Por Michael Shermer
Publicado na Scientific American
Em certo ponto na história de todas as teorias científicas, somente uma minoria de cientistas – até mesmo apenas um – as apoiou, antes que a evidência se acumulasse a ponto de haver a aceitação de toda a comunidade científica. O modelo Copernicano, a teoria dos germes, o princípio da vacinação, a teoria da evolução, a tectônica de placas e a teoria do Big Bang já foram, um dia, ideias heréticas que se tornaram consenso no meio científico. Como isso aconteceu?
Uma resposta pode ser encontrada no que o filósofo da ciência William Whewell, no século XIX, chamou de uma “consiliência de induções”. Para uma teoria ser aceita, argumentou Whewell, ela deve ser baseada em mais de uma indução – ou uma generalização simples obtida através de fatos específicos. Ela deve ter múltiplas induções que convergem entre si, independentemente, mas em conjunção. “Por conseguinte, os casos em que as induções de classes de fatos totalmente diferentes coexistem”, escreveu ele em seu livro de 1840 intitulado The Philosophy of the Inductive Sciences, “pertencem às teorias mais bem estabelecidas que a história da ciência já conteve”. Chamemos isso de “convergência de evidência”.
Consenso científico é um termo visto frequentemente acompanhado de aquecimento global antropogênico (AGA). Existe um consenso sobre o AGA? Existe. Os dezenas de milhares de cientistas pertencentes às associações American Association for the Advancement of Science, American Chemical Society, American Geophysical Union, American Medical Association, American Meteorological Society, American Physical Society, Geological Society of America, U.S. National Academy of Science e, de forma mais notória, à Intergovernmental Panel on Climate Change, todos concordam que o AGA é um fato. Por quê?
Não é por causa do grande número de cientistas. Afinal, a ciência não é conduzida por votações. Como Albert Einstein disse em resposta a um livro de 1931, cético à teoria da relatividade e intitulado “100 Autores contra Einstein”, “Por que 100? Se eu estivesse errado, um seria o suficiente”. A resposta é que há uma convergência de evidência a partir de múltiplas linhas de investigação – pólen, anéis de árvores, núcleos de gelo, corais, derretimento das calotas polares, aumento do nível do mar, mudanças ecológicas, aumento do dióxido de carbono, aumento sem precedentes da temperatura – todos convergem para uma singular conclusão. Os que duvidam do aquecimento global antropogênico apontam que há uma anomalia ocasional em um conjunto de dados específico, como se uma incongruência contradissesse todas as outras linhas de evidência. Mas não é assim que a consiliência de induções funciona. Para os céticos do AGA derrubarem o consenso, eles precisarão achar falhas em todas as linhas de evidência e mostrar uma consistente convergência de evidência que aponte em direção a uma diferente teoria que explique os dados (criacionistas têm o mesmo problema com a teoria da evolução). Isso eles não fizeram.
Um estudo de 2014, publicado no periódico Enviromental Research Letters pelos australianos John Cook e Dana Nuccitelli, examinou 11.944 abstracts de artigos que tratavam da mudança climática publicados de 1991 a 2011. Desses artigos, cerca de 97% concluíram que a mudança climática é real e é causada pelos seres humanos. E quanto aos outros 3%? E se esses 3% estiverem certos? Num outro artigo publicado no Theoretical and Applied Climatology, Rasmus Benestad, do Norwegian Meteorological Institute, Nuccitelli e seus colegas examinaram esses 3% e acharam “um número de falhas metodológicas e um padrão de erros comum”. Ou seja, em vez dos 3% convergirem para uma melhor explicação do que aquela provida pelos 97%, eles falharam em convergir para qualquer coisa.
“Não existe uma teoria alternativa coesa ou consistente para o aquecimento global causado pelo homem”, Nuccitelli concluiu em 25 de agosto de 2015 no The Guardian. “Alguns culpam o Sol pelo aquecimento global, outros os ciclos orbitais de outros planetas, e outros os ciclos do oceano, e por aí vai. Existe um consenso de 97% numa teoria coesa que é esmagadoramente apoiada pela evidência científica, mas os 2-3% de artigos que rejeitam o consenso estão espalhados por aí, até mesmo contradizendo uns aos outros. Uma coisa que aparentemente eles têm em comum são as falhas metodológicas como cherry picking, curve fitting, rejeição de dados inconvenientes e a desconsideração com a física conhecida”. Por exemplo, um artigo cético ao AGA atribuiu a mudança climática aos ciclos solar ou lunar, mas para que isso funcionasse pelo período de 4.000 anos considerado pelos autores, eles tiveram que retirar 6.000 anos de dados ainda mais recentes.
Tais práticas são enganosas e falham em investigar a ciência do clima quando expostas por um escrutínio cético, um elemento integral para o processo científico.
Colaboração de Matheus.