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Antiviral da Pfizer reduz drasticamente hospitalizações por COVID-19

Por Jennifer Couzin-Frankel
Publicado na Science

Abrindo um novo capítulo no tratamento da COVID-19 – um capítulo compartilhado com o combate ao vírus da AIDS – a gigante farmacêutica Pfizer relatou hoje resultados otimistas para um regime de 5 dias de um antiviral para tratar infecções precoces com SARS-CoV-2. Em um teste em que um grupo externo de monitoramento encerrou antes do esperado porque o tratamento parecia bastante promissor, o composto experimental da empresa reduziu as hospitalizações em 89% entre aqueles tratados dentro de 3 dias do início dos sintomas, e quase a mesma porcentagem entre as pessoas que começaram a tomar as pílulas dentro de 5 dias. O antiviral da Pfizer é um inibidor de protease, uma classe bem estudada de medicamentos que revolucionou a luta contra o HIV e tem um histórico de segurança conhecido.

“Tudo o que eu diria é: ‘Uhuu!’”, disse Mark Denison, um virologista da Universidade Vanderbilt, nos EUA, que trabalhou no desenvolvimento de medicamentos para a SARS-CoV-2. “Esta é uma notícia maravilhosa”.

O anúncio da Pfizer vem na esteira de outras notícias promissoras sobre o tratamento do COVID-19: uma pílula antiviral da Merck & Co., que funciona por um mecanismo diferente, foi aprovada no Reino Unido esta semana. Denison e outros cientistas dizem que se o tratamento da Pfizer se juntar ao arsenal contra a pandemia, pode rapidamente se tornar uma arma poderosa para prevenir sintomas graves de COVID-19 e ajudar os pacientes a eliminar o vírus mais rapidamente, o que também reduziria a transmissão. Embora o estudo relatado aqui tenha testado a droga apenas em cerca de 1200 pessoas não vacinadas, ele também pode ajudar aqueles que foram vacinados e sofreram uma infecção súbita.

O anúncio da Pfizer no início da semana foi uma surpresa. (Poucos dias antes, na semana passada, a empresa informou aos investidores que o ensaio estava em andamento.) Em um comunicado de imprensa, a Pfizer relatou que apenas três das 389 pessoas com casos confirmados de COVID-19, ou 0,8%, que passaram por sua terapia antiviral dentro de 3 dias foram hospitalizadas, em comparação com 27 de 385, ou 7%, no grupo de placebo. Dez dos pacientes que receberam o placebo morreram posteriormente; ninguém que tomou a pílula da Pfizer veio a falecer.

Fornecer antivirais para as pessoas dentro de 3 dias do diagnóstico pode ser um desafio, e os estudos de coorte faziam parte de um grupo maior que iniciou a terapia 5 dias após os sintomas. Lá, seis de 607 utilizando o antiviral, ou 1%, foram hospitalizados, contra 41 de 612, ou 6,7%, no grupo de placebo. Além de não terem sido vacinados, todos os participantes apresentavam pelo menos uma condição médica, como diabetes ou doença pulmonar, que os colocava em maior risco de COVID-19 grave.

Como tem sido típico para empresas em toda a pandemia, a Pfizer não disponibilizou dados detalhados – apenas os principais resultados – e o trabalho ainda não foi revisado por pares ou publicado. Ela recebeu os resultados apenas na quarta-feira passada, quando o conselho de monitoramento alertou funcionários da empresa, e agora planeja buscar autorização de uso emergencial para o tratamento nos Estados Unidos e em outros lugares o mais rápido possível.

Há um amplo consenso entre médicos e cientistas de que as drogas que incapacitam a SARS-CoV-2 diretamente e no início de uma infecção são cruciais para ajudar a acabar com a pandemia de COVID-19. (Eles são rápidos em enfatizar que tais tratamentos não devem substituir as vacinas como os primeiros na linha de defesa). Durante meses, o tratamento para a doença em seu início consistiu em cuidados domésticos básicos, como muito líquido, repouso e analgésicos de venda livre para aliviar os sintomas. “A verdadeira abordagem terapêutica seria um antiviral direto”, disse Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas, à Science no início deste ano.

Os anticorpos monoclonais que bloqueiam as proteínas de superfície do coronavírus podem retardar a infecção de novas células com o SARS-CoV-2, mas sua aplicação foi prejudicada pelo custo, disponibilidade e necessidade de infundi-los ou injetá-los. Em contraste, o candidato ingerível da Pfizer opera dentro de uma célula infectada; ele bloqueia enzimas, chamadas proteases, que normalmente agem no início do ciclo de vida de um vírus para ajudá-lo a se replicar. Muitos inibidores de protease são aprovados para o tratamento do HIV, e o composto da Pfizer tem uma história de quase 20 anos. Os cientistas da Pfizer desenvolveram uma versão do composto em 2003 para bloquear uma protease do coronavírus que causa a síndrome respiratória aguda grave (SARS), um primo do SARS-CoV-2.

Em seguida, os casos de SARS diminuíram e a Pfizer arquivou o produto. No ano passado, a empresa o resgatou, descobriu que ele poderia impedir a replicação do SARS-CoV-2 em células humanas e começou a desenvolvê-lo para a COVID-19. Uma versão inicial, testada há cerca de um ano, foi administrada por via intravenosa, e a empresa posteriormente elaborou um comprimido mais fácil de administrar.

O tratamento da Pfizer consiste, na verdade, em dois medicamentos distintos: o inibidor da protease do SARS-CoV-2 desenvolvido pela Pfizer, conhecido como PF-07321332, e um medicamento genérico para o HIV que já existe há décadas, chamado ritonavir, que aumenta a eficácia dos inibidores da protease. A empresa adicionou ritonavir ao regime quando este mudou de um tratamento intravenoso para uma pílula. Isso porque, na forma de comprimido, o inibidor da protease foi metabolizado muito rapidamente, decomposto pelo corpo antes de poder desativar o vírus com eficácia, disse um porta-voz da Pfizer.

Quando tomado em conjunto, o ritonavir ajuda a evitar as enzimas que fragmentam o antiviral da Pfizer, mantendo-o intacto no corpo para que tenha tempo para fazer seu trabalho. No estudo atual, os pacientes tomaram seis comprimidos por dia, dois antivirais da Pfizer e um ritonavir pela manhã e o mesmo regime à noite.

O regime também está sendo testado em dois estudos adicionais. Um é inscrever pessoas que apresentam um risco padrão de desenvolver COVID-19 grave, incluindo aquelas que foram vacinadas; a outra oferece os comprimidos como terapia preventiva para pessoas que tiveram um membro da casa com o teste positivo do vírus. Esses testes continuam e a Pfizer ainda não relatou seus resultados.

As notícias dessa semana marcam a segunda vez em cerca de 1 mês que um antiviral contra a COVID-19 parece ter sucesso. Em 1º de outubro, a Merck e a Ridgeback Biotherapeutics anunciaram que seu antiviral, chamado molnupiravir, reduziu a hospitalização pela metade em voluntários do estudo. (Esse ensaio também foi encerrado precocemente devido à eficácia do medicamento.) Ontem, os reguladores do Reino Unido aprovaram o molnupiravir para pessoas com COVID-19 leve ou moderado e pelo menos um fator de risco, como obesidade. Um comitê consultivo da Food and Drug Administration dos EUA irá considerar a terapia no final deste mês.

O molnupiravir funciona de maneira muito diferente de um inibidor de protease: ele engana o SARS-CoV-2 para incorporar o composto em sua informação genética, codificada pelo RNA e, ao fazer isso, transforma o vírus em um ponto em que ele pode se replicar por mais tempo. Mas alguns especialistas temem que, a longo prazo, o uso generalizado da droga possa estimular a evolução de outras variantes virais prejudiciais. Também permanecem preocupações teóricas sobre se a droga pode causar mutações nas pessoas. Portanto, ter outra opção de medicamento COVID-19, como o inibidor de protease da Pfizer, é bem-vindo.

“Os inibidores de protease são antivirais realmente poderosos, e isso foi demonstrado com o HIV e a hepatite C”, disse Celia Schiffer, bióloga estrutural da Faculdade de Medicina Chan da Universidade de Massachusetts. Outros inibidores de protease para SARS-CoV-2 estão passando por seus próprios ensaios clínicos. Em seu comunicado de imprensa, a Pfizer disse que não houve efeitos colaterais notáveis ​​associados ao seu medicamento candidato.

Em última análise, disseram os cientistas, as combinações de medicamentos podem ser a chave para o tratamento precoce da COVID-19; o fato do molnupiravir e os inibidores de protease agirem sobre o vírus de maneiras diferentes poderia tornar a combinação dos dois uma estratégia potente se a resistência a um deles se disseminasse. Os tratamentos para HIV e hepatite C agora empregam essas combinações, disse Schiffer. “É incrivelmente empolgante”, disse ela, ter as notícias de hoje da Pfizer em mãos – e considerar como a combinação de antivirais orais que agora estão em jogo pode mudar a trajetória da pandemia.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.