Pular para o conteúdo

‘Partículas fantasmas’: cientistas finalmente detectam neutrinos em colisor de partículas

Traduzido por Julio Batista
Original de Michelle Starr para o ScienceAlert

O fantasma, finalmente, foi visto na máquina: pela primeira vez, os cientistas criaram neutrinos em um colisor de partículas.

Essas abundantes mas enigmáticas partículas subatômicas são tão diferentes do resto da matéria que deslizam por ela como espectros, ganhando o apelido de “partículas fantasmas”.

Os pesquisadores dizem que este trabalho representa a primeira observação direta de neutrinos do colisor e nos ajudará a entender como essas partículas se formam, quais são suas propriedades e seu papel na evolução do Universo.

Os resultados, obtidos usando o detector FASERnu no Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês), foram apresentados na 57ª conferência Rencontres de Moriond na Itália com o tema Interações Eletrofracas e Teorias Unificadas.

“Descobrimos neutrinos de uma fonte totalmente nova – colisores de partículas – onde você tem dois feixes de partículas colidindo com energia extremamente alta”, disse o físico de partículas Jonathan Feng, da Universidade da Califórnia em Irvine, EUA.

Os neutrinos estão entre as partículas subatômicas mais abundantes no Universo, perdendo apenas para os fótons. Mas eles não têm carga elétrica, sua massa é quase zero e mal interagem com outras partículas que encontram. Centenas de bilhões de neutrinos estão fluindo pelo seu corpo agora.

Os rastros de partículas produzidos por um evento candidato consistente com a produção de um neutrino de elétron. (Créditos: Peterson et al.)

Os neutrinos são produzidos em circunstâncias energéticas, como a fusão nuclear que ocorre dentro das estrelas ou explosões de supernovas. E embora não possamos notá-los no dia-a-dia, os físicos acreditam que sua massa – por menor que seja – provavelmente afeta a gravidade do Universo (embora os neutrinos tenham sido praticamente descartados como matéria escura).

Embora sua interação com a matéria seja pequena, ela não é completamente inexistente; de vez em quando, um neutrino cósmico colide com outra partícula, produzindo uma explosão muito fraca de luz.

Detectores subterrâneos, isolados de outras fontes de radiação, podem detectar essas rajadas. IceCube na Antártica, Super-Kamiokande no Japão e MiniBooNE no Fermilab em Illinois, EUA são três desses detectores.

Os neutrinos produzidos em colisores de partículas, no entanto, há muito tempo são procurados pelos físicos porque as altas energias envolvidas não são tão bem estudadas quanto os neutrinos de baixa energia.

“Eles podem nos dizer sobre o espaço profundo de maneiras que não podemos aprender de outra forma”, disse o físico de partículas Jamie Boyd, do CERN. “Esses neutrinos de energia muito alta no LHC são importantes para entender observações realmente emocionantes na astrofísica de partículas”.

O FASERnu é um detector de emulsão que consiste em placas de tungstênio de espessura milimétrica alternadas com camadas de filme de emulsão. O tungstênio foi escolhido por causa de sua alta densidade, o que aumenta a probabilidade de interação de neutrinos; o detector consiste em 730 filmes de emulsão e uma massa total de tungstênio de cerca de 1 tonelada.

Esquema detalhando o colisor e o detector do FASERnu. Tradução da imagem: calorímetro (eletromagnetic calorimetre), disparador/expositor do sistema de cintilador (trigger/pre-shower scintillator system), estações de rastreamento do espectrômetro (tracking spectrometer stations), ímãs (magnets), volume de decaimento (decay volume), estação do cintilador de disparo/afinação (trigger/timing scintillator station), sistema de veto do cintilador (scintillator veto system), rastreador da interface (interface tracker), sistema de veto do cintilador frontal (front scintillator veto system) e detector de emulsão do FASERnu (FASERnu emulsion detector). (Créditos: Peterson et al.)

Durante os experimentos de partículas no LHC, os neutrinos podem colidir com núcleos nas placas de tungstênio, produzindo partículas que deixam rastros nas camadas de emulsão, um pouco como a radiação ionizante deixa rastros em uma câmara de nuvens.

Essas placas precisam ser reveladas, como um filme fotográfico, antes que os físicos possam analisar os rastros de partículas para descobrir o que as produziu.

Seis candidatos a neutrinos foram identificados e publicados em 2021. Agora, os pesquisadores confirmaram sua descoberta, usando dados da terceira execução do LHC atualizado que começou no ano passado, com um nível de significância de 16 sigma.

Isso significa que a probabilidade de que os sinais tenham sido produzidos por acaso é tão baixa que é quase nula; um nível de significância de 5 sigma é suficiente para se qualificar como uma descoberta em física de partículas.

A equipe do FASER ainda está trabalhando duro na análise dos dados coletados pelo detector, e parece provável que muitas outras detecções de neutrinos ocorram. Espera-se que a execução 3 do LHC continue até 2026, e a coleta e análise de dados estão em andamento.

Em 2021, o físico David Casper, da UC Irvine, projetou que a execução produziria cerca de 10.000 interações de neutrinos, o que significa que mal arranhamos a superfície do iceberg do que o FASERnu tem a oferecer.

“Os neutrinos são as únicas partículas conhecidas que os experimentos muito maiores no Grande Colisor de Hádrons não conseguem detectar diretamente”, disse ele, “portanto, a observação bem-sucedida do FASER significa que todo o potencial físico do colisor está finalmente sendo explorado”.

Os resultados da equipe foram apresentados na 57ª conferência Rencontres de Moriond com o tema Interações Eletrofracas e Teorias Unificadas.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.