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Administrar placebos como reiki a pacientes com câncer faz mais mal do que bem

Por Edzard Ernst
Publicado no The Guardian

As enfermeiras norte-americanas publicaram um estudo intrigante com conclusões estranhas. Elas recrutaram quase 200 pacientes que estavam recebendo quimioterapia para o câncer. Esse é, obviamente, um momento difícil para a maioria dos que sofrem com câncer. Há a possibilidade de efeitos colaterais, como perda de cabelo, náusea, fadiga, depressão etc. Todos esses fatores devem diminuir o bem-estar dos pacientes. Então, as enfermeiras testaram se uma sessão de cura por reiki melhoraria o bem-estar geral de seus pacientes.

O reiki envolve canalizar “energia de cura” para o corpo. Muitas pessoas juram que é eficaz, mas isso realmente funciona?

Para descobrir, um grupo de controle adequado é essencial. As pesquisadoras decidiram, portanto, comparar o reiki com o “reiki falso” e com um grupo que não receberia qualquer intervenção. O reiki falso envolveu a participação de um curandeiro, que não praticava reiki, para fingir a aplicação de reiki. Ele não havia sido treinado em reiki e apenas seguiu o ritual da técnica. Portanto, ele não enviou qualquer “energia de cura” para os pacientes.

Os resultados desse estudo foram impressionantes: o reiki realmente fez os pacientes se sentirem melhores. Especificamente, aumentou o conforto e o bem-estar dos pacientes em comparação com aqueles que não receberam qualquer intervenção. Curiosamente, o reiki falso teve exatamente os mesmos efeitos e, portanto, não houve diferenças entre o reiki falso e o real.

O que isso significa? As pesquisadoras foram bastante exatas em suas interpretações dos resultados. Elas acreditam que o reiki funciona. No entanto, penso que os resultados demonstram exatamente o oposto: o reiki genuíno não é melhor do que o reiki falso – portanto, não funciona.

Talvez essa seja uma questão de interpretação acadêmica na qual se poderia discutir até cansar. No entanto, a questão mais importante é a seguinte: o que as equipes de oncologia em todo o mundo devem fazer sobre essas descobertas?

Elas devem utilizar o reiki ou as terapias similares, como essas enfermeiras norte-americanas parecem sugerir? Elas devem utilizar técnicas alternativas que supostamente ajudam pessoas com câncer, que estão em situações vulneráveis, desesperadoras e doentes, ou devem evitar essas técnicas, porque não são melhores do que o placebo, como eu e a maioria dos cientistas sugerem?

A postura científica pode parecer cruel, principalmente à luz do sofrimento dos pacientes com câncer, enquanto a atitude das enfermeiras parece centrada no cuidado do paciente. Essa impressão está errada. Ao insistir que os pacientes não devam ser tratados com placebos, como o reiki, os cientistas também defendem que os pacientes recebam tratamentos que comprovadamente funcionam melhor do que o placebo. Por exemplo, a massagem demonstrou melhorar o bem-estar dos pacientes com câncer, além de um efeito placebo. Se um paciente recebe uma massagem com empatia, simpatia, tempo, compreensão e dedicação, ele se beneficiaria do efeito placebo – assim como o paciente de reiki -, mas, além disso, ele também se beneficiaria do efeito específico do tratamento que a massagem proporciona, mas o reiki não oferece.

A simples administração de um placebo, como o reiki, privaria os pacientes do efeito específico de um tratamento eficaz. A abordagem supostamente cuidadosa de alguns entusiastas da medicina alternativa, portanto, roubaria os pacientes dos benefícios que precisam e merecem. Em outras palavras, por trás da cortina de fumaça da medicina alternativa – ou da saúde integrativa, para usar o termo da moda -, os pacientes não se beneficiariam mais, mas menos.

Então, quem é o cruel e desumano? Aqueles que promovem placebos malucos em nome dos cuidados médicos ou aqueles que defendem a ciência no melhor interesse dos pacientes?

Referência

Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Divulgador Científico há mais de 10 anos. Fundador do Universo Racionalista. Consultor em Segurança da Informação e Penetration Tester. Pós-Graduado em Computação Forense, Cybersecurity, Ethical Hacking e Full Stack Java Developer. Endereço do LinkedIn e do meu site pessoal.