Pular para o conteúdo

A acupuntura continua sendo uma das pseudoterapias mais duradouras – mesmo não funcionando

Traduzido por Julio Batista
Original de Edzard Ernst para o The Skeptic

A acupuntura é uma das terapias alternativas mais antigas, populares e estudadas. Assim, ‘resistiu ao teste do tempo’ e está acima de qualquer dúvida ou reprovação… só que não, sendo apenas algo que seus muitos entusiastas querem acreditar e que a gente acredite. Como tantas vezes no reino da “tão chamada medicina alternativa e complementar” (SCAM, na sigla em inglês – que é a palavra em inglês para “fraude”), as coisas não são tão simples.

A complexidade começa com o fato de que não existe uma, mas muitas formas diferentes de acupuntura. Os pontos de acupuntura podem ser supostamente “estimulados” enfiando agulhas na pele de um paciente, implantando pequenos dispositivos, aplicando calor, correntes elétricas, ultrassom, pressão, picadas de abelha, injeções ou luz. E também, há acupuntura corporal, acupuntura auricular, acupuntura no couro cabeludo e até mesmo acupuntura na língua.

Alguns terapeutas empregam a abordagem tradicional chinesa, enquanto os chamados acupunturistas ‘ocidentais’ orgulhosamente afirmam aderir aos princípios da medicina convencional. Ambos os campos têm em comum o fato de serem baseados em meras hipóteses tentando explicar que a acupuntura pode funcionar. De acordo com a visão tradicional, a acupuntura é eficaz para praticamente todas as condições que afetam a humanidade, enquanto os acupunturistas ‘ocidentais’ afirmam que ela funciona principalmente para aliviar a dor crônica. Mas onde está a evidência para essas afirmações?

Medline, o maior banco de dados de papers médicos, lista atualmente mais de 40.000 artigos relacionados à acupuntura. Portanto, não é difícil encontrar alguma evidência até mesmo para as alegações mais bizarras que os acupunturistas tendem a fazer. No entanto, a questão é: quão confiável é essa evidência? Ao tentar respondê-la, o pensamento crítico é essencial e várias ressalvas devem ser consideradas.

maioria de todos os estudos de acupuntura são originários da China. Várias investigações revelaram que, por uma série de razões, devemos encarar esses testes com uma pitada de dúvida: eles invariavelmente relatam resultados positivos, seus resultados são muitas vezes fabricadosfrequentemente gerados por fábricas de papers publicados em revistas predatórias. Além disso, muitos estudos de acupuntura tiram conclusões positivas injustificadas com base em dados duvidosos. O efeito combinado desses fenômenos é que o corpo de evidências que sustentam a acupuntura é menos do que confiável.

Então, como podemos decidir se a acupuntura funciona ou não? Alguns podem argumentar que basta experimentar e ver por si mesmo. No entanto, gostaria de advertir que esta é uma má ideia. A acupuntura tem muitas características que a tornam um placebo ideal: é exótica, invasiva, levemente dolorosa, custa dinheiro, administrada por um terapeuta empático etc. Qualquer melhora sintomática após a acupuntura pode, portanto, ser devida a efeitos dos contextos da prática e pode não estar relacionada à terapia em si.

A melhor maneira de entender essas evidências complicadas provavelmente consiste em conduzir o que os especialistas chamam de revisão sistemática. Isso envolve, em primeiro lugar, localizar todos os estudos disponíveis para um determinado tema de pesquisa e, em segundo lugar, avaliá-los criticamente de acordo com seu rigor científico.

Nos últimos anos, surgiram inúmeras revisões sistemáticas da acupuntura como tratamento para dezenas de condições diferentes. Infelizmente, muitos são de entusiastas chineses e abertamente tendenciosos. Aqueles que são mais transparentemente independentes e metodologicamente sólidos são aqueles produzidos pela Cochrane Collaboration.

Minha visão geral das 54 revisões sistemáticas publicadas por esta organização falhou em mostrar que a acupuntura é eficaz para tratar qualquer condição; evidências positivas surgiram apenas para a prevenção de enxaquecas e dores de cabeça do tipo tensional. Mais recentemente, uma equipe dos EUA usou uma abordagem diferente para uma avaliação geral da eficácia da acupuntura. Na verdade, suas conclusões foram ainda menos favoráveis:

“Apesar da acupuntura ter sido objeto de centenas de ensaios clínicos randomizados e revisões sistemáticas para dezenas de condições de saúde de adultos, houve poucas conclusões que tiveram mais do que baixa certeza de evidências.”

A acupuntura é frequentemente promovida como livre de riscos. No entanto, efeitos colaterais leves a moderados da acupuntura ocorrem em cerca de 10% de todos os pacientes. Complicações muito mais sérias da acupuntura também estão registradas. As agulhas de acupuntura podem, por exemplo, ferir órgãos vitais como os pulmões ou o coração, e podem introduzir infecções no corpo, como a hepatite. Um exemplo recente é uma das estrelas do time de futebol feminino da Inglaterra, Ellen White, cuja recente decisão de se aposentar foi em parte devido a um incidente no qual um acupunturista perfurou seu pulmão.

Ellen White, artilheira recordista da Inglaterra, se aposentou depois que um acupunturista perfurou seu pulmão. (Créditos: James Boyes)

Cerca de 100 fatalidades após a acupuntura foram relatadas na literatura médica – um número que, devido à falta de um sistema de monitoramento, provavelmente revela apenas a ponta do iceberg.

Dado que, para a maioria das condições, não há evidências confiáveis ​​de que a acupuntura funcione e, sendo associada a danos significativos, seus riscos geralmente superam seus benefícios. Portanto, meu conselho para os possíveis clientes é pensar duas vezes antes de pagar quantias consideráveis ​​de dinheiro pelo que parece pouco mais que um placebo teatral.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.