Por Michelle Starr
Publicado na ScienceAlert
O Universo é muito pesado.
De acordo com nossas medições da matéria normal no Universo, não há o suficiente para explicar a força dos efeitos gravitacionais que podemos ver.
O que quer que esteja compondo o resto da massa não é nada que possamos detectar diretamente, e a busca para descobrir o que pode ser é ao mesmo tempo desconcertante e desgastante.
O termo substituto para essa massa misteriosa é ‘matéria escura’, e há vários candidatos hipotéticos. Um novo estudo, no entanto, está apresentando um novo argumento para um candidato proposto pela primeira vez na década de 1970 por Stephen Hawking e Bernard Carr – buracos negros primordiais.
“Nosso estudo prevê como seria o Universo inicial se, em vez de partículas desconhecidas, a matéria escura fosse feita por buracos negros formados durante o Big Bang – como Stephen Hawking sugeriu na década de 1970”, disse o físico Nico Cappelluti, da Universidade de Miami. “Isso teria várias implicações importantes. Em primeiro lugar, não precisaríamos de ‘nova física’ para explicar a matéria escura. Além disso, isso nos ajudaria a responder uma das perguntas mais convincentes da astrofísica moderna: como poderiam buracos negros supermassivos no início do Universo crescerem tão grandes e tão rapidamente? Dados os mecanismos que observamos hoje no Universo moderno, eles não teriam tempo suficiente para se formar. Isso também resolveria o antigo mistério de por que a massa de uma galáxia é sempre proporcional à massa do buraco negro supermassivo em seu centro”.
Existem vários motivos pelos quais os buracos negros não são os principais candidatos à matéria escura. No entanto, eles são atrativos (trocadilho intencional); como a matéria escura, esses objetos ultradensos não emitem luz e, se estão vagando no espaço sem se alimentar de nada, são muito difíceis de detectar; você só pode fazer isso observando seu efeito gravitacional no espaço-tempo circundante.
Um dos problemas que os físicos enfrentam é a quantidade aparente de matéria escura. De acordo com nossos cálculos, apenas 15 por cento da matéria no Universo é composta de matéria normal. Os outros 85% são matéria escura.
É extremamente desafiador compensar isso com buracos negros. De acordo com nossos modelos, os buracos negros de massa estelar se formam a partir de estrelas massivas e simplesmente não existem estrelas massivas o suficiente para chegar perto de gerar esse número de buracos negros. A maioria das estrelas do Universo são anãs vermelhas pequeninas.
Buracos negros primordiais, no entanto, são outra questão, e é por isso que, nos últimos anos, eles viram uma espécie de renascimento como candidato à matéria escura. Como o nome sugere, são buracos negros que podem ter se formado a partir de densidades excessivas no plasma primordial que preencheu o Universo imediatamente após o Big Bang.
Esses buracos negros podem ser as ‘sementes’ das quais outros buracos negros cresceram – mas outros também podem ter permanecido pequenos o suficiente para escapar da detecção.
Essa explicação também poderia ajudar a esclarecer alguns outros enigmas, como como buracos negros supermassivos – um milhão a bilhões de vezes a massa do Sol – se tornam tão grandes. No momento, a questão é uma pulga atrás das nossas orelhas. De acordo com os cálculos da equipe, esses gigantes poderiam ter crescido no início do Universo ao se fundir com outros buracos negros primordiais e acumular gás e estrelas próximos.
“Os buracos negros primordiais, se eles existem, podem muito bem ser as sementes das quais se formam todos os buracos negros supermassivos, incluindo aquele no centro da Via Láctea”, disse o astrônomo e físico Priyamvada Natarajan, da Universidade de Yale. “O que considero pessoalmente muito empolgante nessa ideia é como ela unifica elegantemente os dois problemas realmente desafiadores nos quais trabalho – o de sondar a natureza da matéria escura e a formação e crescimento de buracos negros – e os resolve de uma só vez”.
Os buracos negros primordiais podem até ajudar a explicar um excesso misterioso de radiação infravermelha no Universo. De acordo com a equipe, o crescimento de buracos negros primordiais produziria a mesma assinatura infravermelha.
Embora seja certamente bom resolver tantos mistérios de uma só vez, ainda existem algumas questões que precisam de ser respondidas.
Por exemplo, a luz distante se curva quando chega até nós através do campo gravitacional de um buraco negro, e simplesmente não detectamos isso acontecendo com frequência suficiente para explicar todos os buracos negros que constituiriam 85 por cento da matéria no Universo.
É possível que simplesmente não tenhamos conduzido os tipos certos de pesquisas. E é isso que o trabalho da equipe se propôs a fazer: não provar que os buracos negros primordiais existem, mas apresentar um argumento para sua existência, para que possamos descobrir o que precisamos procurar.
Com o Telescópio Espacial James Webb – vamos cruzar os dedos – com lançamento previsto em breve, poderemos obter algumas respostas.
“Se as primeiras estrelas e galáxias já se formaram na chamada ‘idade das trevas’, Webb deveria ser capaz de ver evidências delas”, disse o astrônomo Günther Hasinger, da Agência Espacial Europeia.
A pesquisa foi aceita no The Astrophysical Journal e está disponível no servidor de pré-publicação arXiv.