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A Terra está prestes a capturar uma minilua

Por Michelle Starr
Publicado na ScienceAlert

Todos nós conhecemos e amamos nossa Lua. Ela tem sido a companheira constante da Terra há bilhões de anos, permanecendo sempre nos céus. Mas ela não é a nossa única companheira.

De vez em quando, um objeto menor é temporariamente capturado na órbita do nosso planeta, pairando por um curto período de tempo – alguns meses ou anos – antes de ser lançado de volta ao espaço.

Chamamos esses objetos de miniluas e, embora tenhamos feito algumas detecções experimentais de tais asteroides temporariamente capturados, apenas dois foram confirmados – 2006 RH120, que nos visitou entre 2006 e 2007, e 2020 CD3, na órbita da Terra de 2018 a 2020.

Agora, os astrônomos avistaram um novo objeto, denominado 2020 SO, em uma trajetória de aproximação que provavelmente será temporariamente capturado pela gravidade da Terra. As projeções veem o objeto chegando no próximo mês, em outubro de 2020, e orbitando até maio de 2021, quando partirá para outros arredores.

Como você pode ver no Gravity Simulator, a trajetória do objeto sugere que ele entrará e sairá por dois dos pontos de Lagrange da Terra, pontos gravitacionalmente estáveis ​​criados pela interação gravitacional da Terra com o Sol.

Isso seria extremamente notável por si só – mas há uma reviravolta nessa história. A órbita semelhante à da Terra e a baixa velocidade do 2020 SO sugerem que  esse objeto não é realmente um asteroide. Suas características, segundo os especialistas, são mais consistentes com algo feito pelo homem.

O 2020 SO foi classificado como um asteroide Apollo no JPL Small-Body Database – uma classe de asteroides cujos percursos cruzam a órbita da Terra. Esta classe de asteroide frequentemente se encontra próximo à Terra. Mas existem algumas pistas de que 2020 SO não é como os outros.

O objeto está em uma órbita que permaneceu bem pequenininha ao longo de um ano e em uma inclinação muito baixa em relação à órbita da Terra; ou seja, não está pendendo para cruzar a órbita, mas no mesmo caminho orbital. Sua excentricidade – o desvio da forma de sua órbita de um círculo perfeito – é apenas um pouco maior que a da Terra. E sua velocidade é muito menor do que a velocidade de um asteroide Apollo.

“A velocidade parece ser uma coisa notável”, disse a arqueóloga Alice Gorman, da Universidade Flinders, na Austrália, ao ScienceAlert. “O que estou vendo é que ele está se movendo muito devagar, o que reflete sua velocidade inicial. Isso é essencialmente uma grande revelação”.

Os objetos que vieram da Lua também têm uma velocidade mais baixa do que os asteroides; mas, Gorman observou, 2020 SO é ainda mais lento do que as rochas lunares.

Tudo isso aponta para o objeto potencialmente ser lixo espacial – especificamente, de acordo com Paul Chodas do JPL , o estágio Centaur descartado de um foguete que lançou uma carga experimental chamada Surveyor 2 para a Lua em setembro de 1966.

Foguetes reutilizáveis ​​são uma invenção muito recente, porque a recuperação é incrivelmente difícil tecnicamente. A solução amplamente usada por décadas foi o lançamento de foguetes de vários estágios projetados para se desintegrar. O estágio reforçador volta para a Terra para reutilização; o resto do foguete, transportando a carga útil, é descartado no espaço quando seu trabalho é concluído.

Esses estágios descartados constituem muito lixo espacial. E, de acordo com Gorman, eles são surpreendentemente fáceis de serem perdidos de vista.

“Existem tantos fatores no ambiente espacial, como fatores gravitacionais e outras coisas que afetam o movimento, que, às vezes, tornam as situações bastantes imprevisíveis”, disse ela.

“Ou você acompanha essas coisas, ou você simplesmente as perde de vista com facilidade. E se elas fizerem algo um pouco imprevisível e você olhar para o lado errado, não saberá para onde foi. É surpreendente a quantidade de coisas que sumiram”.

O tamanho estimado de 2020 SO corresponde às propriedades de um estágio Centaur da década de 1960. De acordo com o banco de dados CNEOS da NASA, o objeto tem entre 6,4 e 14 metros de comprimento; um estágio Centaur mede 12,68 metros.

Asteroides são detectados no céu como objetos brilhantes em movimento – um ponto na escuridão. A partir disso, podemos medir a velocidade e a órbita e fazer uma estimativa do tamanho, mas é impossível determinar a forma ou composição sem observações mais detalhadas.

O 2020 SO deve fazer duas investidas em direção à Terra. Em 1 de dezembro de 2020, ele passará a uma distância de cerca de 50.000 quilômetros. Por volta de 2 de fevereiro de 2021, ele voará a 220.000 quilômetros.

Nenhumas das duas investidas serão próximas o suficiente para entrar na atmosfera da Terra – o objeto não representa nenhum perigo. Mas essas distâncias, especialmente em velocidades lentas, podem ser suficientes para estudá-lo mais de perto e determinar o que é o 2020 SO.

Podemos estimar uma forma aproximada. A espectroscopia pode ajudar a determinar se o objeto é pintado. E a quantidade de luz que ele reflete pode até fornecer informações para ajudar a planejar missões espaciais de longo prazo. Se o 2020 SO é aquele estágio Centaur de 1966, ele está no espaço há 54 anos – uma espaçonave feita pelo homem sobrevivendo ao espaço por todas essas décadas.

“Seria interessante fazer um pouco de espectroscopia de refletância, o que mostraria se as superfícies são ásperas, o quanto ela foi perfurada e deteriorada por ser bombardeada por poeira e micrometeoritos”, disse Gorman.

“É um material humano que está em uma parte diferente do espaço. Então, seria interessante comparar isso com os resultados que você obtém de coisas na órbita baixa da Terra, que é muito mais densa em material”.

E, claro, seja ou não um estágio de foguete, as propriedades do 2020 SO podem nos ajudar a identificar outros objetos próximos à Terra no futuro. Se for feito pelo homem, isso significa que da próxima vez que virmos um objeto com propriedades semelhantes, teremos um pouco mais de informação que sustenta uma origem antropogênica.

Se for um asteroide, isso significa que temos uma pedra muito estranha em nossas mãos, demonstrando que os asteroides podem se mover – de forma realmente inesperada – como estágios de foguete.

Portanto, seja o que for o 2020 SO, teremos muito a aprender com nosso novo convidado misterioso.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.