Por Korey Haynes
Publicado na Astronomy Magazine
Dez bilhões de anos atrás, a Via Láctea encontrou outra galáxia no vasto vazio do espaço e a consumiu. Apelidada de Gaia-Encélado pelos astrônomos, essa estranha vizinha tinha aproximadamente um quarto do tamanho da Via Láctea e mudou para sempre a composição e o formato de nossa galáxia.
Os cientistas têm evidências de há algum tempo que a Via Láctea passou por uma grande fusão em seu passado. Mesmo sem evidências diretas aqui em nossa galáxia, os cientistas sabem que as colisões de galáxias são comuns no universo. Essas fusões são a principal maneira pela qual as galáxias crescem e evoluem. Mas é a primeira vez que os astrônomos conseguiram identificar as idades de diferentes populações estelares na Via Láctea com precisão suficiente para determinar quando essa fusão ocorreu e como exatamente isso afetou nossa galáxia. Pesquisadores liderados por Carme Gallart, do Instituto de Astrofísica de Canarias, na Espanha, publicaram suas descobertas em 2019 na Nature Astronomy.
Colisão das galáxias
Para ler a história da Via Láctea, os astrônomos devem identificar as idades de diferentes populações e grupos de estrelas na galáxia. Isso é complicado porque medir a idade das estrelas é uma ciência inexata. Os cientistas não podem realmente olhar para uma estrela e dizer sua idade, mesmo com medidas detalhadas. Em vez disso, eles observam grupos de estrelas e os comparam entre si para traçar os modelos das populações de estrelas. As estrelas geralmente nascem em grandes “ninhos” e, obtendo detalhes sobre grupos inteiros de estrelas, os cientistas podem voltar no tempo e obter uma imagem mais precisa de quando esse nascimento ocorreu.
E graças ao surgimento de novos dados da missão Gaia, que está criando o mapa estelar mais preciso de todos os tempos, os astrônomos conseguiram dar um grande passo adiante nesse desafio.
Munido com seus novos dados, os astrônomos traçaram um mapa das estrelas de regiões semelhantes da Via Láctea. Eles descobriram duas populações distintas de estrelas. Algumas estrelas, que parecem mais vermelhas, parecem ter se formado em uma galáxia maior e mais rica em metais. (Vale a pena lembrar aqui que os astrônomos chamam qualquer elemento que não seja hidrogênio ou hélio de “metal”.) A outra população de estrelas mais azul deveria ter se formado em uma galáxia menor e mais pobre em metais. O fato dos astrônomos verem essas populações misturadas é um sinal de que a galáxia maior (a Via Láctea) encontrou e consumiu uma galáxia menor (Gaia-Encélado) em algum momento do passado.
Os astrônomos suspeitaram de um evento desse tipo com base em observações anteriores, mas os novos dados da missão Gaia dão mais clareza. Os dados também confirmam o que os astrônomos suspeitavam, que a galáxia intrusa era aproximadamente um quarto do tamanho da Via Láctea original.
O cronograma deste evento estava em debate, no entanto. Mas os novos dados permitiram aos astrônomos medir a idade das estrelas no halo da Via Láctea, uma espécie de bolha de estrelas subindo acima e abaixo da forma mais familiar do disco, todas datadas há 10 bilhões de anos atrás. A razão pela qual essas estrelas orbitam para fora do disco da Via Láctea é porque elas estão se movendo mais rapidamente do que outras estrelas, e a implicação é que algum evento energético as lançou a essas altas velocidades.
Ao combinar as idades das estrelas com os modelos de evolução das galáxias, os astrônomos podem traçar uma linha do tempo da história da Via Láctea. Por cerca de 3 bilhões de anos, a jovem Via Láctea evoluiu por conta própria, até encontrar Gaia-Encélado, 10 bilhões de anos atrás. Esse encontro jogou algumas estrelas no halo e também derramou gás – o combustível da nova formação estelar – no disco da Via Láctea, causando um rápido evento de formação estelar. Bilhões de anos depois, essa agitação diminuiu, embora nossa galáxia ainda tenha combustível suficiente para continuar produzindo estrelas a uma taxa reduzida.
Graças à enorme quantidade de dados que Gaia coleta, os cientistas recebem as descobertas com atraso. Os resultados atuais são baseados apenas nos primeiros 22 meses de dados, coletados entre 2014 e 2016. A Gaia continuará coletando dados até pelo menos 2022 e provavelmente 2024 se tudo continuar sem problemas. À medida que o projeto continua lançando novas medidas, a compreensão dos pesquisadores sobre nossa galáxia só tende a melhorar.