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Como professor universitário, todo final de ano fico angustiado ao testemunhar colegas e estudantes exaustos, abarrotados de provas e trabalhos, consumidos pela demanda interminável das disciplinas. A lógica dos cursos insiste em socar mais e mais conteúdo goela abaixo, um atrás do outro, muitos deles francamente inúteis, supondo que acúmulo de informação é sinônimo de formação superior.
É como uma chave de fenda forçando um parafuso espanado.
Vejo alunos inteligentes e responsáveis faltando aulas por vários motivos: cansaço, tédio, descrença, desgosto, porque adoecem ou pela simples necessidade de usar o tempo da aula para fazer um trabalho urgente para outra disciplina. Ou seja, vendem o almoço para pagar a janta.
Como professor, me angustio com a dificuldade de propor atividades desafiadoras, instigantes e significativas nesse contexto. É como forçar alguém de barriga cheia a almoçar mais uma vez, por mais saboroso que seja o banquete.
— Aceita um almoço depois do almoço?
Ora, com a demanda de leituras, fichamentos e avaliações das demais disciplinas, os estudantes já estão fartos de aprender! Têm ocupação o bastante; não dá para se envolver além do compromisso da obrigação. Na prática, o critério de envolvimento é o valor da pontuação a ser obtida.
Por isso, tudo o que querem é terminar logo, o mais rápido possível, para entregar ao professor, garantir a nota e se livrar da tarefa para começar a próxima, que deve ser entregue amanhã. O contato meramente burocrático e superficial com trechos isolados da bibliografia fundamental do curso é apenas um dos prejuízos dessa dinâmica.
Certa vez aprendi que, quando enfrentamos um trânsito infernal, dirigindo o nosso próprio veículo, não é que ficamos presos no engarrafamento: na verdade, nós somos o engarrafamento. Da mesma forma, no congestionamento das disciplinas de um curso, os trabalhos desafiadores que eventualmente planejamos em nossa própria disciplina se tornam, na realidade, apenas mais um obstáculo que os alunos devem superar para chegar ao fim do ano e — ufa! — descansar.
Não dá para se dedicar com paixão a um projeto significativo no meio de tanta sobrecarga.
Me angustio quando percebo que, conscientemente ou não, seja consentindo ou se queixando, a maioria dos professores e alunos acaba se submetendo à inércia. E sofrendo juntos, cada um a seu modo, se jogam na máquina, como o Chaplin operário de Tempos Modernos.
Todos são responsáveis
Não sei se todos sabem disso, mas professores universitários, com exceção daqueles das áreas das licenciaturas, não têm formação pedagógica. Eles fizeram seus bacharelados, acumularam experiência profissional, cursaram especialização, muitos conquistaram os títulos de mestres e doutores, tornando-se profissionais ou pesquisadores habilidosos.
Alguns chegaram a cursar uma ou duas matérias de Educação; mas poucos dominam os princípios básicos de didática e pedagogia. Não se trata daquela controversa estéril entre profissionais de mercado versus doutores acadêmicos: a questão é professores com ou sem aptidão para ensinar.
Em regra geral, por falta de referências teórico-práticas, professores universitários apenas imitam os bons e maus exemplos empíricos a que foram submetidos em sua própria experiência como alunos: aula expositiva, seminários, trabalhos, provas, chamada…
No decorrer dos anos, até aprendemos alguns macetes para lidar melhor com isso. E é claro, sempre podemos estudar por conta própria ou participar das iniciativas de formação docente em nossas instituições. Mas assim como os estudantes, também sofremos com a engrenagem da máquina e com a inércia burocrática, autoritária e bacharelesca que reproduzimos de nossas instituições.
Somos, ao mesmo tempo, alunos e professores, responsáveis e vítimas que perpetuam as condições que prejudicam nossas experiências de ensino e aprendizagem.
Os professores, por seu turno, emparedados pela carga horária, se encastelam em métodos monocórdicos; oscilam entre o planejamento inflexível e a absoluta falta de preparação; e se tornam mais repetitivos e maçantes do que inovadores e inspiradores.
Os estudantes, por sua vez, ao lado da energia e do entusiasmo com os temas que os interessam, também não deixam de boicotar experiências pedagógicas desafiadoras quando, por exaustão ou por inércia, decidem priorizar os meios em detrimentos dos fins: vai ter chamada? Vale nota?
E frequentemente, em vez de atuarem juntos no cotidiano para transformar as estruturas que precisam ser reconfiguradas em verdadeiras quebras de paradigma, alunos reclamam de professores, professores reclamam de alunos, todos se distraem satisfeitos em comitês e reuniões cujos diagnósticos produzem atas e documentos, enquanto a máquina os tritura até o fracasso.
Sempre é possível fingir que, tirando os problemas, está tudo bem.
Admito que muitos devem aprender alguma coisa nessa lógica disciplinar da grade de horários, da sobrecarga de trabalho e do sacrifício pessoal em nome de uma pontuação mínima para a aprovação no curso. Não deixa de ser um treinamento para que alunos e professores se ajustem ao papel de subalternos bem-comportados e, se tiverem sorte, bem-sucedidos no mercado de trabalho. Mas me angustio quando vejo todo mundo preocupado em fazer a máquina girar, mesmo quando são mastigados diariamente por ela.
Para solucionar o problema as universidades deveriam aliar reuniões consistentes de planejamento com uma reflexão profunda sobre os objetivos e as prioridades de aprendizagem. Esse desarranjo educacional — que em vez de ajudar, atrapalha o aprendizado — é resultado de uma inércia que perpassa gerações de professores que, engolidos pela rotina, se esquecem que uma vez foram alunos e, por isso, reproduzem os mesmos erros que prejudicaram seu pleno desenvolvimento.