Por Benjamin Plackett
Publicado na Live Science
Existe um parasita unicelular chamado Toxoplasma gondii, que pode transformar um rato que normalmente teme correr riscos em um roedor ousado que vai atrás de gatos. Os gatos que devoram esses ratos podem então transmitir o parasita aos humanos.
Mas, uma vez que os humanos são infectados, o que acontece com eles? Eles se tornam zumbis do Toxoplasma gondii, agindo da maneira que o parasita julga adequado?
A resposta é complexa; estudos mostram que as pessoas com teste positivo para essa condição têm mais probabilidade de correr certos tipos de riscos do que aquelas que não têm toxoplasmose, mas ainda não está claro como isso acontece.
O Toxoplasma gondii pode viver na maioria dos mamíferos, mas seu ciclo de vida tradicionalmente envolve viver primeiro dentro de um camundongo ou de um rato. Isso provavelmente ocorre porque os gatos atacam roedores, dando ao parasita uma maneira de chegar ao intestino do gato – o único lugar conhecido onde o parasita pode se reproduzir, já que os intestinos do gato são ricos em ácido linoleico, um ingrediente necessário para a reprodução sexual do Toxoplasma gondii, como descoberto em um estudo de 2019 publicado no banco de dados de preprint da bioRxiv.
Para ajudar nessa transição de vermes para hospedeiros felinos, o Toxoplasma gondii tem uma técnica bastante bizarra e assustadora: a manipulação do cérebro. O parasita altera o comportamento dos roedores, tornando-os menos temerosos de correr riscos. Também faz com que os ratos fiquem atraídos pelo cheiro de cocô de gato. Em outras palavras, o parasita faz algo no cérebro de camundongos e ratos que os torna mais propensos a ir de encontro com um gato para então serem pegos, mortos e comidos. Os humanos não são imunes ao Toxoplasma gondii – na verdade, acredita-se que pelo menos um terço da população mundial tenha toxoplasmose, a infecção que esse parasita causa. Alguns humanos são infectados quando limpam a caixa de areia de seus gatos de estimação, mas outros contraem simplesmente por comer carnes mal passadas ou vegetais não lavados. Então, o que isso significa para um em cada três de nós que acaba por bancar o hospedeiro do parasita?
“Quando você se infecta pela primeira vez, pode ter sintomas leves de gripe, mas a maioria de nós nem percebe. Se você é uma mulher grávida, é mais preocupante porque pode prejudicar a criança, mas quase sempre, as pessoas infectadas tem a doença sem problemas de saúde ou sintomas perceptíveis”, disse Markus Fitza, professor de estratégia e empreendedorismo na Escola de Finanças e Administração de Frankfurt, na Alemanha, cuja pesquisa se concentrou em como o parasita pode afetar as decisões tomadas no mundo dos negócios.
Mas não é aí que a história termina. “Os fundamentos do cérebro humano são bastante semelhantes aos de um rato em um quadro geral”, disse ele ao Live Science.
Resumindo, assim como um camundongo infectado é mais aventureiro, um ser humano infectado também está mais sujeito a correr riscos – às vezes com consequências bastante devastadoras. Pelo menos dois estudos – um analisando 370 pessoas na Turquia e outro analisando quase 600 pessoas na República Tcheca – mostraram que as pessoas com teste positivo para anticorpos do Toxoplasma gondii têm maior probabilidade de sofrer um acidente de carro. Não há muitas evidências para explicar porquê e como as infecções latentes da toxoplasmose podem afetar a personalidade das pessoas, tornando-as menos temerosas de riscos. Os pesquisadores por trás dos estudos dos acidentes de carro, no entanto, escreveram que o parasita deixa cistos no cérebro para o resto da vida, que se acredita aumentar a produção de dopamina (um mensageiro químico no cérebro que afeta os cálculos de risco e recompensa das pessoas) e que pode isso ter um papel determinante.
A toxoplasmose também está associada a problemas de raiva. Pessoas com o transtorno psiquiátrico conhecido como Transtorno Explosivo Intermitente, ou TEI, tinham duas vezes mais probabilidade de ter um diagnóstico de toxoplasmose do que indivíduos saudáveis sem diagnóstico psiquiátrico, conforme a Live Science relatou anteriormente.
Curiosamente, porém, uma diminuição do medo do perigo também pode ter suas vantagens. O próprio trabalho de Fitza mostrou que os empresários têm maior probabilidade de serem infectados do que a população em geral e que os empresários com o parasita tendem a ganhar, em média, $6.000 (hoje equivalente a R$ 33,5 mil reais) a mais por ano do que aqueles sem o parasita. Em um estudo, ele e seus colegas testaram quase 1.500 alunos de biologia e estudantes de administração em uma importante universidade dos Estados Unidos. Os resultados mostraram que os cursos de administração tinham 1,4 vezes mais probabilidade de teste positivo para o parasita do que os de biologia e, entre os cursos de negócios, aqueles que se especializavam em empreendedorismo tinham 1,7 vezes mais probabilidade de teste positivo do que os alunos em subespecialidades de estudos administrativos menos arriscadas.
Fitza também testou 197 profissionais em workshops e eventos de empreendedorismo. Ele descobriu que 124 deles haviam sido infectados pelo parasita. Desses 124 profissionais, 17 haviam iniciado seu próprio negócio, em comparação com apenas quatro das 73 pessoas não infectadas que participaram dos mesmos eventos. Embora o tamanho da amostra fosse pequeno, as descobertas foram apoiadas por estudos subsequentes maiores. A teoria desse estudo é que o Toxoplasma gondii está manipulando os cérebros das pessoas para torná-las menos temerosas de largar seus empregos e começar sozinhas sua própria empresa. “Não podemos dizer com certeza que é isso que está acontecendo”, disse Fitza. “Mas este é o argumento que estamos fazendo com base em nossos estudos”.
No entanto, os cientistas ainda não encontraram uma maneira direta do Toxoplasma gondii controlar a mente humana, relatou a Live Science anteriormente. Em roedores, é possível que o parasita secrete moléculas que, de alguma forma, rearranjam as configurações do cérebro; outros pensam que pode ser devido a cistos cerebrais que interferem na produção de dopamina; e outra ideia é que o Toxoplasma gondii desencadeia inflamação em cérebros de roedores, o que pode, por sua vez, mudar o comportamento e a função do cérebro, segundo um estudo de 2019 publicado na revista mBio.
Dito isso, os humanos com toxoplasmose não são zumbis estúpidos obedecendo às ordens do parasita. Em humanos, não há benefício para o parasita em tornar o comportamento humano mais arriscado; esses efeitos só são remanescentes da manipulação do cérebro do rato – que é vantajosa para o parasita. Mas, como o parasita pode levar a algumas mudanças comportamentais em humanos, lembre-se disso se você tiver gatos e estiver atrás de uma oportunidade de emprego.