Por Peter Dockrill
Publicado na ScienceAlert
Os cientistas descobriram um pedaço remanescente de uma crosta continental da Terra de milhões de anos atrás, incorporado no deserto isolado do norte do Canadá.
A Ilha de Baffin, localizada entre o continente canadense e a Groenlândia, é uma vasta extensão do Ártico, cobrindo mais de 500.000 quilômetros quadrados, tornando-a a quinta maior ilha do mundo.
Embora a ilha compreenda parte do mais novo território reconhecido do Canadá – Nunavut, formalmente estabelecido em 1999 – uma nova descoberta mostra que essa antiga massa terrestre não apenas tem laços discretos com um passado distante, como também realmente emana de um éon geológico longínquo.
Ao analisar amostras de rochas ígneas recuperadas da perfuração para a exploração de diamantes na província de quimberlitos de Chidliak, em extensões do sul da Ilha de Baffin, os pesquisadores identificaram uma assinatura mineral que nunca esperavam encontrar.
“Os quimberlitos são como foguetes subterrâneos que embarcam passageiros a caminho da superfície”, explica a geóloga Maya Kopylova, da Universidade da Colúmbia Britânica.
“Tais passageiros são pedaços sólidos de paredes rochosas que carregam uma riqueza de detalhes em condições muito abaixo da superfície do planeta ao longo do tempo”.
Nesse caso, esses passageiros tiveram uma jornada muito longa. A equipe diz que rochas de quimberlito como essa, formadas em profundidades abaixo de 150 quilômetros, são levadas à superfície por forças geológicas e químicas.
Em termos de componente geológico, o surgimento dos quimberlitos sob a moderna Ilha de Baffin representa o fim de uma dispersão colossal que ocorreu aproximadamente 150 milhões de anos atrás, durante a fenda da placa continental do cráton do Atlântico Norte.
Este cráton do Atlântico Norte se refere a pedaços de rocha litosférica que datam bilhões de anos, precisamente do éon arqueano, representando algumas das melhores exposições da primeira crosta continental da Terra.
Dividida em fragmentos há milhões de anos, o cráton do Atlântico Norte está exposto nas Escócia, Labrador e Groenlândia, mas os pesquisadores não esperavam encontrá-la na Península Hall da Ilha de Baffin.
“A composição mineral de outras porções do cráton do Atlântico Norte é tão única que não houve dúvida”, diz Kopylova.
“Foi fácil amarrar as peças. Crátons antigos adjacentes no norte do Canadá – no norte do Quebec, no norte de Ontário e em Nunavut – têm mineralogias completamente diferentes”.
Para chegar nas suas descobertas, a equipe usou várias técnicas analíticas – incluindo petrografia, mineralogia e termobarometria – para estudar 120 amostras de rochas, chamadas xenólitos, retiradas da província de quimberlitos.
Os resultados mostraram que o manto de Chidliak possui “fortes semelhanças” com as rochas do cráton do Atlântico Norte do oeste da Groenlândia em termos de composição a granel e química mineral, enquanto mostra inúmeros contrastes com indicadores de outras crateras.
“Concluímos que o manto de Chidliak demonstra uma afinidade com apenas um bloco adjacente de manto cratônico, o cráton do Atlântico Norte”, explicam os autores em seu artigo.
“Interpretamos essa semelhança como indicando a antiga coerência estrutural da litosfera cratônica do bloco da Península de Hall e o cráton do Atlântico Norte antes da divisão subsequente em fragmentos continentais separados”.
As novas descobertas significam que descobrimos cerca de 10% a mais da extensão conhecida do cráton do Atlântico Norte – um pedaço bastante considerável dessa crosta incrivelmente antiga. E, graças às novas técnicas de modelagem de mantos, também podemos imaginar o formato de algumas das primeiras formações rochosas conhecidas da Terra em profundidades maiores do que nunca.
“Com essas amostras, podemos reconstruir as formas dos continentes antigos com base em rochas mais profundas do manto”, diz Kopylova.
“Agora podemos entender e mapear não apenas a camada mais fina da Terra que compõe um por cento do volume do planeta, pois agora nosso conhecimento é literal e simbolicamente mais profundo”.
Os resultados foram publicados no Journal of Petrology.