Por William Haseltine
Publicado na Forbes
Dois novos estudos, embora de diferentes partes do mundo, chegaram à mesma conclusão: que crianças pequenas não apenas transmitem o SARS-CoV-2 com eficiência, mas também podem ser os principais vetores na pandemia.
O primeiro, publicado dias atrás no JAMA, relata resultados de um hospital pediátrico em Chicago, Illinois. O segundo, um manuscrito pré-publicado aguardando revisão por pares, foi realizado na província de Trento, Itália.
O estudo de Chicago examina a concentração da SARS-CoV-2 na nasofaringe, ou na região superior da garganta que se conecta às passagens nasais, de crianças e adultos. De acordo com os resultados, crianças de 5 anos ou menos que desenvolvem sintomas de COVID-19 leves a moderados têm 10 a 100 vezes mais SARS-CoV-2 na nasofaringe do que crianças mais velhas, adolescentes e adultos.
Sempre que essas crianças tossem, espirram ou gritam, expelem ao ar gotículas carregadas de vírus da nasofaringe. Já que elas tem até cem vezes a quantidade de vírus na garganta e nas vias nasais que os adultos, é de esperar que elas espalham o vírus com maior eficiência. O estudo também mostra que crianças e adolescentes de 5 a 17 anos, também com sintomas de COVID-19 leves a moderados, têm a mesma quantidade de vírus na nasofaringe que os adultos com 18 anos ou mais.
Os autores concluem que é provável que crianças pequenas, embora não sejam tão propensas a sofrer com a infecção por COVID-19, são vetores contínuos para sua propagação – assim como fazem com várias outras doenças respiratórias.
O segundo manuscrito relata os resultados de um extenso estudo de rastreamento de contatos realizado em Trento, uma região autônoma no norte da Itália. Apesar de um lockdown total iniciado em março com o fechamento de escolas, universidades e todas as empresas, exceto supermercados, farmácias e bancas de jornais, por mais de um mês, o número de casos aumentou exponencialmente.
Os pesquisadores descobriram que, embora as crianças tenham um risco um pouco menor de infecção que os adultos e tenham menor probabilidade de adoecer, crianças e adolescentes com 14 anos ou menos transmitem o vírus com mais eficiência a outras crianças e adultos – ainda maior que a possibilidade de adultos transmitirem para os próprios adultos. O risco dessas crianças de transmitir a COVID-19 era de 22,4% – mais do que o dobro dos adultos de 30 a 49 anos, cuja taxa de contagiosidade era de 11%. “Embora os contatos entre as crianças sejam menos propensos a se tornarem casos”, eles escreveram, “as crianças eram mais propensas a infectar os membros da família”.
O estudo de Chicago também descobriu que seus participantes mais jovens eram os transmissores mais eficientes da doença, citando o vírus sincicial respiratório como um exemplo de outra doença infecciosa que também observaram o mesmo resultado.
Ambos os estudos significam sérias implicações para os países que pensam em reabrir ou não as escolas diante de surtos prolongados e fora de controle, incluindo o Brasil e os Estados Unidos. Mesmo que as crianças sejam solicitadas a manter as mãos em objetos pessoais, a não compartilhar brinquedos e alimentos e a usar máscaras o tempo todo, não podemos realisticamente esperar que elas sigam essas regras sem desobediência ou descuido. Enquanto o mau comportamento é uma possibilidade, o mesmo ocorre com a disseminação desenfreada da infecção.
Se crianças e adolescentes de 5 a 17 anos são tão ou possivelmente até mais contagiosas que os adultos, abrir escolas em áreas onde as taxas diárias de infecção permanecem moderadas a altas é extremamente arriscado e imprudente. As medidas que implementamos para conter a disseminação da COVID-19 em nossas escolas e comunidades devem levar em consideração toda a população – incluindo crianças e adolescentes com 18 anos ou menos.