Traduzido por Julio Batista
Original de Carly Cassella para o ScienceAlert
Imagine se partes perdidas, degeneradas ou doentes do cérebro pudessem ser regeneradas em laboratório e transplantadas para novamente fazer parte de um ser vivo. Cientistas da Universidade da Califórnia em San Diego, EUA, nos aproximaram dessa realidade.
Organoides corticais humanos (ou ‘minicérebros’) transplantados em camundongos não apenas se conectaram ao sistema vascular do hospedeiro, mas também reagiram a pulsos de luz brilhando nos olhos das cobaias de maneira semelhante ao tecido cerebral circundante.
Ao longo de vários meses, os pesquisadores usaram um sistema de imagem inovador para medir a atividade elétrica no organoide que indicava uma resposta integrada aos estímulos visuais.
É a primeira vez que os cientistas foram capazes de confirmar conexões funcionais em um organoide de cérebro humano transplantado em tempo real, em grande parte graças a melhorias em implantes capazes de medir sinais neurológicos sutis em uma escala minúscula e em mínimos detalhes.
“Prevemos que, mais adiante, essa combinação de células-tronco e tecnologias de neurogravação será usada para modelar doenças sob condições fisiológicas em um nível de circuitos neuronais, exame de candidatos a tratamentos com antecedentes genéticos específicos do paciente e avaliação do potencial de organoides para restaurar regiões cerebrais específicas perdidas, degeneradas ou danificadas após a integração”, escreveram os autores.
A equipe de engenheiros e neurocientistas, liderada pelo neuroengenheiro Duygu Kuzum, desenvolveu seu novo sistema de gravação para medir a atividade das ondas cerebrais em nível macro e micro ao mesmo tempo.
A configuração usa microeletrodos flexíveis e transparentes feitos de grafeno que podem ser implantados em certas partes do cérebro. Essa tecnologia altamente ajustada ao sistema nervoso exibe com precisão os picos de atividade neural do organoide transplantado e do tecido cerebral circundante à medida que eles ocorrem.
Menos de um mês após o transplante, os pesquisadores descobriram que seus organoides humanos formaram conexões sinápticas funcionais com o restante do córtex visual do camundongo.
Dois meses depois, o tecido estranho se integrou ainda mais ao cérebro do hospedeiro.
Estudos anteriores, alguns conduzidos pelos mesmos autores na UCSD, mostraram que minicérebros humanos implantados em camundongos podem se conectar a vasos sanguíneos que fornecem oxigênio e nutrientes. Os neurônios também começam a amadurecer e se auto-organizar.
Em 2019, por exemplo, cientistas transformaram células-tronco pluripotentes em uma bolha do tamanho de uma ervilha de dois milhões de neurônios organizados que sondaram seus arredores em busca de conexões vizinhas.
Células-tronco pluripotentes também formam a base dos organoides do cérebro humano. Elas têm o potencial de se diferenciar em uma ampla variedade de tecidos e órgãos, mas apenas se forem banhadas no coquetel certo de moléculas. Mas essa mistura é incrivelmente complexa e baseada em um tempo muito específico, que os cientistas ainda estão tentando desvendar ao certo.
Em 2021, manchetes correram o mundo quando um organoide cerebral começou a desenvolver estruturas oculares rudimentares, mas a viabilidade de alcançar a ‘visão’ funcional em um cérebro desenvolvido em laboratório ainda está muito longe.
Implantar um tecido cerebral humano cultivado a partir de células-tronco em um córtex visual desenvolvido, por outro lado, poderia ser uma meta mais realista. Estudos conseguiram isso antes em roedores, mas se o corpo estranho está recebendo ativamente informações funcionais do resto do cérebro tem sido mais difícil de determinar.
Os eletrodos de metal convencionais não fornecem um campo de visão claro para o cérebro, o que significa que os cientistas precisam remover os eletrodos para ver adequadamente o córtex sensorial, e isso pode atrapalhar o sucesso de um transplante de tecido.
Eletrodos transparentes ajudam a resolver esse problema. Usando uma técnica de imagem fluorescente sob o microscópio, pesquisadores da UCSD mostraram que pulsos de luz podem estimular organoides humanos transplantados dentro do cérebro de um camundongo.
O estudo foi publicado na Nature Communications.