A todos os leitores desse texto, tenho um aviso importante a dar, antes que o leiam ou se vão o ler novamente.
Ele teve uma repercussão bem maior do que eu e o próprio UR esperava, acabou entrando nos mais diversos meandros internet à fora e alcançando públicos variados, por esse motivo, recebi inúmeros elogios e inúmeras críticas também, mas quero ressaltar um comentário em especial que acho que resume bem todos os erros que cometi, podem lê-lo aqui.
Levando em conta todos os comentários (podem ter certeza que li todos, absolutamente todos, que chegaram ao meu conhecimento) eu pretendo futuramente escrever uma versão 2.0 desse texto, explicando melhor os processos, aumentando e explicitando a bibliografia e fazendo ele ficar ainda mais didático, sem perder a qualidade. Quando farei isso? No momento não posso, pois estou ocupado, mas prometo que será o mais breve possível, nesse meio tempo irei pesquisar melhor o assunto e estudar o máximo que conseguir para que possa redigir um artigo excelente a todos vocês, leitores.
Fim do adendo
Antes de mais nada, quero dizer que as chances de eu ser chamado de “positivista”, “darwiniano” e afins, são altíssimas, então sugiro que leiam este excelente artigo. O texto a seguir nasceu de um questionamento de um amigo tal qual o apresentado no título. Outra coisa que precisa ser dita é que, aqui, expresso uma simplificação de um complexo processo que precisou de milhões de anos para acontecer, então, se parecer resumido demais, é por isso. Por fim, deixo nas referências o vídeo no qual conheci tal teoria e que usei como guia para acrescentar algumas coisas.
Na época de nossos antepassados, milhões de anos atrás (por volta de 4 milhões, para ser mais exato), a fêmea era muito independente. Ela vivia totalmente do jeito que queria (ou que lhe era possível querer) e provia os seus filhotes da forma que bem entendesse. Quando estava no cio, ela simplesmente ia até um local e expunha suas genitálias, assim como os bonobos fazem hoje em dia. O comportamento é retratado no excelente livro Eu, Primata, do biólogo Frans De Waal. A fêmea, que nessa época tinha a genitália bem perto do ânus, ficava em posição de quatro expondo sua vagina e liberando feromônios em um local no meio da floresta ou savana. Alguns machos interessados chegavam (às vezes, muitos num só dia) e copulavam com ela. Isso aumentava as chances de sucesso da reprodução e vários outros fatores que tornavam as possibilidades dela engravidar quase que certas.
Ela engravidava, isolada dos machos, e então paria, cuidando de seus próprios filhotes junto com as outras fêmeas também independentes. O macho, basicamente, tinha o papel só de reprodutor.
Com o tempo, o canal vaginal da fêmea foi chegando mais pra frente, se distanciando do ânus e ficando mais frontal do que traseiro. A fêmea mudou suas táticas de “sedução”. Ela abordava um macho X e então poderia fazer grooming (ou catação – que é aquele processo de alguns mamíferos, principalmente primatas, afagarem e acariciarem o pelo de outro espécime enquanto catam parasitas), ou poderia simplesmente ir direito para intenção sexual, expondo sua vagina ou acariciando o pênis do macho. Muitas vezes, o próprio macho que ia de encontro à ela, que estaria exalando feromônios por conta do cio. Só que, como a vagina estava mais para frente, a posição de quatro já não era mais tão confortável, então começa-se a fazer sexo um de frente para o outro. O contato visual misturado à ocitocina (o famoso “hormônio do amor”, que é produzido durante o sexo. Ele tem várias funções, entre elas, diminuir o sangramento durante o parto, estimular a liberação do leite durante a amamentação e desenvolver empatia e carinho pelo espécime no qual está se copulando), criava um vínculo entre os copuladores. O via ali uma fêmea na qual ele criou um vínculo emocional e, além disso, uma chance de ter uma garantia de cópula sem precisar de um gasto elevado de energia para competir por isso. A fêmea, além de tudo isso, encontrava um ser ligeiramente mais forte que tornaria a criação de seu filhote mais segura.
Nesse momento, nasce a família! O macho querendo uma cópula segura e estável e a fêmea querendo o mesmo, além da proteção durante a gestação e depois do nascimento do filhote. Isso causou muitas mudanças evolutivas na fêmea, como parar de produzir feromônios sentidos pelo macho à distância, mudança nas características sexuais femininas (seios mais arredondados e volumosos, por exemplo), alterações hormonais bruscas, além de todas as outras transformações evolutivas causadas por outros fatores.
Mas, quando o macho se tornou dominante e a fêmea deixou de ser independente? Quando o acordo pendeu mais para um lado do que para o outro? Ao que tudo indica, os dois no início viviam pacificamente e não havia superioridade de um pelo outro. Encontra-se machos e fêmeas enterrados da mesma forma, por exemplo. Eles não tinham porquê para competir, só para cooperar. Estava bom para os dois lados. Mas o que aconteceu? O macho precisava manter a fêmea, pois, caso contrário, ela poderia partir em busca de outro macho mais saudável Isto é, levando em conta que o social e o mental (entenda isso como a capacidade de se socializar e a inteligência, ou capacidade de raciocinar complexamente) naquela época eram coisas bem rudimentares e mal poderiam ser considerados atrativos sexuais. As características biológicas (não que o social e o mental não sejam biológicos, apenas para ser mais didático) eram levadas mais em conta. Então, se um macho com o corpo em triângulo invertido (ombros largos, cintura e quadris finos – que indica à fêmea que esse macho é saudável) passasse por ali, ela iria querê-lo, se o seu parceiro fosse menos “biológico”. O que iria impedi-la? Violência? Ora, uma característica forte da violência, é o ódio que ela causa. Se o macho começasse a tratá-la de forma violenta por conta disso, ela viveria com aversão ao parceiro e com a ideia de fugir, assim que tivesse a primeira oportunidade. Violência então não seria uma resposta segura. Então o que usar? Aquilo de mais forte que há no ser humano, mais forte do que a própria força bruta… As ideias!
Cria-se, então, entre os machos, formas de tornar a fêmea um ser mais passivo. Milhões de anos de complexos processos criam as religiões, as culturas e os contratos sociais que enaltecem a figura do homem como o provedor absoluto ou patriarca e a mulher como a dona de casa que cuida dos filhos e da manutenção do lar (já que, ficando em casa, o risco da procura por outros machos diminuiria bastante).
Referências
- BERENSTEIN, E. A inteligência hormonal da mulher.
- CRENSHAW, T. L. A alquimia do amor e do tesão: como os hormônios sexuais determinam quem, quando e com que frequência nós amamos.
- GOLDENSTEIN, E. Adolescência: a idade da razão e da contestação.
- GOULD, Stephen Jay. A galinha e seus dentes. Editora Paz e Terra. 1992
- GOLEMAN, D. Inteligência Emocional: a teoria que redefine o que é ser inteligente.
- HALBE, H. W. Tratado de Ginecologia
- MACHADO, A. Neuroanatomia funcional.
- POLLACK, R. O corpo da deusa.
- RAMSEY, N. A mulher do próximo milênio.
- SILVA, A. C. Sexualidade Comparada.
- WAAL, Frans de. Eu, Primata. Editora Companhia das Letras