravermelho. Mesmo assim, ainda foi sugerido que eles poderiam ser devido ao íon (C60+) do Buckminsterfulereno, uma forma alotrópica de carbono (como o diamante, o grafite ou o grafeno) sintetizada pela primeira vez em 1985. No entanto, sua confirmação definitiva estava a espera de um estudo detalhado do espectro de absorção do dito íon em fase gasosa e a temperaturas baixas. Ou seja, às condições típicas do espaço exterior.
Para esse fim, Campbell e seus colaboradores confinaram milhares de moléculas de íon C60+ em uma armadilha eletromagnética e as puseram em contato com uma amostra de hélio a 5 graus Kelvin. Com esse resultado, eles foram capazes de obter a melhor aproximação em laboratório na fase gasosa do íon C60+.
O espectro de absorção da molécula reproduziu com perfeição as duas indescritíveis linhas observadas no meio interestelar, o que permite adicionar essa singular forma de carbono à lista das espécies químicas complexas presentes no espaço. Segundo Pascale Ehrenfreund e Bernard Foing, os pesquisadores que em 1994 descobriram ambas linhas e propuseram o íon C60+ como sua origem mais provável, a descoberta de Campbell e de seus colaboradores melhorará as possibilidades de identificação das espécies responsáveis de mais de 400 linhas interestelares cuja as causas os astrônomos ainda desconhecem.